Não há como questionar a existência de uma ética cristã. Afinal as exigências que Jesus faz sobre o comportamento são maiores do que as que o senso comum - o orientador da ética geral - permite.
A ética geral diz que é errado matar alguém, mas a ética cristã diz que é igualmente errado odiá-lo. A ética geral apenas reprova o adultério como questão de “quebra de confiança”, mas a ética cristã o classifica como o único pecado cometido contra o próprio corpo. Há muitos outros exemplos.
Entretanto, não tenho visto acordo sobre a existência de uma estética cristã, que esteja para aparência do cristão assim como a ética está para seu comportamento. Ou, pelo menos, que, de certa forma, o obrigue a determinadas preferências como a ética cristã o obriga a determinados comportamentos.
Geralmente coisas assim são classificadas apenas como questão de gosto. Mas, será que qualquer uso que façamos de meios que atingem os sentidos de nosso próximo, ou deleitam o nosso coração, são indiferentes?
As Escrituras associam certos “aspectos” à realidades concretas, transmitindo-nos a impressão de que existe uma estética normativa. Veja os seguintes exemplos:
As referências que as Escrituras fazem a céu aparecem sempre associadas a claridade, luz, águas, alturas, harmonias, lado direito, caminho estreito, poucas pessoas, paz, etc. Ao passo que as referências a inferno aparecem sempre associadas a escuridão, trevas, sequidão, subterrâneos, barulho, lado esquerdo, caminho largo, multidões, guerra, etc.
A alegria sempre é associada com a virtude e a tristeza com o erro. Mas a alegria excessiva, sem domínio, também é condenada, como a tristeza pelos próprios erros é enaltecida.
A harmonia, a verdade, a cortesia, o frescor, os aromas e outros valores, que estão no limite entre a estética e a ética, são sempre mostrados como prêmios a virtudes cultivadas. Ao passo que seus opostos muitas vezes são usados para descrever castigos.
Prosperidade e penúria, saúde e doença, bom ânimo e abatimento, vitória e derrota, autocontrole e dissolução são também binômios antitéticos freqüentemente presentes e associados a bênçãos e maldições.
Há outras citações, mas, por amor à concisão, destaco as palavras do SENHOR através de seus profetas em que a beleza representa valores maiores. Por Jeremias (2.32) Deus se queixa de que a virgem não esquece seus adornos nem a noiva seu cinto, mas seu povo se esqueceu dele. E Isaías (61.10) refere-se a salvação como vestes e à justiça como manto tal qual o noivo que se adorna com um turbante e a noiva se enfeita de jóias.
O pregador nos ensina em (Pv 25.12) que “Como brinco de ouro e enfeite de ouro fino é a repreensão dada com sabedoria a quem se dispõe a ouvir.” e nos ordena: “Em todo tempo sejam alvas as tuas vestes, e jamais falte o óleo sobre a tua cabeça” (Ec 9.8). Porém nosso Senhor é mais explícito: “Tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto” (Mt 6.17).
Certos limites, porém, estão presentes: “... as mulheres, em traje decente, se ataviem com modéstia e bom senso, não com cabeleira frisada e com ouro, ou pérolas, ou vestuário dispendioso, porém com boas obras (como é próprio às mulheres que professam ser piedosas)” (1Tm 2.9-10).
Repare então que, muito próxima da ética, e debaixo de sua orientação, há, sim, uma estética cristã. Beleza e harmonia parecem ser seus valores principais, pois são os mais repetidos. Tal estética visa nosso próprio bem estar tanto quanto o bem estar de nosso próximo. Não tenho dúvida de que seja normativa e que estejamos obrigados a respeitá-la, pois além de exprimir valores eternos é a “manifestação cortez” da ética a que o Reino de obriga a todos os seus súditos.