segunda-feira, 26 de março de 2007

Veredas da justiça

O SENHOR é o meu pastor; nada me faltará.
Ele me faz repousar em pastos verdejantes. Leva-me para junto das águas de descanso; refrigera-me a alma.
Guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome.
Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado me consolam.
Preparas-me uma mesa na presença dos meus adversários, unges-me a cabeça com óleo; o meu cálice transborda.
Bondade e misericórdia certamente me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na Casa do SENHOR para todo o sempre.


Excelentíssimos Senhores e Senhoras;
Conquanto nossa República seja leiga, tanto pela definição de seus diplomas legais, quanto pela sua total separação da Igreja, ou de quaisquer correntes religiosas, seus integrantes não o são. E, no administrar da “coisa-pública” fazem bem em buscar a fonte de todo o sistema de valores, que, não apenas moldou, como também expressa-se hoje no exercício da cidadania brasileira. Tal sistema tem origens remotas, mas bem definidas. Espero mostrar um pequeno vislumbre de tais origens.

Este texto bíblico, reminiscências de Davi, o segundo rei de Israel, mistura suas lembranças de como, quando adolescente, cuidava do rebanho de seu pai, com o que via Deus fazendo dia-a-dia em sua vida e com seu dever como rei para com seu povo: seu rebanho.
Não é difícil entender a necessidade que uma ovelha tinha de ser conduzida por seu pastor à águas calmas ou a pastos verdes. Porém quando ele declara “refrigera-me a alma” não há dúvidas que ele não está mais referindo-se ao ovino, mas a si próprio e à seus súditos. Entretanto, o que nos interessa, em um momento como este, é a declaração “Guia-me pelas veredas da justiça”.

O conceito de justiça daquele tempo não era, em quase nenhum de seus muitos aspectos, idêntico ao de hoje.
Os julgamentos eram realizados pelos anciãos da comunidade às entradas das mesmas, e apenas os casos mais graves eram remetidos a um foro principal composto de 70 anciãos que representavam as 12 famílias originais.
A Justiça era essencialmente retributiva: a um dente correspondia outro, bem como a um olho ou a uma vida. Não possuíam cárceres e o cerceamento do direito de ir e vir, como penalidade, foi introduzido séculos depois destas palavras pelo império romano. Também, não possuíam carrascos: a própria comunidade exigia o cumprimento da pena e se fosse a morte era a própria comunidade que a aplicava pelo apedrejamento distribuindo a todos o dever de extirpar o mal e a responsabilidade pela aplicação do castigo. Obviamente, as chances de um erro capital eram proporcionais às condições sócio-culturais. E a reversão de tal erro era nula. Daí a justiça ser tão importante como a água, a comida e o refrigério da alma.

Por experiência própria este rei sabia o quanto a justiça é fugidia. E dentre as muitas palavras de que dispunha para apresentá-la, ele escolhe “veredas”.
Mais do que uma picada na selva fechada, menos do que um caminho, as veredas costumam desaparecer nos lajões de pedra, nos alagadiços e no areal dos desertos.
Não é assim?
Nós pais, que conhecemos a índole, e, muitas vezes, as intenções de nossos filhos, não ficamos em dúvida quando precisamos fazer juízo sobre seus atos? Nós, pastores do Rebanho do Senhor, também não ficamos em dúvida sobre determinadas atitudes das ovelhas que Deus colocou sob nosso cajado?
E os Senhores, excelentíssimos magistrados? Porventura nunca ficaram em dúvida sobre a correspondência entre os registros e fato real? Tais dúvidas decorrem da justiça andar por veredas. Ela relega as auto-estradas. Relega os caminhos planos e impõe-se como desafio aos mais hábeis em achá-la.

Qualquer pessoa pode desempenhar o nobre ofício que lhes pesa às costas? Não é necessário o treino extenuante dos estudos, a busca incessante das experiências alheias registradas na jurisprudência? Não é imprescindível a própria experiência?
Achar a “vereda da justiça” não é tarefa que se designe a qualquer um, por mais bem intencionado que seja. Achar a “vereda da justiça” torna-se menos árduo para aquele que é guiado por Deus, pois o principal interessado nela tem como uma de suas tarefas “guiar pelas veredas da justiça”.

Embora esta Procuradoria não seja uma sala de julgamentos, ela é assentada sobre os fundamentos da justiça. Fundamentos que transcendem a história e cultura de nossa República. Fundamentos que estão além da mais antiga legislação da mais antiga civilização. Fundamentos que retratam um dos atributos do “Juiz de toda terra”. Aquele mesmo que se preocupa em mostrar as “veredas da justiça” e conduzir por elas.
Como cidadão brasileiro, desejo de todo coração e como ministro do Santo Evangelho, peço ao Juiz da Instância Eterna, que esta seja a função primeira e fim último desta casa.
(Sermão pregado em 26/3/2007, por ocasião da Solenidade de Inauguração da Sede da Procuradoria da República no Município de Governador Valadares)

quinta-feira, 15 de março de 2007

Conspiração e a Cruz do Senhor

Dando continuidade ao que já vimos no Boletim passado vejamos mais este aspecto.

Outro pecado cuja conseqüência direta foi a cruz de nosso Senhor foi “o conspirar”. Por falta de uma palavra melhor usarei essa com o seguinte sentido: ajuntamento para fazer o mal usando as prerrogativas do ofício que cada um exerce.

A ressurreição de Lázaro foi “a gota d’água” para os líderes religiosos judaicos, pois, mesmo após tão grande sinal, eles, reunidos, deixaram claro qual era, na verdade a maior preocupação que tinham: “Muitos, pois, dentre os judeus que tinham vindo visitar Maria, vendo o que fizera Jesus, creram nele. Outros, porém, foram ter com os fariseus e lhes contaram dos feitos que Jesus realizara. Então, os principais sacerdotes e os fariseus convocaram o Sinédrio; e disseram: Que estamos fazendo, uma vez que este homem opera muitos sinais? Se o deixarmos assim, todos crerão nele; depois, virão os romanos e tomarão não só o nosso lugar, mas a própria nação”. (João 11:45-48).

A conspiração chegou ao mais alto nível. Saiu da “roda dos descontentes” e chegou ao Sinédrio.

O Sinédrio era a corte suprema dos judeus. Era o remanescente daqueles 70 homens que foram nomeados por Moisés, ainda no deserto, para ajudá-lo a julgar casos menores. Porém, nos dias de Jesus, eles tinham a última palavra nos casos mais difíceis. Eram a corte suprema de Israel.
Reuniam-se nas dependências do templo e estavam sujeitos a ritos processuais bem claros. Por exemplo: Não podiam fazer julgamentos noturnos. Não podiam sentenciar no mesmo dia do julgamento (só depois de uma noite de “consulta ao travesseiro”). Não podiam condenar alguém com base em sua própria confissão, mas apenas em vista do depoimento de, pelo menos, duas testemunhas.

Todos esses preceitos, e mais alguns, que não vêm ao caso, extraídos do Velho Testamento, foram desprezados no julgamento de Jesus.

Ele foi preso pela guarda do templo na quinta-feira à noite e, imediatamente após ser torturado, teve início seu julgamento. E ainda na mesma noite foi dada a sentença, que teve por base a sua própria confissão de “ser o Filho de Deus”, extraída sob conjuro pelo Deus Vivo feito pelo Sumo Sacerdote: a maior autoridade à qual um judeu estava sujeito.

Outro dispositivo processual interessante determinava que a condenação à morte mediante o voto de metade mais dois juízes. Parece que o silêncio indicou unanimidade da corte embora fizessem parte dela José de Arimatéia e Nicodemos.

Na realidade não houve um julgamento. A conspiração, e os interesses escusos, contribuíram para esse simulacro. Tanto é que para manter as aparências reuniram-se bem cedo de manhã para formalizar o que já havia sido decidido à noite, e o entregaram a Pilatos já julgado e apenado.

Quando Pilatos constatou que, à luz da justiça comum, havia uma disparidade muito grande entre a falta e a pena, trataram de acusá-lo de outro crime, que aos olhos romanos era mais grave: rebelar-se contra César.

A conspiração permeia todas as instituições humanas em maior ou em menor grau, pois ela é o sintoma de um coração mais propenso à maldade do que ao reto juízo. Ela está presente até mesmo na vida familiar e mostra, sem nuances, como o coração do homem está distorcido.

Via de regra a conspiração tem início com a murmuração, tão condenada nas Escrituras e tão detestada por Deus.

Tanto a murmuração, quanto a conspiração crescem no anonimato e são excelentes ambientes para o cultivo da mentira e da covardia.

Fujamos dela lembrando as palavra do Mestre: “que a tua palavra sim signifique sim, e a tua palavra não signifique não”

sábado, 10 de março de 2007

A inveja e cruz do Senhor

... por inveja, o tinham entregado.

Segundo as Escrituras a morte de Jesus teve diversas causas: “Jesus, o Nazareno, ... entregue pelo determinado desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos” (At 2.22-23).

Primeiramente ele foi morto pela vontade de Deus. Porém, de forma misteriosa, houve a concorrência humana. E tal aconteceu sob diversos aspectos. Os principais foram: inveja, conspiração e traição.

É muito difícil dissociá-los, mas, analisando os autores principais de cada um desses pecados, podemos vê-los com um pouco mais de nitidez.

O terceiro ano do ministério terreno do Senhor foi muito penoso. Os estudiosos geralmente o chamam de “o ano da oposição”. O povo já não estava tão feliz com ele. Seus milagres, cada vez mais, exigiam uma postura do beneficiário e sua repetidas recusas de liderar um levante contra os romanos, desiludiram a muitos.

Há diversos invejosos que contribuíram para a morte do Senhor. Por exemplo, Judas.
Quando Maria ungiu os pés do Senhor na casa de Lázaro, Judas reclamou do desperdício de um perfume tão caro que poderia ser melhor empregado no auxílio aos pobres. João nos informa: “Isto disse ele, não porque tivesse cuidado dos pobres; mas porque era ladrão e, tendo a bolsa, tirava o que nela se lançava”. Jesus o repreendeu e Marcos diz que logo após ele “foi ter com os principais sacerdotes, para lhes entregar Jesus.”

Porém a inveja é vista mais claramente nos principais sacerdotes e nos anciãos e atestado por Pilatos. Veja:
“E, sendo acusado pelos principais sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu ... Ora, por ocasião da festa, costumava o governador soltar ao povo um dos presos, conforme eles quisessem. Naquela ocasião, tinham eles um preso muito conhecido, chamado Barrabás. Estando, pois, o povo reunido, perguntou-lhes Pilatos: A quem quereis que eu vos solte, a Barrabás ou a Jesus, chamado Cristo? Porque sabia que, por inveja, o tinham entregado.”(Mt 27.12,15-18).

A inveja, desde a antiguidade, foi classificada por muitos sábios como o “vício burro”, pois dele nada se tira: “Nem mesmo o prazer pecaminoso” diziam. Nosso Senhor e Mestre nos ensinou que a inveja procede do coração e contamina o homem. Do mesmo modo que um judeu de então tornava-se religiosamente impuro se comesse com as mãos por lavar, hoje “estaremos religiosamente impuros” se, em lugar do Espírito Santo, a inveja for a “força motriz” de nossos corações.

Característica notável dos homens dos últimos dias, a inveja é uma das expressões da ira de Deus que está sendo derramada sobre a humanidade idólatra. Veja o primeiro capítulo da Carta de Paulo aos Romanos.

A ação da inveja é tão impressionante que leva o invejoso até mesmo a proclamar o Evangelho. Não o relatou Paulo aos Filipenses? E Tiago, o irmão do Senhor, sentenciou: “onde há inveja e sentimento faccioso, aí há confusão e toda espécie de coisas ruins” (Tg 3:16).

A inveja contamina e corrompe, sem qualquer comparação, as relações humanas. Por inveja, difama-se, rouba-se e mata-se. Inclusive o Filho de Deus.

Como pastor, eu já vi a inveja destruir amizades, famílias e até dividir Igrejas. Conheço Igrejas cujo início se deu sobre sentimentos invejosos.

Considerando o quão nefasto é este pecado, e vendo que foi, e será o responsável direto pelas piores atrocidades do homem, é nosso dever nos empenhar cada vez mais para que ele não mova nem domine nossos atos.

Que Deus nos ajude.

sábado, 3 de março de 2007

"Comércio de nós"

Anunciaram ter achado um caixão com os ossos de Jesus.

Pronto! Não se falou de outra coisa durante dois dias: entrevistaram arqueólogos, estudiosos, religiosos ...

Basta aproximar-se o Natal ou a Páscoa que tudo se repete. Você se lembra em que época divulgaram o evangelho de Judas? Já reparou nos assuntos que a imprensa veicula nessas ocasiões?

É sempre a mesma coisa: estamos a menos de 40 dias da semana-santa, por que este ano seria diferente?

Este é outro aspecto das Escrituras Sagradas: “movidos por avareza, farão comércio de vós” (2Pe 2.3).

Comércio mesmo! Eu ficaria surpreso se não aproveitassem essas datas.

Não me surpreenderia se aparecesse algum “Diário de Caifás” contando os bastidores do julgamento de Jesus. Que editor não o publicaria?

Imagine o estardalhaço se aparecesse um texto de uma mulher, ou de uma criança, nascida na casa vizinha a de Jesus?

Alguns de nós, de tão acostumados, já nem percebem: Quantos livros foram escritos propondo uma revisão na história?

Quantas Bíblias foram editadas propondo uma nova abordagem dos acontecimentos? Já vi nas livrarias Bíblia de Promessas (como se a maior parte do texto canônico não fosse de advertências), da Criança, da Mulher, do Executivo ... Mas a “Bíblia do Mendigo” dificilmente será editada. Quem vai comprá-la?

Também não me surpreenderia com um DVD - agora mais acessível - da mesma cantata, que já foi gravada em vinil, em CD, em VHS, e dada como brinde a quem assinou uma revista de fofoca.

Nem me assustaria se os novos evangélicos, que foram destaque no último carnaval, apresentando algum show, ou coisa semelhante, com a promessa de que seu filho curtirá melhor a “mais fantástica história cristã”.

Essa é a natureza do comércio: adaptar-se a qualquer situação para tirar lucro dela.

O Natal foi e a Páscoa receberam já símbolos e praxes que apelam diretamente ao consumo: o Papai Noel, o Ovo e outros tantos. Precisam de novos a fim de que novos ramos comerciais participem, ou, no mínimo, chamar a atenção para a data. Isso é função da imprensa, que acaba comercializando também assuntos tão pertinentes quanto um ovo de coelho feito de chocolate é para a páscoa.

Chega!

Nunca respeitaram e não será agora que respeitarão o Senhor Jesus.

A última semana do Senhor, para nós, transcende a todas essas sandices. Ela representa de modo condensado toda extensão de seu ministério. Fala de desilusão, perseverança e vitória.

Desilusão dos coitados, arraigados neste mundo, interessados em milagres, ou em um pedaço de pão.

Desilusão de israelitas sinceros que aguardavam a restauração do Reino de Davi, sem sequer imaginar uma restauração espiritual.

Desilusão semelhante a que houve no monte da transfiguração, quando, de tão maravilhoso, se desejava ficar acampado ali, sem pensar nas trevas ameaçadoras lá de baixo.

Fala-nos também de perseverança em realizar a vontade de Deus apesar de amigos e de inimigos, de circunstâncias favoráveis ou da adversidades. Apesar de uma cruz.

Mas a semana termina em vitória. Não em uma cruz, e sim em um túmulo. Vazio.

E esta semana nos mostra tanto a justiça como o amor de Deus , pois justiça e amor levaram Jesus à cruz mas não o retiveram no túmulo, “Porque convinha que aquele, por cuja causa e por quem todas as coisas existem, conduzindo muitos filhos à glória, aperfeiçoasse, por meio de sofrimentos, o Autor da salvação deles. Pois, tanto o que santifica como os que são santificados, todos vêm de um só. Por isso, é que ele não se envergonha de lhes chamar irmãos, dizendo: A meus irmãos declararei o teu nome, cantar-te-ei louvores no meio da congregação. E outra vez: Eu porei nele a minha confiança. E ainda: Eis aqui estou eu e os filhos que Deus me deu”. (Hb 2.10-13)

Esqueçamos os “atrativos” que o comércio nos propõe e mantenhamos firmes nossa fé. Ela não pode ser comercializada: é impagável.