Não é de hoje que alguns estudiosos apontam semelhanças
entre o Apocalipse de João e o Livro do Profeta Ezequiel (Para uma lista
completa veja o artigo de David Chilton,
“Apocalipse, Ezequiel e o Lecionário”, que pode ser achado em www.monergismo.com). Essas semelhanças podem
ser diretas (quando as palavras são praticamente as mesmas) ou indiretas
(quando o texto de João suscita apenas uma lembrança do texto de Ezequiel). A
seguir, listo alguns exemplos, que eu mesmo escolhi, de semelhanças diretas.
1 - O livro selado por dentro e por fora, doce aos
lábios (e, para João, amargo ao estômago),
descrito nos capítulos 5 e 10 de Apocalipse, pode ser visto em Ez 2.8 – 3.3.
2 - O trono de Deus, descrito em
Ap 4, é muito parecido com o que é descrito no capítulo 1 de Ezequiel.
3 - O povo
de Deus é marcado na fronte, tanto em Ap 7.2-8 quanto em Ez 9.1-8.
4 - Em
ambos (Ap 11.1-2 e Ez 40 – 43) o Templo é medido.
5 - Em
ambos um banquete terrível (das carnes dos comandantes e dos príncipes da
terra) é oferecido às aves do céu (e aos animais do campo, em Ezequiel): Ez
39.17-20 e Ap 19.5-21.
6 - Nos
dois há uma “primeira ressurreição”. No apocalipse, são aqueles sobre os quais
a segunda morte não tem poder (Ap 20.4-6) e, em Ezequiel, o vale de ossos secos
do capítulo 37.
7 - Com
exceção das listas genealógicas de Gênesis e de Crônicas, Gogue e Magogue só
são citados em Ezequiel e no Apocalipse. E em ambos como inimigos do povo de
Deus (Ap 20.7-9 e Ez 38 e 39).
8 - Em
ambos há uma descrição muito semelhante do que João denomina de “Nova
Jerusalém” (Ap 21 e Ez 40 – 48).
9 - João descreve
(Ap 22.1-5) o Rio da Vida de modo muito
parecido com o rio descrito por Ezequiel (Ez 47).
Há muito
mais! Entretanto, o que pretendo destacar, além da possibilidade de João ter
usado o livro de Ezequiel, é que ambos tenham descrito as mesmas realidades. Ou
seja: Ambos descrevem a mesma realidade.
Antes dos
dois, Isaías também já havia descrito o trono de Deus, mas ainda não vi quem
dissesse que Ezequiel usou o Livro de Isaías. Observe que, em cada uma dessas
descrições, os detalhes dos arredores do trono são minuciosos, mas as
descrições daquele que ocupa o trono é pouquíssima (ou inexistente) e muito
cuidadosa.
Em Ezequiel
(1.1-14) as figuras são: Vento tempestuoso, grande nuvem com fogo a revolver-se,
com o redor resplandecente e algo brilhante como metal em seu interior. Quatro
seres viventes, que saem da nuvem, tendo a aparência geral de homem, luzindo
como o bronze polido, parecidos com “carvão em brasa à semelhança de tochas”, com os pés parecidos a pés de bezerro e as pernas retas. Cada um
possuía quatro asas e quatro rostos (homem, leão, boi e águia), de modo que não
se viravam, mas estavam sempre andando para frente. Ziguezagueavam como
relâmpagos.
A “aparência da glória
do SENHOR” é descrita (1.26-28) assim: Em uma
espécie de trono de safira “uma figura semelhante a um homem” como metal
brilhante, como fogo resplandecente ao seu redor, como o arco-íris.
A reação de
Ezequiel: “caí com
rosto em terra e ouvia voz de quem falava”.
Em Isaías
as figuras são: trono rodeado de serafins (ardentes) que possuíam seis asas e
voavam ao redor gritando uns para os outros: “santo, santo, santo é o SENHOR dos Exércitos; toda a
terra está cheia da sua glória”.
O Senhor é
descrito apenas por sua roupa e por sua presença (enchendo o templo de fumaça e
fazendo tremer os alicerces).
A reação de
Isaías foi: “Então, disse eu: ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de
lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos
viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!”.
No
Apocalipse além dos elementos comuns aos relatos de Ezequiel e de Isaías há
também elementos novos:
1 - Diferentemente
de Ezequiel, João não revela do que o trono é feito (e transmite uma leve
impressão de que foi montado ali para aquela ocasião). Semelhantemente a
Ezequiel, João descreve um arco-íris ao redor do trono, porém com o aspecto de esmeralda.
2 - Além de
Ezequiel e Isaías, João fala de vinte e quatro anciãos, assentados em vinte e
quatro tronos, vestidos de branco portando coroas de ouro. Fala também de sete
tochas de fogo, “que são os sete Espíritos de Deus” e, lembrando Ex 24.10, de um “como que mar de vidro, semelhante ao cristal”.
3 - Semelhantemente
a Ezequiel, João descreve quatro seres viventes. Cada ser vivente tem um rosto
só (de leão, de novilho, de homem e de “águia em voo”). A tarefa
deles é semelhante a dos serafins descritos por Isaías: “... não têm descanso, nem de dia nem de noite, proclamando: Santo,
Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, aquele que era, que é e que há
de vir”. E, como os serafins, possuem seis
asas (diferentemente dos querubins Ezequiel, que possuem quatro asas). João acrescenta
nesses seres viventes a existência de olhos, “ao redor e por dentro”.
O que se
assenta no trono, diferentemente da descrição de Ezequiel, tem um aspecto mais
mineral (jaspe e sardônio – pedras avermelhadas) do que metálico.
Na
disposição do texto há outras semelhanças entre Apocalipse e Isaías: Antes da
visão do trono do Senhor, nos capítulos 1 a 5, através de muitas repreensões e
exortações e “ais”, Isaías descreve a pecaminosidade de Judá. No Apocalipse os
capítulos 2 e 3 mostram o estado de 7 Igrejas, com advertências e elogios a
seus “anjos”.
No capítulo
6 de Isaías e no capítulo 4 de Apocalipse temos as fantásticas descrições do
trono de Deus, seguidas de imprecações e castigos sobre Judá (em Isaías) e sobre
o mundo (em Apocalipse).
O clímax do
texto de Isaías está no perdão de seus pecados com a brasa trazida pelo
querubim, no texto de João está na abertura do livro selado por dentro e por
fora. Ou seja: Isaías vê o trono de Deus e se vê perdoado. João vê o trono de
Deus e o Cordeiro abrindo o livro cujos selos correspondem a tragédias castigando
os pecados da humanidade.
Três visões
do mesmo evento, cada uma de pontos de vista diferentes. As duas primeiras (uma
no templo e outra no exílio, na Babilônia) por profetas que tinham o mesmo ponto
de vista dos que esperavam o Messias. A última no exílio em Patmos, por um
apóstolo do Senhor. As três destacam a glória de Deus e a fragilidade
pecaminosa do homem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário