Os diversos relatos de despedidas
contidos na Bíblia, por mais pungentes que sejam, são feitos com sobriedade.
Quem de nós não sentiu, entre as linhas do texto, a dor do velho Abraão ao ser
obrigado a despedir Agar e a seu primogênito Ismael? Ou quem não surpreendeu-se
com a pronta decisão de Rebeca em acompanhar Eleazar e despedir-se de sua
família?
De fato, as despedidas são momentos
muito mais ricos do que as chegadas. Nelas, ainda que não percebamos, fazemos
uma espécie de balanço e nos preparamos para prosseguir a vida.
De tão importantes, os discursos
registrados na Bíblia por ocasião dessas despedidas foram catalogados como um
verdadeiro sub-estilo literário, onde se vê 1) a convocação dos fieis, 2)
anúncio da partida, 3) uma rememoração histórica do que Deus fez, 4) exortação
à fidelidade, 5) alertas sobre os perigos por vir, 6) promessas e palavras de
estimulo, 7) renovação de votos, 8) apresentação do sucessor e 9) oração.
Este é o esquema da despedida de
Moisés (Dt 31-33), da despedida de Josué (Js 23-24), da despedida de Samuel
(1Sm 12), da despedida de Davi (1Cr 28-29), da despedida de Paulo aos
presbíteros de Éfeso (At 20)...
Ainda que um pouco fora dessa ordem,
a segunda carta que Paulo escreveu a Timóteo também pode ser vista como um
grande discurso de despedida. Porém, o discurso de despedida por
excelência é o de Jesus conforme o registro de João (13-17).
Pois bem: depois de um período de
onze anos é hora de partir, mas não quero fazer qualquer discurso ou cerimônia
de despedida. Um adeus (onde quem fala recomenda seu ouvinte a Deus) é
suficiente.
Há algum tempo ressoa em meus ouvidos
as palavras de um velho professor: “mais importante do que a hora de chegar é
saber a hora de partir”. Mais cedo ou mais tarde todos nós partiremos. Se não
para ali, sem dúvida, para o além; e a despedida, que poderia ser controlada, e
com a qual se pode crescer, torna-se surpresa da qual dificilmente se extrai
algo de bom.
Que Deus nos poupe de tanto!
Levo a convicção, proveniente de uma
boa consciência, de que conduzi o rebanho do Senhor à pastos verdes e águas
tranquilas, tal como ele ordena a seus pastores.
Levo saudades daqueles com quem
dividi momentos de alegria e de dor, de nascimento e de morte, de admoestação e
de recuperação. Como deixar do lado de fora do coração os que moram nele? Como
esquecer-me dos que são as verdadeiras memórias?
As orações nos acompanharão e a
saudade será nossa testemunha diante de Deus.
Um último pedido: Não coloquem a
Palavra de Deus em segundo plano, pois ela é o único e verdadeiro alimento de
nossas almas e sob seu padrão é que prestaremos contas a Deus.