sábado, 23 de novembro de 2013

A carpintaria

Vimos, no domingo passado, que dois lugares marcam a vida de Jesus: a manjedoura e a cruz. Porém, entre ambas, ele viveu em outro lugar: na carpintaria. Enquanto as duas nos falam de momentos intensos no início e no fim de sua vida terrena, esta nos fala de um período maior.

A carpintaria é uma bela metáfora de como o Senhor viveu desde sua volta do Egito até o dia em que procurou João Batista, pois numa carpintaria nada é feito instantaneamente, tudo depende de esforço e paciência. Ora, com esforço e paciência, o Senhor viveu a lida de todos nós, aprendendo aquilo que sofremos para que, como sumo-sacerdote perfeito, pudesse compadecer-se perfeitamente de todos nós.

Tanto a manjedoura quanto a cruz destacam a intensidade de sua humilhação, mas a carpintaria nos fala da extensão. Da dura rotina do cotidiano que se repete debaixo do sol.

A mensagem dos Evangelhos destaca o ministério de Jesus em seus últimos três anos, mas o silêncio dos Evangelhos fala com eloquência de como o Senhor viveu a vida comum a todos nós. Esse silêncio, cortado por pouquíssimas informações, nos ensina muito.

Filho de um carpinteiro, como toda criança da época, aprendeu com seu pai o ofício que sustentava a família. Aprendeu como escolher a madeira mais adequada para o que ia fazer. Aprendeu a derrubar, transportar, preparar e trabalhar cada tora. Aprendeu a fazer esteios, vigas, traves, caibros, e quem sabe, alguns móveis também. Porém, paralelamente ao pesado trabalho de construtor, havia o, não menos pesado, de administrar o valor do que fazia.

Como calcular o valor de seu trabalho? Acaso, quem, por graça, fez o universo, não teria dificuldades em colocar valor na confecção de um caibro? Como resistir a um regateador? Como cobrar de um caloteiro? Isso ele aprendeu no cotidiano da carpintaria.

Trinta, dos trinta e três anos de vida, foram passados no anonimato. Apenas aos doze anos um clarão nos mostra que, além do ofício aprendido de José, seu pai, ele também aprendeu a Lei do Pai celeste. E aprendeu tão bem que atraiu admiração dos que eram tidos por doutos nela. O registro desse acontecimento explica: “E crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2.52).

A maioria desses trinta anos Jesus passou em Nazaré. Cidade mal vista, da qual não se esperava coisa boa, famosa por sua impiedade. Aliás, toda Galileia era mal vista: verdadeira mistura de nacionalidades e religiões, repleta de idolatria e de cultos imorais. Era conhecida também como Canaã, a terra do comércio, pois desde os primeiros tempos era passagem para as caravanas que vinham do norte até a principal potência de então: o Egito. Na Bíblia, dentre as muitas referências, a de mais fácil recordação é a da caravana que comprou José e levava especiarias para vender no Egito.

Na época de Jesus, além do Egito, o comércio com outros centros, como Líbano, Roma e Grécia, servia-se das rotas que o profeta Isaías chamou de Caminho do mar, que jazia à sombra da morte, e que com a chegada de Jesus viu grande luz.

Ainda jovem, com a morte de seu pai, Jesus tornou-se responsável pela manutenção de casa: sua mãe, quatro irmãos e, pelo menos, duas irmãs. E passou a ser conhecido como “o carpinteiro”. Certamente em sua oficina não se encontrava trabalho desleixado nem mal feito.

Mas, afinal por que esperar trinta anos? Alguns dizem que, como os levitas aguardavam os trintas anos, ele também aguardou. Não tenho tanta certeza de que esta seja a razão, pois ele não era levita. Mas, para mim, independente do motivo, esses anos na carpintaria, ele nos dá uma grande lição: O que importa é fazer a vontade do Pai. Seja na carpintaria, na manjedoura, ou na cruz.

 

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