sábado, 26 de julho de 2008

Yap os “Rahi” e nós

Querendo mostrar o quanto os valores dependem de nós mesmos e não das coisas em si, Peter Bernstein, em seu livro “O Poder do Ouro”, escreveu sobre uma das ilhas da Micronésia chamada Yap, e citou William Furness, antigo estudioso daquela cultura: “a comida, a bebida e as roupas dão nas árvores e são acessíveis a todos”. Os habitantes daquele pequeno lugar viviam com fartura: entre eles não havia opulência, mas também não havia miséria.

Porém não se sabe por que, partir de dado momento inventaram um modo de se destacar uns dos outros e criaram uma moeda. Na verdade um “objeto de valor”. Era uma pedra calcária extraída de uma ilha vizinha: os “Rahi” (ou Fei).

Em formato de discos, variavam em tamanho, desde o diâmetro de um pires, até outras que, de tão grandes, eram furadas ao meio para duas pessoas poderem carregar.

Quanto maior a pedra, mais rico era seu dono. E alguns eram “tão ricos” que tinham de deixar suas pedras próximas ao mar, onde eram feitas. Todos sabiam quem era o dono de qual. E, se as menores podiam ser usados como moeda de troca, as maiores representavam o patrimônio de uma família que podia ser deixado aos herdeiros. Mas nunca saíam dali. Roubá-los? Prá que? Alem de ser trabalhoso todos saberiam quem era o verdadeiro dono.

O mais interessante é que o “Rahi” da família mais rica não estava visível. Afundara em uma tempestade enquanto era trazido pelo dono que supôs ser melhor fazê-la na ilha de onde vinham as pedras, pois só teria de transportar o “Rahi” e não a pedra toda da qual ele seria esculpido.

Quando os alemães, na guerra, invadiram a ilha só conseguiram obrigá-los a construir uma pista de pouso “confiscando seus “Rahi”. Pintavam neles uma suástica - sem tirá-las de seus lugares - prometendo devolvê-las - apagar a suástica - logo que a pista fosse terminada.

Você deve estar pensando que esse pessoal de Yap era muito ingênuo, mas será que eles eram mais ingênuos do que nós?

O Apóstolo Pedro nos ensina que já nos foram dadas todas as coisas que conduzem à vida e a piedade. Temos a vida eterna e disso não duvidamos, mas somos piedosos? Ou seja: vivemos vidas santas?

Como os nativos de Yap recebemos de Deus os meios de vida. Eles receberam os meios de vida física e nós de vida espiritual. Temos tudo o de que necessitamos para viver a vida que Deus exige de nós, mas inventamos nossos “Rahi” para mostrar a todos o quanto somos espiritualmente ricos.

Não são verdadeiros “Rahi” algumas crendices que inventamos? E acaso conseguiremos ser mais ricos da graça de Deus usando nossas invenções? Acaso superaremos a abundância e a ordem com que ele nos sustém, fazendo pedras?

Ao criar essas coisas que não estão previstas em sua Palavra, a única coisa que fazemos é nos tornar mais orgulhosos e menosprezar nossos irmãos.

Correntes de oração, reuniões de poder, pactos ou votos embaraçosos, bênção de “irmãos poderosos”, copo de água sobre o rádio, Bíblia com o Salmo 91 aberto em direção da porta... o que mais?

Alguns anos atrás “quase bati” em um colega pastor que insistia em que eu batizasse o filho dele com água que trouxera do Rio Jordão.

Geralmente se diz: se não fizer bem, mal não faz. Faz sim! Em vez de receber com louvores a fartura com a qual Deus nos agracia, nossa atenção passa a ser desviada para confecção de pedras, às quais fatalmente daremos mais valor do que ao que vem das divinas mãos.

Examine bem sua vida. Veja se você está fazendo - ou já fez - alguns “Rahi”. E saiba de uma coisa: eles só servem para lhe prejudicar. Livre-se deles.

sábado, 19 de julho de 2008

Lembranças da adolescência

Quando leio o Salmo 23 sempre me lembro de que Davi estava falando do que conhecia bem. Afinal, quando adolescente, ele cuidava das ovelhas de sua família. Mas, repare bem: quando adolescente.

De fato, depois de ir levar comida a seus irmãos que estavam no campo de batalha contra os filisteus, não há mais indicações históricas de que ele tenha voltado para sua rotina de casa.

Chegando ao campo de batalha viu o pavor que Golias infundia nos soldados de Israel, inclusive em seus irmãos, e decidiu enfrentá-lo. O resto da história sabemos desde a infância.

Vitorioso, foi levado por Saul para seu palácio e lá ficou. Mesmo quando perseguido por Saul e refugiado em cavernas, desertos, ou nações vizinhas, não há relato de que ele tenha voltado à viver na casa de seu pai; muito menos de que voltasse a cuidar de ovelhas.

Para mim este Salmo está calcado sobre as reminiscências de sua adolescência. Aliás prefiro pensar que ele tenha sido escrito em sua velhice, pois sinto nas entrelinhas um cheiro de saudade próprio de quem já viveu bastante.

Aquele que, quando adolescente, fora pastor de ovelhas, agora é o “pastor de Israel”: E lembrando-se do que fazia às suas ovelhas, vê seu dever para com a nação sobre a qual reina. Nesse contexto é que entendo como ele percebe que o Bom Pastor é muito mais atencioso. “Nada me faltará”, portanto, é mais do que uma expressão: é sua constatação diária.

Nos cuidados de alimentar, pastos verdes e águas tranqüilas são retratos da suprema providência do Bom pastor. Providência tão especial que ele não conclui referindo-se simplesmente ao alimento físico, que poderia ser expresso por “sacia-me” ou “dessendenta-me”, mas com “refrigera minha alma” que fala muito mais de satisfação espiritual.

Nos cuidados de levar, fica ainda mais clara a preocupação espiritual. As veredas pelas quais ele é guiado não são descritas como gramadas, sem pedras, ou macias - como aquelas nas quais ele guiava seu rebanho - mas como “veredas de justiça”. E o vale perigoso, no qual a morte faz sombra, é enfrentado sem temor, pois o carinho do cajado que puxa pra perto e a prontidão da vara que afasta o perigo é verdadeiro “consolo”.

Nos cuidados de tratar, a mesa, o óleo e o cálice, as necessidade do espírito esclarecem totalmente que ele não refere-se a simples ovinos. A mesa, apesar de ser defronte, não é afetada pela presença dos adversários. O óleo não é usado para pensar feridas, mas para ungir a cabeça semelhantemente ao que se fazia a um sacerdote. O cálice, de abundante, transborda.

E, nos cuidados finais, ele sequer menciona o carnear ou a tosquia - finalidade primeira de uma ovelha - mas a habitação na casa do Bom Pastor, escoltado por sua bondade e sua misericórdia. Não por alguns dias, nem por uma temporada, mas para todo sempre.

O Salmo 23, por tudo isso, é um Credo em que as reminiscências do passado, falam do que ocorre no presente e apontam para a esperança no futuro. É também uma confissão da dependência divina de todos aqueles que conhecendo suas limitações de ovelhas confiam na graça do Bom Pastor.

Faça dele suas palavras. Eu já o fiz minhas.

sábado, 12 de julho de 2008

A alma redimida e seu Amado

As Escrituras Sagradas, em muitos lugares, nos exortam a progredir na fé: Jesus nos ordena a frutificar; o escritor da Carta aos Hebreus, igualmente, a que, deixando o leite, busquemos alimento sólido, pois atendendo ao tempo decorrido já deveríamos ser mestres; o Apóstolo Paulo deplora nossa meninice e exorta a que atinjamos a estatura de varão perfeito e em outro lugar a que desenvolvamos a nossa salvação. Progredir na fé não é algo opcional é uma obrigação.

Um belo exemplo de como progredimos na fé aparece no relacionamento entre os cônjuges do Cântico dos Cânticos, nas três declarações semelhantes da esposa:

Em 2.16: “O meu amado é meu, e eu sou dele”.

Em 6.3: “Eu sou do meu amado, e o meu amado é meu”.

Em 7.10: “Eu sou do meu amado, e ele tem saudades de mim”.

Essas afirmações retratam diversos estágios da maturidade do relacionamento conjugal. E, tomando os princípios de interpretação usados pelo Apóstolo Paulo no capítulo dez de sua primeira carta aos coríntios, podemos entendê-las melhor.

No primeiro estágio, com a avidez própria de quem encontra algo muito precioso - como aquela pérola de grande preço da parábola do Senhor - esse bendito relacionamento caracteriza-se por uma espécie de “egocentrismo” da esposa em que se destaca seu afã em afirmar posse sobre seu amado.

A mútua pertença está presente, mas note a ordem: “o meu amado é meu”. Só depois ela afirma “e eu sou dele”. Assim também ocorre ao cristão no início de sua vida.

Os que insistem em permanecer nesse estágio transmitem a impressão de que Deus lhes é propriedade exclusiva. E chegam a tratá-lo como servo, determinando e exigindo dele as coisa mais estapafúrdias e pueris. Se não chegam a negar a fé por palavras o fazem pelas obras.

Os que procedem amadurecendo chegam ao segundo estágio em que as relações de pertença ainda continuam mútuas, mas a ordem se inverte: “Eu sou do meu amado” e depois “o meu amado é meu”.

Pelo conhecimento maior e melhor de quem é o Amado de nossas almas as prioridades também se invertem. Muitas coisas então passam a fazer sentido. Como, por exemplo, as palavras do Amado: “Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros...”.

E a medida da estatura da plenitude de Cristo é expressa na última declaração: “Eu sou do meu amado, e ele tem saudades de mim”.

Para que essa frase fique mais clara optarei por outra tradução, já que “saudades” dilui o significado do verbo hebraico.

A maioria das traduções usa o verbo desejar. E, de fato, a palavra hebraica aqui é a mesma com que Deus amaldiçoou o desejo da mulher logo após o pecado: “... o teu desejo será para o teu marido...” (Gn 3.16).

Neste estágio a Redenção aparece completa. A salvação foi desenvolvida ao limite do que é possível nesta vida. Já não é mais a mulher, que escravizada pelo pecado, tem seu desejo como propriedade do marido (o que ocorre até hoje aos que não foram redimidos por Cristo), mas é o marido que nutre desejos por sua esposa.

Dentro desse contexto é que se pode entender as ordens veementes da Escritura de que o marido deve amar a esposa como Cristo ama a Igreja.

Também, dentro desse contexto é que os redimidos, seguros, amadurecidos e firmes - quais cônjuges amados - desenvolvem sua salvação junto ao Amado de suas almas.

A vida conjugal redimida - de cônjuges redimidos - é um notável paralelo entre a vida cristã, até mesmo em seu desenvolvimento.

Por essa razão Deus detesta tanto o divórcio e a vida conjugal sem compromisso.

sábado, 5 de julho de 2008

Já não és digno de ser meu pai!

Sob nenhuma hipótese teríamos coragem de concordar com um filho que dissesse isso de seu pai. Porém, às vezes, agimos assim com nosso Pai celeste. E ele sabe! Não apenas sabe, como nos alerta, direta ou indiretamente, sobre o quanto isso o desagrada. Um desses alertas é a Parábola do Filho Pródigo.

Você se lembra? O filho caçula pediu adiantado a parte da herança a que tinha direito afrontando enormemente a seu pai, pois seu ato subentendia que o considerava morto.

Afrontou-o mais ainda quando vendeu tudo o que tinha, demonstrando que não pretendia mais voltar àquela casa e dela só queria levar o que pudesse ser gasto em outro lugar. E, aumentou a afronta dissipando o suor de seu pai dissolutamente em terra estranha.

Porém, longe da casa do pai, vendo-se reduzido ao destino de todos os que quebram o quarto mandamento - cuidar de porcos - quando tentou comer a comida deles, e não deixaram, percebeu o quanto aviltara-se. Lembrou-se então de onde era digno: a casa de seu pai.

Sua consciência pesada não o permitia ver a bondade do pai em toda sua extensão, mas tinha certeza de que, mesmo como reles patrão, seu pai era mais bondoso do que as pessoas com quem convivia.

Ensaiou um pedido de perdão cujo término era a frase “já não sou digno de ser chamado teu filho”. Nesta frase, que falta nos lábios do irmão mais velho, está expresso o verdadeiro reconhecimento da bondade de seu pai e de sua miserabilidade.

Nas queixas do irmão mais velho, e especialmente em recusar-se entrar na casa onde o pai recebera com festas o caçula, está presente a terrível inversão: “Já não és digno de seres chamado meu pai”.

Do mesmo modo que o caçula ele também recebeu adiantado a parte que lhe cabia dos bens: “... e lhes repartiu os haveres”. Mas, diferentemente do caçula, foi hipócrita e continuou em casa vendo no pai apenas um patrão: “... a tantos anos que te sirvo, sem jamais transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito sequer para alegrar-me com os meus amigos”.

Sua afronta ao pai tornou-se pior do que a afronta do caçula, pois ele obrigou o paia sair de casa tentando conciliá-lo.

Afinal, o que suas queixas e atitudes dizem senão que o pai tinha se tornado indigno dele? Não estava claro o pensamento de que ele era bom demais para ser filho daquele pai?

O comportamento do caçula parece-nos mais comum do que o comportamento do mais velho, mas, examinando bem, ele é apenas mais visível, e os dois são igualmente comuns.

Certa vez, explicando que, apesar de infinitamente amoroso, o Pai Celeste também é infinitamente justo e não deixará o ímpio sem castigo, alguém me respondeu: “... mas Deus não é assim. Se eu não guardo rancor de ninguém, imagine Deus”. Esta pessoa acabara de declarar que se achava mais digna do que Deus.

Quando rejeitamos a simplicidade do Evangelho e a verdadeira festa que o Pai faz ao receber de volta seu filho perdido, e, como o irmão mais velho, dizemos “não gostei”, não estamos cometendo o mesmo pecado?

“Já não és digno de ser meu pai. Vou procurar quem me satisfaça. Entrarei na casa onde eu seja valorizado” ... Como eu escuto, cada dia mais, frases assim!

Meus irmãos; desejo de todo coração, que atitudes assim estejam cada vez mais longe de nós. Especialmente considerando, que nossos quarenta anos como Igreja de Deus pressupõem, conforme as Escritura, que já “deveríamos ser mestres atendendo ao tempo decorrido”.

sábado, 28 de junho de 2008

Tempos de refrigério

O clima ameno das últimas semanas trouxe noites frescas o suficiente para se tirar o cobertor do armário.

Em noites assim o sono parece ser mais profundo e o silêncio “mais audível”. Depois das dez é possível escutar o barulho das corredeiras, e, de madrugada, os trabalhadores que passam na rua, encolhidos pela aragem fria, não fazem algazarra, sequer falam alto. Dá pra dormir até as sete horas.

Um dia desses, curtindo o frio da manhã, me lembrei das palavras de Pedro em seu sermão do dia de Pentecostes: “vos sobrevenham tempos de refrigério”.

O que será que entenderam com essa promessa de Pedro?

Para um povo em que a vida no deserto era conhecida ao ponto de terem como esperança textos como “nunca mais terão sede, não cairá sobre eles o sol, nem ardor algum” (Ap 7.16), certamente a palavra refrigério tinha muito a dizer.

Essa mesma palavra é usada pelo salmista ao descrever os cuidados do Bom Pastor. Veja: “Leva-me para junto das águas de descanso; refrigera-me a alma” (Sl 23.2-3).

Há outros textos em que a palavra refrigério não aparece, mas a idéia está presente, seja em promessa seja na esperança de dias melhores.

Aliás, você já reparou quantas vezes a palavra “sombra”, cujo sentido é muito semelhante, aparece como figura da proteção divina? Não é às sombras das asas do Senhor que nos escondemos e que o próprio Jesus queria agasalhar Jerusalém?

Lembro-me de uma vez em que atravessei a ponte com o sol a pino - ao chegar perto dos correios vi que o termômetro marcava quarenta e seis graus - como a ponte pareceu comprida! Pareceu bem maior do que de fato é. Era apenas desconforto físico, mas foi terrível. Imaginei então o ardor que atinge a alma sem Deus. É muito pior. A tais pessoas é que Pedro promete “tempos de refrigério”.

Não sei que tipo de refrigério é o mais ansiado por sua alma. Entretanto posso garantir que só o Bom Pastor pode lhe dar.

Mas não o procure com o interesse. Nenhum de nós se agrada de alguém que nos procura visando satisfazer um interesse. A tais pessoas costumamos chamar de interesseiros. Por que seria diferente a reação do Senhor?

Sei que ele é rico em misericórdia, mas isso não é desculpa para tratá-lo pior do que você trata a seu igual.

Procure-o por ele mesmo.

“Agrade-se dele e ele satisfará os desejos de seu coração”.

terça-feira, 24 de junho de 2008

No leito

No leito, enquanto dormimos, recebemos bênçãos superiores as que eventualmente viríamos a conseguir levantando-nos de madrugada, dormindo tarde e comendo o pão que penosamente granjearmos.

No leito “consultando o travesseiro” e, meditando na Palavra do Senhor, aguçamos nossa consciência, fortalecemos nossas convicções e nosso coração nos ensina.

No leito somos objetos da graça e misericórdia de Deus, que muitas vezes nos devolve a saúde, ou “afofa-nos a cama” quando é sua vontade que permaneçamos nela.

No leito sem mácula honramos o amor conjugal pactuado em nossos corações, a exemplo do bendito pacto eterno através do qual somos do Amado de nossas almas e Ele é nosso.

Mas, no leito também “nadamos nossas lágrimas e alagamos nosso pranto” ao perceber o quanto os perversos se multiplicam e o mal se alastra ao ponto de atingir aquilo que de mais precioso tentamos preservar.

Ainda no leito deprecamos nossa situação e, ao fazer o balanço do nosso dia, e, o encontrando em falta, recorremos ao único de quem podemos dizer “em paz me deito e logo pego no sono, pois tu SENHOR me fazes repousar tranqüilo”.

No leito os pecadores não encontram descanso de suas preocupações. E, mesmo dormindo, o que lhes vem é a obsessão em construir “novos celeiros” e garantir à própria alma: “tens muito em depósito: come, bebe e regala-te”.

No leito os perversos maquinam perversidade. Abjurando o discernimento e a prática do bem, estudam como podem atingir o justo e como podem ser mais eficientes em fazer o mal.

No leito os ímpios repousam o corpo e afadigam a alma. Pois sabem que se aproximam céleres do último leito reservado ao corpo - fechado escuro e frio - enquanto a alma, por leito, terá calor e trevas; choro e ranger de dentes.

No leito os escarnecedores maculam o pouco do bem que ainda poderiam conservar e, cobertos de nódoas, o que fazem “o só referir é vergonha”.

O leito pode ser lugar de bênçãos e de maldições. Mas certamente é lugar de teste. Lugar muito propício a nos conhecermos melhor.

domingo, 15 de junho de 2008

Ser ou não ser?

As Escrituras Sagradas fazem diversas referências a crianças com muitos significados diferentes. Algumas vezes fala de crianças mesmo, outras vezes elas são metáforas de muitas coisas.

Veja que simbologia rica.

Quando Jesus falou a respeito da salvação usou uma criança como modelo dos que são salvos e disse: “... se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus” (Mt 18.3).

Diferentemente, através do profeta Isaías, Deus ameaça seu povo com governantes infantis: “Porque eis que o Senhor, o SENHOR dos Exércitos, tira de Jerusalém e de Judá o sustento e o apoio. Todo sustento de pão e todo sustento de água, e [todo] o valente, o guerreiro e o juiz; o profeta, o adivinho e o ancião; o capitão de cinqüenta, o respeitável, o conselheiro, o hábil entre os artífices e o encantador perito. Dar-lhes-ei meninos por príncipes, e crianças governarão sobre eles. Entre o povo, oprimem uns aos outros, cada um, ao seu próximo; o menino se atreverá contra o ancião, e o vil, contra o nobre.” (Is 3.1-5).

E tais símbolos não param por aí. Pedro fala das crianças recém nascidas, como um modelo a ser imitado no desejar do genuíno leite espiritual. Como se dissesse: do modo como as crianças anseiam pelo leite da mãe, assim devemos ansiar pela Palavra de Deus.

O Escritor de Hebreus nos ensina que nosso desejo deve ser deixar de lado a infantilidade, que é alimentada de leite, e não consegue entender além dos rudimentos da fé – como imposição de mão e ensino de batismos – e prosseguir em direção a vida adulta dependente de alimento sólido e que “pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal” (Hb 5.14).

Ao censurar a igreja de Corinto pelo mal uso dos dons espirituais Paulo diz: “... não sejais meninos no juízo; na malícia, sim, sede crianças; quanto ao juízo, sede homens amadurecidos” (1Co 14.20).

Há muitos outros ensinos. Mas finalmente, a respeito da missão dos oficiais doados por Cristo à sua Igreja, o mesmo Apóstolo disse que a principal tarefa deles é promover o crescimento do povo de Deus: “... para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro” (Ef 4.14).

Há quem diga - e só menciono aqui por ter ouvido recentemente - que este tema só prova que a mensagem de Jesus é diferente da mensagem dos profetas e de seus apóstolos (que representam a igreja institucionalizada). Nada mais tolo - ou ficando dentro do mesmo campo semântico: nada mais pueril.

O que nosso Senhor e Mestre destacou como a virtude infantil que deve ser imitada é a mesma que Paulo destaca: a ausência de malícia. Lembre-se de que Jesus a destaca depois de ver seus apóstolos - os mesmos que deveriam ir pelo mundo afora como seus embaixadores - discutindo quem era, dentre eles, o maior. Isso é o que devemos evitar.

Nesse tipo de pensamento e comportamento devemos ser como crianças, pois quem não é já está atestando não ser filho do Reino de Deus, onde ninguém age assim.

Entretanto no juízo, no exame da Palavra de Deus, na ética cotidiana, no trabalho da Igreja devemos ser homens amadurecidos.

Hoje elegemos oficiais em nossa Igreja. Que o compromisso de todos seja com o amadurecimento contínuo do Rebanho aqui congregado e uma luta constante para afastar essas infantilidades - para não dizer absurdos - que rodeiam o povo de Deus e tanto causam descrédito a fé cristã.

Seja o desejo e o alvo de todos nós.

domingo, 8 de junho de 2008

“Vós não sois assim”

Algumas palavras de nosso Senhor e Mestre devem ressoar mais fortes aos nossos ouvidos nesses dias em que nos preparamos para eleger oficiais em nossa Igreja. Certamente a frase título deste artigo é uma delas.

Lucas nos informa que eles haviam acabado de participar da Santa Ceia quando começaram “uma discussão sobre qual deles parecia ser o maior”. Repreendendo-os, o Senhor lhes determinou como deviam ser.

Lembre-se de que nesta ocasião o Senhor lavou os pés de cada um, e lhes ordenou que fizessem uns aos outros o que ele havia acabado de fazer-lhes.

Sua repreensão inclui uma análise das relações sociais, na qual mostra a nossa conhecida “pirâmide social” em cujo topo estão os que exercem autoridade e poder e na base os que são conduzidos: “Os reis dos povos dominam sobre eles, e os que exercem autoridade são chamados benfeitores” (Lc 22.25).

E então os instruiu.

Na organização de Jesus a “pirâmide social” está invertida: os que lideram e os maiores estão na base. É como uma família, onde o pai que a lidera é exatamente o que mais tem responsabilidades de serviço, e sobre a qual ela repousa.

Essa figura - a da família - orientará todos os textos do Novo Testamento sobre escolha de oficiais para a Igreja. Na verdade a família será o principal local de prova em que o candidato a oficial da Igreja deve ser examinado. Examinando-o como vive em família a Igreja deve atestar diante de Deus que vê nele as qualidades determinadas para ser um dos líderes, que a conduzirá à “pastos verdes e águas tranqüilas”.

Em que outro lugar poderemos saber se ele é esposo de uma só mulher, hospitaleiro, que governa bem sua própria casa, que cria seus filhos sob disciplina, etc., senão em sua família? Então, olhando para a família do candidato a oficial, teremos as informações necessárias para qualificá-lo conforme as determinações de nosso Senhor e Mestre e discernir se deve ser escolhido ou não oficial na Igreja do Senhor.

Estamos a uma semana do dia em que escolheremos 1 presbítero e 5 diáconos para nossa Igreja. É, portanto, a hora em que - volto a afirmar - essas palavras devem ressoar com mais força em nossos ouvidos, ao ponto de entendermos que, na Igreja, um bom Pai de Família preenche mais os critérios estabelecidos pelo dono dela, do que o melhor empresário, o melhor intelectual ou o mais rico e poderoso dos homens.

domingo, 1 de junho de 2008

A quem tem lhe será dado ...

Em poucas semanas os alimentos ficaram mais caros. Um gráfico noticiado mostrava que o arroz, tão corriqueiro em nossas mesas, se considerado internacionalmente, teve um grande aumento de preço. No relatório “The Rice problem” a FAO fala de mais de 100% de aumento.

Porém, mais interessante é a explicação dada pelas principais autoridades mundiais no assunto - a FAO inclusive: Os mais pobres estão comendo mais! E, quando a procura por um produto é maior do que sua oferta, é esperado que seu preço aumente.

Fico perplexo: será que em poucas semanas a quantidade de pobres que antes não comia - arroz, por exemplo - cresceu tanto assim? E, se cresceu, e passaram a comer mais arroz, o que comiam antes? Ou será que em pouco tempo nasceu tanta gente assim e já comendo arroz?

Que explicação canhestra, para não dizer perversa! Aquilo que finalmente podem comprar fica mais caro justamente porque mais pessoas podem comprar.

Tenho maior impressão de falta de alimentos do que de excesso de pessoas. E como aconteceu em pouco tempo desconfio mais da especulação do que de outra coisa.

Lembro-me o que aconteceu quando Israel voltava do cativeiro na Babilônia. Tão bem repreendido pelo profeta: “Ouçam, vocês que pisam os pobres e arruinam os necessitados da terra, dizendo: Quando acabará a lua nova para que vendamos o cereal? E quando terminará o sábado para que comercializemos o trigo, diminuindo a medida, aumentando o preço, enganando com balanças desonestas e comprando o pobre com prata e o necessitado por um par de sandálias, vendendo até palha com o trigo?” (Amós 8.4-6 - NVI).

Lembro-me também, assustado, das palavras de nosso Senhor e Mestre: “...ao que tem, ser-lhe-á dado; e, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado”.

Estas palavras foram repetidas por ele em dois contextos e em ocasiões diferentes.

Contexto profético - Quando ele contou a Parábola das Minas/Talentos (Mt 25.14-30 e Lc 19.11-27), ensinando que quanto mais somos fiéis na administração daquilo que a nós é confiado por Deus, tanto mais ele colocará sob nossa administração.

Contexto de ensino - Quando ele contou a Parábola da Candeia (Lc 8.16-18), exortando seus ouvintes a serem atentos ao verdadeiro sentido de suas palavras. Ressalto a figura notável: “vede como ouvis”, e seu paralelo mais enfático em Marcos 5.21-25 “com a medida que tiverdes medido vos medirão também, e ainda se vos acrescentará”.

Essas palavras (a quem tem ser-lhe-á dado) sempre me pareceram a mais terrível das profecias feitas pelo Senhor.

Acaso não sabemos pela experiência que quanto mais posses uma pessoa tem, mas fácil é conseguir outras? Algum banco empresta dinheiro a quem não tem condições de pagá-lo? Parece que nessas poucas palavras o Senhor esboçou profeticamente o que chamamos de capitalismo.

Igualmente, não percebemos desde os primeiros anos de escola, que quando sabemos bem um determinado assunto torna-se mais fácil de aprender o assunto seguinte? Parece também que nas mesmas palavras está resumido o que sabemos sobre acúmulo do conhecimento e competência pessoal.

Porém, de repente, diante de nossos olhos, elas ganham novo sentido e mostram as disparidades alimentares do mundo.

A Bíblia fala de fome no passado. Lembre-se de José no Egito. Mas Jesus também fala dela como “sinal dos tempos”. E a pluraliza: “fomes” (Mt 24.7 e Mc 13.8).

No Passado, a fome atingia predominantemente o povo como um todo (como ainda acontece hoje nos países mais pobres e mais explorados, que, de certo modo, ainda vivem naqueles tempos). Se não fosse a providência divina usar José, todos os habitantes do Egito - ricos e pobres - passariam fome. Hoje parece que a fome também foi globalizada, pois com o aumento de preços dos alimentos, apenas uma classe social - em todos os países - será afetada: os pobres.

Cumprir-se-á então um aspecto terrível da profecia do Senhor, conforme o registro de Lucas 8.18: “... e ao que não tiver, até aquilo que julga ter lhe será tirado”.

Então o que devemos fazer? Ou, o que podemos fazer? Nosso próprio bom senso e as Escrituras nos alertam contra a especulação. Que esse não seja nosso modo de ganhar nosso pão.

Somos, também ordenados a discernir os tempos. Para tanto as palavras do Senhor são atualíssimas: “haverá fomes e terremotos em vários lugares; porém tudo isto é o princípio das dores. ... levantar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo. E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então, virá o fim” (Mt 24.7-14).

sexta-feira, 23 de maio de 2008

“Absurdos pentecostais” - Parte 2

Vimos, domingo passado, que, o Senhor agraciou sua Igreja com seu Espírito Santo e o inimigo de nossas almas, com grande auxílio de nossa própria natureza pecaminosa, fez, e continua fazendo tudo o que pode, para desvirtuar o verdadeiro propósito da sua atuação em nossas vidas.

Vimos também que dos grandes avivamentos nasceram muitas correntes. Tantas correntes quantas pessoas foram influenciados por eles: Um verdadeiro “cristianismo individual”.

Porém, didaticamente, podemos falar de ondas, ênfases, ou, para usar a terminologia bíblica: “ventos de doutrinas”, que atingiram a Igreja sucessivamente.

A primeira ênfase foi dada na santidade pessoal. Eram os chamados movimentos “Holyness”, que destacavam a necessidade de uma “segunda bênção” - após a qual não se pecava mais - e que, necessariamente, era atestada pelo falar em línguas. Ainda hoje encontramos vestígios dessa ênfase. Entretanto, a experiência diária e a vida pecaminosa de muitos líderes diminuíram sua força.

Anos depois veio a ênfase nas curas, no desafio às doenças e, em casos extremos, aos animais peçonhentos. Argumentam: a Bíblia não garante vitória àquele que beber veneno ou for mordido por serpentes? Mas como todos os exageros passam esse também, aos poucos, foi caindo no esquecimento.

A ênfase mais atual, aparentemente a mais “mundana”, fixa-se na prosperidade. Sua máxima é que o salvo não pode passar dificuldades financeiras, pois é filho do dono da prata e do ouro.

Essas três ênfases ainda podem ser vistas, e, apesar de terem chegado sucessivamente ao Brasil, e criado comunidades diferentes, não é difícil encontrar o uso de todas elas em um mesmo local.

Vale notar que a primeira ênfase - a busca de vida santa - foi a que mais males causou às igrejas protestantes tradicionais, já que é a mais difícil de ser discernida. As duas últimas fazem mais sucesso entre os grupos sociais mais pobres, ou mais sujeitos às instabilidades como aqueles que dependem de vendas ou cumprimento de metas.

Vale notar também que há alguns absurdos tipicamente brasileiros. Por exemplo, o “dente de ouro”, onde o atestado de que alguém recebeu a bênção de Deus é ter uma obturação amarelada.

Parece que ainda virão outras ênfases, pois só o tempo nos permitirá classificar adequadamente o “riso santo”, o “vômito santo”, as “imitações santas” - seja de leões ou águias - e os “santos espetáculos” onde, a pretexto de culto, o teatro toma conta do culto com danças ou representações.

Todas trouxeram para dentro das igrejas tradicionais, no mínimo, duas mazelas. 1) Valores invertidos: onde a preocupação principal passou a ser agradar o rebanho e não a Deus. 2) Dúvida: Será mesmo que a Bíblia é mesmo a única e suficiente regra de fé?

Os pastores que orientam seu ministério pela Bíblia sofrem muito com isso, especialmente quando vêem crentes verdadeiros fascinados e os Concílios inserindo na Agenda traçada por Jesus compromissos que ele jamais assumiria.

Há alguns anos atrás a Comissão Executiva do mais alto Concílio de nossa denominação foi levada a assistir um filme em que a lição principal era deixar de lado a tradição e seguir em frente, rumo aos novos tempos. O filme contava como uma prostituta escondida em um convento reavivava o coral das freiras de tal modo que chegaram a se apresentar ao Papa.

Se permitirmos, Hollywood assume a cátedra. Depois disso o melhor que conseguiremos fazer será nos apresentar em outros ritmos. Então já estará esquecia a verdadeira e real finalidade do Espírito Santo: transformar corações e levar Igrejas a uma vida mais santa.

sábado, 17 de maio de 2008

“Absurdos pentecostais” (Parte 1)

Como foi que, em nome do Espírito Santo, os evangélicos, outrora tão ciosos do nome que deveria ser zelado, chegaram à práticas absurdas como venda de “Sal da prosperidade”, “fronhas ungidas para trazer sonhos proféticos”, ou uso de “correntes de oração para alcançar vitórias”, e outras que, o só mencionar, é vergonha? Como chegou-se a isto?

Não seria difícil historiar o movimento pentecostal se o espaço não fosse tão pequeno. Então farei apenas um esboço, e disponho-me a fornecer todas as minhas fontes a quem quiser estudar mais.

Os primeiros absurdos estão registrados na própria Bíblia. Começaram com Ananias e Safira, que, invejando o dom da contribuição, fingiram possuí-lo e acabaram mortos por mentir ao Espírito Santo.

Logo depois há o caso de Simão. Mágico, ilusionista, impressionado com os milagres, propõe aos apóstolos comprar “esse poder, para que aquele sobre quem eu impuser as mãos receba o Espírito Santo”.

Hoje não se espera a proposta dos modernos Simões. Pelo contrário: faz-se propostas a eles e cada vez mais - através de cursos, congressos, livros, apostilas, DVDs, e semelhantes - se estimula a que façam o que o primeiro desejava. Naqueles dias, Simão foi repreendido severamente por Pedro e foi advertido do perigo que corria.

Os demais absurdos registrados na Bíblia estão todos na Carta à Igreja de Corinto. De todas as Igrejas do Novo Testamento, apenas a de Corinto apresentava o que hoje chamaríamos de “problemas pentecostais”.

Apesar de ter sido fundada pelo próprio Paulo, algum tempo depois de sua partida estava fragmentada em partidos - pelo menos quatro - que se hostilizavam mutuamente.

Toleravam imoralidades terríveis, como o incesto, mas brigavam para ver quem era mais “espiritual”. Aliás, o nome de um dos partidos era “Os Espirituais”. Eles habitualmente menosprezavam quem não tinha os dons que julgavam mais importantes. Especialmente o dom de línguas.

Paulo os repreendeu severamente. Mostrou-lhes os erros em que incorriam, e lhes impôs freios tais, que até hoje são eficientes para coibir abusos.

Depois do período bíblico, até a Reforma Protestante, tais movimentos sucederam-se: Montano com suas duas discípulas, Priscila e Maximila (que alegava ser o porta-voz do Espírito Santo e completaria as profecias apocalípticas de João), os begardos, as beguinas, os cátaros, a Irmandade do Espírito Livre, Joaquim de Fiore e outros.

No século 16, os Reformadores os rotulavam de entusiastas, fanáticos, espiritualistas, frenéticos e libertinos (pois sempre eram acompanhados por um baixo padrão moral dos costumes).

No século 17 surgiram os Quackers, para quem a Bíblia estava sujeita “à interpretação da silenciosa voz interior do crente”. Deles, uma dissidência menos silenciosa, deu origem aos Shakers (os que sacodem ou que são sacudidos).

No século 18 apareceram os Grandes Avivamentos destacando a necessidade de se ter obrigatoriamente uma experiência pessoal (sentir) além da fé (crer). Aliás, para eles a tal experiência era o que provava a existência da fé. O resultado foi um cristianismo tão subjetivo que as doutrinas passaram a falar mais da experiência do homem do que do conteúdo da fé.

Daí pra cá, nunca se estudou, ou se escreveu, tanto sobre o homem e seus problemas. E hoje, mesmo diante da mais completa exposição do que é a verdadeira fé, se cobra uma “aplicação” relevante para o dia-a-dia do ouvinte, como se uma vida de fé não bastasse.

Todos esses absurdos podem ser vistos hoje e eles estão mais próximos de nós do que supomos. Às vezes, disfarçados com novas roupas, recebem nosso aplauso.

(Continua na próximo domingo)

sábado, 10 de maio de 2008

Como vento e como fogo

Não é raro encontrarmos nas Escrituras Sagradas algumas palavras que deixam claro a dificuldade de expressar o que elas descrevem. Por exemplo: “a cidade é de ouro puro, como vidro transparente”? Ou as que Paulo ouviu e disse que além de inefáveis eram ilícitas ao homem pronunciá-las.

Lucas, na descrição da descida do Espírito Santo sobre a Igreja em Jerusalém, também enfrentou essa dificuldade. Sabemos que ele procurou informar-se com exatidão, com os que viveram os acontecimentos. Cremos que ele foi assistido pelo próprio Espírito Santo na descrição feita. Mas atente para a descrição feita.

A casa em que todos estavam reunidos não foi sacudida por vento. Mas “enchida” por um som semelhante ao som que faz um vento tempestuoso.

Tampouco foi incendiada. Mas línguas ‘como de fogo’, separadas umas da outras, apareceram e pousaram: uma sobre cada cabeça.

Estes dois símbolos são sinérgicos e não podem ser apreciados separadamente, pois falam da mesma coisa.

O som de vento, certamente lembrava a judeus o Espírito de Deus (Ruach em hebraico: que é uma onomatopéia de respiração).

Era-lhes comum a lembrança de textos como: “Então, Moisés estendeu a mão sobre o mar, e o SENHOR, por um forte vento oriental que soprou toda aquela noite, fez retirar-se o mar, que se tornou terra seca, e as águas foram divididas” (Ex 14.21). Ou do profeta Samuel a quem foi mostrado “os fundamentos do mundo” quando Deus descobriu-lhe as profundezas do mar pelo “iroso resfolegar das suas narinas” (2Sm 22.16).

Para eles o vento era símbolo do Espírito de Deus: seu sopro e sua respiração, que vivifica. Mas na casa em que se aglutinavam 120 pessoas o vento se faz presente pelo seu som.

Já ouvi de muitas pessoas, e eu mesmo tive a experiência, de “sentir” um ambiente - no meu caso uma igreja - “cheia de som” em que os grandes pulmões de um órgão de tubos transmitia a impressão de que se podia tocar naquela “matéria etérea” que a tudo enchia e pervadia.

O fogo também fazia parte da “memória simbólica” deles. O fogo da sarça não a consumia, o fogo do tabernáculo, cheio da “presença de Deus”, não consumiu a Moisés nem o povo sobre o qual se levantava como coluna. Mas reduziu à cinzas, como castigo terrível, os filhos desobedientes de Arão. E, como sinal de aprovação, consumiu as ofertas sobre o altar.

Porém, naquele bendito dia “eram línguas como de fogo”. Como se fossem miniaturas daquela enorme coluna que acompanhava o povo pelo deserto. João vem novamente em nosso auxílio: “Vi como que um mar de vidro mesclado de fogo” (Ap 15.2). Inefáveis experiências. Eventos indescritíveis.

Mesmo não descritos em sua totalidade, foram fatos reais, que de alguma forma foram expressos através de analogias com outros fatos semelhantes já acontecidos.

Agora, pare e pense: Os elementos vento e fogo não estavam totalmente presentes. Porém, paradoxalmente, as palavras estavam. Eram idiomas! Hoje, talvez, coreano, russo, finlandês, árabe, etc.

Não houve uma “tradução simultânea”. O milagre não foi no ouvir, mas no falar: verbo repetido 6 vezes nesse texto. O Espírito Santo capacitou a falarem imediatamente idiomas, que, via de regra, são aprendidos depois de muito esforço e muito tempo de estudo.

Eles não falaram coisas sem sentido: evangelizaram. Proclamaram a Jesus e as “grandezas de Deus”. Finalmente podiam ir “pelo mundo inteiro e pregar o evangelho a toda criatura”. Não ficaram em Jerusalém em sons desconexos fingindo idiomas.

Certamente esse tema também estava no pensamento do Apóstolo ao advertir a Igreja de Corinto: “Deus não é de confusão” (1Co 14.33).

Essa advertência é também para nós.

sábado, 3 de maio de 2008

A ascensão de Jesus

Uma vez Jesus contou uma parábola sobre um homem que deixou noventa e nove ovelhas e saiu em busca de uma que se havia perdido. Seu objetivo era falar da maior alegria que há nos céus “por um pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”.

Entretanto, creio que nesta parábola há excelentes pontos de comparação com a própria obra do Senhor Jesus.

Primeiro Jesus é o verdadeiro Pastor - o Bom Pastor - do qual todos os pastores - aqueles que se preocupam em livrar as ovelhas da perdição - são apenas tipos.

Ele, como o homem da parábola, também veio em busca de sua ovelha que se perdeu, e, como o homem da parábola, tomou sua ovelha nos próprios ombros e a levou de volta para casa alegre e espalhando alegria.

.::.

Quando chegou a hora certa e os tempos se completaram o Verbo se fez carne. O Pai lhe formou um corpo. Os anjos o contemplaram e rejubilaram-se. E ele, o Verbo, deleitou-se em fazer a vontade do Pai.

Assumiu nossa natureza, fazendo-se um de nós. Tomou sobre si as nossas dores, e foi moído pelas nossas iniqüidades. “Entregue por causa das nossas transgressões, ressuscitou por causa da nossa justificação”.

Hoje nos relembramos do dia de sua volta à glória que tinha junto do Pai antes que houvesse mundo. Hoje nos lembramos de que, ao lado do Pai, ele intercede por nós.

Voltou.

Os anjos o viram e novamente rejubilaram-se. O Pai o viu e o recebeu satisfeito. Tão satisfeito quanto ele próprio ficou ao ver o fruto do penoso trabalho de sua alma.

O bom pastor achou a ovelha que se havia perdido. Deixou as outras noventa e nove e saiu pelos lugares perigosos da perda e do dano - amaldiçoados com cardos e abrolhos - e achando-a, colocou-a nos ombros e a trouxe para casa.

Salvação completa.

Não apenas possibilidade de salvação: Redenção.

Depois de tudo consumado, não havia mais o que fazer senão reassumir o que era antes. Mas reassumir como um de nós. E, como um de nós, com nossa natureza adquirida ao tabernacular conosco, recebeu do Pai todo poder no céus e na terra. Nele “reside toda plenitude”.

.::.

Quinta-feira passada completou-se 40 dias deste a data em que relembramos a ressurreição do Senhor. E, conforme as Escrituras, após haver dado ordens aos seus discípulos e aos seus apóstolos, ascendeu aos céus.

Hoje é dia de meditarmos na segurança que sua volta aos céus nos dá. Lá - um de nós, que em tudo foi tentado, mas em nada pecou e sabe compadecer-se dos que também são tentados - por nós intercede e por nós aguarda.

Nos aguarda certo de que o que fez não foi em vão.

Resta-nos apenas cumprir o nosso tempo - como ele cumpriu seu próprio tempo - e nos mudarmos para lá.

sábado, 26 de abril de 2008

NEC TAMEM CONSUMEBATUR

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Há muitos anos atrás, quando dava forma de povo aos descendentes de Abraão, o SENHOR apareceu a Moisés. Apareceu em uma sarça, que, incendiada, não se consumia.

Dali soubemos que Ele É o que É. E esse fogo que manifestou-se a Moisés na sarça ardente, acompanhou o povo de Deus. Aliás, acompanha até hoje.

Algum tempo depois - já livres do Egito - voltaram ao mesmo lugar em que Moisés vira a sarça, e acamparam-se ao redor do monte.

Enquanto Moisés recebia a Lei, mais do que a sarça, o monte todo ardia. Ardia de tal modo que mesmo após milhares de anos foi descrito com estas palavras: “não tendes chegado ao fogo palpável e ardente, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade, e ao clangor da trombeta, e ao som de palavras tais, que quantos o ouviram suplicaram que não se lhes falasse mais, pois já não suportavam o que lhes era ordenado: Até um animal, se tocar o monte, será apedrejado. Na verdade, de tal modo era horrível o espetáculo, que Moisés disse: Sinto-me aterrado e trêmulo!” (Hb 12.18-21).

Ordenados, edificaram um tabernáculo consagrado exclusivamente ao culto divino e o fogo manifestou-se novamente. Incendiou o altar. Consumiu as ofertas que lá haviam sido postas. E, sobre o próprio tabernáculo, ateou-se ao céu santo e terrível.

Durante os quarenta anos seguintes esta chama sagrada acompanhou o povo deixando bem claro que, como a sarça, apesar de sempre arderem na presença de Deus, eles nunca se consumiriam.

Protegeu-lhes indicando o caminho, a hora de andar e a hora de parar. Santificou-lhes consumindo o que lhes sujava e livrando-os de quem se atrevia apresentar outro tipo de fogo.

Séculos mais tarde, na terra prometida, o tabernáculo móvel foi substituído pelo edifício do templo e o fogo manifestou-se novamente. Como fizera antes, consumiu a enorme quantidade de ofertas e encheu da presença inefável o lugar santo.

Mas o tempo que apaga as lembranças, também leva as novas gerações a não considerarem o que aconteceu às gerações passadas. E, sem significado, o templo foi reduzido a escombros.

Os anos se passaram e sob o patrocínio de um rei estranho, reedificou-se o templo e voltou-se à liturgia dos antepassados. Mas não se fala nada sobre a chama sagrada. Ela se fora.

Estranhos continuaram embelezando aquele lugar sem chama. E no ápice de sua beleza serviu de foro para o hediondo julgamento do Senhor. Continuou belo, mas já não servia de habitação ao Senhor. Sequer simbolizava sua presença. Ele mesmo desnudara-lhe a futilidade rasgando a cortina que velava a santidade do local onde a chama deveria residir.

Mas um dia, enquanto a festa mais rica acontecia nas dependências do templo, a mesma chama - a da sarça, do Sinai, do tabernáculo e do primeiro templo - incendiava a cabeça de cada um dos novos descendentes de Abraão.

Bendita chama daquele que É o que É, e fez-se Deus conosco. Bendita e terrível chama que identifica agora novas sarças, novos tabernáculos, novos templos: Templos vivos nos quais ele habita. Inaudita glória. Tremenda responsabilidade.

Oportuna ocasião para pensarmos no real sentido do Pentecostes e deixar de lado essas infantilidades modernas que só trazem vergonha sobre o Nome Sagrado.

sábado, 12 de abril de 2008

Quando as âncoras não são mais necessárias

Wierum monument.JPG

...a fim de lançar mão da esperança proposta;
a qual temos por âncora da alma,
segura e firme e que penetra além do véu,
onde Jesus, como precursor, entrou por nós...
Hebreus 6.18-20

Das cinco vezes em que a palavra "âncora" aparece nas Sagradas Escrituras, apenas neste texto é usada como metáfora.

Há muito tempo os navegadores aprenderam que uma pedra presa por uma corda e lançada ao fundo d'água, mantém o barco parado. E, apesar de todo desenvolvimento tecnológico que deu a âncora a forma que conhecemos hoje, ainda se pesca apoitado.

A âncora (ou poita) é a única coisa que mantém o barco parado a despeito do movimento da água.
Será que há uma metáfora mais bela do que esta para o que chamamos de fé? Duvido. Porém a Bíblia a usa como metáfora da esperança.

Curiosamente, em nossos dias, essas benditas âncoras estão sendo deixadas de lado. Com a ênfase no individualismo - traço definidor de nosso dias - muitos não querem mais um porto onde podem ficar seguros. Ao contrário, preferem viver como barquinhos à deriva: ao sabor da emoção do momento.

As âncoras estão perdendo a utilidade.

Na foto acima, um artista usou cinco âncoras para homenagear "os que se perderam no mar". Esse monumento fica em uma pequena cidade pesqueira holandesa, e faz todo sentido para os moradores de lá. Aliás, dentro da Igreja Reformada de lá, dependurada no teto, há uma miniatura de um barco de pesca. E, certamente não foi composto lá, mas a primeira coisa que me veio a mente foi o hino em que cantamos: "guarda o marinheiro no violento mar".

Que fotos teriam sentido semelhante hoje? De pessoas drogadas em uma sarjeta? De multidões atrás de um enganador? De massas humanas em delírios bacantes ou em "transe gospel"?
Barquinhos sem âncoras. Sem âncoras por preferirem o vagar das ondas, “levados ao redor por todo vento de doutrina”.

Sem âncoras por não verem porto onde atracar, ou vendo-o, mesmo assim, preferem a incerteza das vagas, ou o sabor do sobe e desce à segurança do porto.

Sem âncoras porque as transformaram em enfeite, em monumento à própria perda no mar do desespero e da solidão.

Isso não é opção para quem tem Jesus, pois nossa âncora atravessa o véu das realidades transitórias, e firma-se na certeza de que onde ele está estaremos também.

(Fotografia gentilmente cedida por Marcel Pelt)

domingo, 6 de abril de 2008

Dia após dia

Alguns dias, pela própria natureza deles, parecem, que são mais "difíceis" do que os demais. Não estou falando daqueles que passamos em uma cama de hospital, mas dos que fazem parte do que chamamos de rotina diária. Outros dias são tão diferentes que parecem nem passar. Como as águas de um rio, eles simplesmente fluem.

Dos primeiros já ouvi dizer - ou talvez eu mesmo já tenha dito: “Ô dia encrencado! Nada deu certo”. Dos outros já ouvi coisa semelhante, porém com o sentido totalmente contrário: “Como produzi! Tudo se encaixou.”

Parece que classificamos os dias como difíceis ou fáceis em função de acontecimentos agradáveis ou não. Mas os acontecimentos inesperados contribuem muito para nossa avaliação.

Ao fim de um dia difícil, nosso humor pode ser drasticamente alterado para melhor, quando, por exemplo, encontramos alguém muito querido, que não víamos há bastante tempo.

O contrário também é verdadeiro.

Certa senhora, que lutava ao lado do marido hospitalizado há meses, me contou, que se esqueceu de tudo durante horas, quando encontrou seu apartamento inundado por um vazamento no banheiro do vizinho de cima. Seu dia piorara! (como se isso fosse possível).

Esses eventos bons ou maus fazem parte do “grande ferramental” de que a Providência Divina usa em nosso próprio benefício. Todos eles trabalham juntos. Ou, como nos ensina o Apóstolo Paulo: cooperam para o bem dos que amam a Deus.

Não sei como isso funciona ou como é administrado, mas nosso Senhor, “todo-providente”, faz com que, das coisas más, nos venham bênçãos. Em outras palavras: as coisas más contribuem para nosso bem.

Porém, a grande dificuldade que existe é aceitarmos com gratidão os eventos da providência divina.

Não há como mudar o que já aconteceu, porém insistimos, em trazer o passado de volta, tornando-o motivo de dor através de lembranças ruins que amarguram o presente.

Curiosamente o passado nunca traz alegrias. No máximo, doces saudades daquilo que aconteceu e que não se repetirá. E, novamente a amargura “atualiza” o único tempo sobre o qual temos alguma espécie de controle: o presente.

Não há como saber o futuro, porém o desejamos com tantos detalhes que o ansiamos. E, de uma forma misteriosa, o futuro - que ainda não existe - traz amargor ao presente, pois nos leva a ficar “pré-ocupados” com aquilo que ainda não aconteceu. E novamente perdemos as alegrias do presente.

O que fazer? Segundo nosso Senhor e Mestre não há muito. Aliás só há uma coisa: confiar naquele que cuida dos pássaros e do lírios e que certamente cuidará de nós também. Ou seja: exercitar a fé. Isso é o verdadeiro “viver pela fé”!

Ele deixou muito claro, que do passado, a única coisa a fazer é nos apropriar do perdão de Deus. E do futuro, recebê-lo dia após dia, com alegria de saber que ele nos é administrado pelo Senhor do tempo.

Ah! Uma última coisa: Todos eles, mesmo os que classificamos de bons, sempre nos trarão alguma espécie de contratempo. Isso lhes é inerente. Afinal nosso Mestre nos ensinou: “basta a cada dia seu próprio mal”.

Sem essa pitada de dificuldade diária, facilmente nos esqueceríamos do Senhor da providência.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Figueiras folhudas

Uma das parábolas mais conhecidas do Senhor Jesus é a da figueira. Nela, ele nos manda ficar atentos para seus ramos e folhas, pois quando eles se renovam e começam a brotar o verão está próximo.

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Dois ou três dias antes, enquanto Jesus andava pela estrada que ia para Jerusalém uma figueira chamou-lhe a atenção. Renovada, ela estava folhuda. E ele estava com fome.

Diante da possibilidade de encontrar saborosos figos temporãos - ou talvez pela sugestão implícita no nome do lugar: Betfagé (casa dos figos maduros) – ele resolveu buscar alguns.

Decepção: só havia folhas. Castigo: “ninguém mais coma figos de ti”.

E a figueira secou.

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Entrando em Jerusalém dirigiu-se à outra figueira. Figueira da qual todas as demais eram símbolos: o Templo.

Examinou e o viu tão, ou mais, folhudo do que a figueira do caminho. Cheio de atividades. Verdadeira empresa moderna.

Comércio de vitimas para os viajantes de longe que não podiam trazê-las. Comércio de vítimas com pureza cerimonial pré-aprovada para poupar o tempo das filas. Até de pombas que deveriam ser as vítimas dos pobres eram vendidas!

Câmbio para que qualquer valor fosse convertido em moeda local - devia ser flutuante e sujeito às demandas das festas - mas era uma conveniência tão grande, para aqueles dias, como o chips subcutâneos o são nas “mega-churches” de hoje.

A “figueira/templo” estava folhuda mas sem frutos!

Decepção. Só havia aparências. Castigo: chicote, expulsão, imprecação: “a casa de meu Pai é a casa de oração para todos os povos e vocês a transformaram em um covil de ladrões”. Maldição: “Não ficará pedra sobre pedra”.

Anos depois o templo foi arrasado.

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A Parábola da Figueira pode até falar de realidades futuras, mas retrata realidades passadas – duas figueiras folhudas e sem frutos – e nos adverte sobre as realidades presentes: As figueiras de hoje estão mais folhudas do que nunca. Portanto, o verão está às portas. Ai delas se não tiverem os frutos que o Senhor procura nelas.

E, pode estar certo de que, ele não procura por belos conjuntos musicais, muito menos por excelentes artistas ou oradores. Ele também não procura por ouro, obras de arte ou adornos e sim por “amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio”.

sexta-feira, 21 de março de 2008

O Dia da Ressurreição é o Dia da Nova Criação

Como eu poderia deixar de celebrar a ressurreição de meu Senhor? Acaso seria tão ingrato? De forma alguma. Celebrarei sim.

Entretanto me cercarei de cuidados. E o primeiro será dar-lhe exclusividade: não a confundirei com uma data qualquer.

Hoje a moda é celebrar. E, a qualquer pretexto, celebra-se qualquer coisa. Às vezes mais de uma ao mesmo tempo, e algumas até irônicas como, no mesmo dia, celebrar-se o “Dia do Circo”, o “Dia da Escola” e o “Dia do Consumidor”. Terei o cuidado de reservar esse dia com carinho: deleitar-me nele, para usar a expressão do profeta, e não celebrar nenhuma outra coisa.

Dar-lhe-ei também centralidade. Meus compromissos serão organizados a partir dela. Não me aproveitarei dela para fazer outras coisas. Não transformarei o tempo que dediquei a lembrar-me do maior evento com que fui agraciado, em meu dia de lazer.

Como o Apóstolo Paulo apressou sua viagem, não se demorando na Ásia, para poder chegar a Jerusalém a tempo do Pentecostes - que acontecia 50 dias depois da Páscoa - farei todo o possível para organizar meu tempo - até minhas viagens - de modo a estar com os meus queridos na data em que meu Senhor, vencendo a morte, nos deu vida.

Mas não celebrarei supersticiosamente, achando que isso me tornará mais santo.

Não celebrarei vulgarmente, achando que é apenas uma convenção cristã.

Não celebrarei mundanamente achando que tudo se resume a festa.

Celebrarei de joelhos. Não meramente os joelhos externos, mas aqueles outros joelhos que são infinitamente mais difíceis de serem dobrados, já que dependem de um coração contrito, de um orgulho subjugado, e mais do que de tudo dependem de se colocar o ânimo nas mãos furadas de pregos daquele que, antes de ressuscitar, morreu a mais infame e vergonhosa de todas as mortes: a morte de cruz.

Celebrarei a nova criação! O evento que Adão e Eva não souberam aproveitar. Celebrarei ter recebido o que eles teriam ganhado se tivessem obedecido ao Senhor. E que eu ganhei porque o Senhor o obedeceu por mim.

Tenho muitos motivos para celebrar!, Celebrarei sim.

sábado, 15 de março de 2008

Entradas em Jerusalém

Quase setecentos anos antes de Jesus entrar em Jerusalém, montado em um jumento, os príncipes de Nabucodonozor também entraram: em montarias de guerra.

Dois anos antes eles haviam cercado Jerusalém, e, como registrou o cronista sagrado, levantaram tranqueiras ao seu redor. Por dois anos Jerusalém suportou falta de alimentos - felizmente havia um fonte dentro dos muros - mas ninguém podia sair da cidade.

Pacientes, os babilônios trabalharam até abrir uma brecha na muralha. Abriram e puseram em fuga todos os “homens de guerra”, que logo foram alcançados e desbaratados: o rei Zedequias foi preso com sua família.

Vingativos, os babilônios mataram a todos os príncipes e a família de Zedequias. Depois furaram seus olhos. A última coisa que ele viu foi sua corte e seus queridos serem mortos.

O profeta Jeremias estava lá. As ordens do rei da Babilônia eram claras: ele deveria ser protegido. Há muito tempo ele tinha falado que a única esperança para Israel era sofrer o cativeiro, e, desde então ele foi tido por traidor, e seu próprio povo tentou matá-lo.

O que era claro para Jeremias é que não se pode fugir do castigo de Deus. O melhor que se pode fazer é recebê-lo: “por a boca ao pó”!

Hoje nos lembramos do dia em que Jesus entrou em Jerusalém. Ele não teve de cercá-la, nem de abrir uma brecha em seus muros - nem cegar suas autoridades, pois elas estavam duplamente cegas - pelo contrário: foi recebido com gritos de alegria, palmas, ramos e roupas forrando o chão em que sua humilde cavalgadura passava.

Entretanto, ao ver a cidade de longe, diferentemente dos Babilônios, chorou de compaixão e lamentou: “Ah! Se conheceras por ti mesma, ainda hoje, o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos. Pois sobre ti virão dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados, te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não deixarão em ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste a oportunidade da tua visitação” (Lc 19.42-44).

A situação de Jerusalém então era pior. Por um capricho, deram a João Batista um fim pior do que o de Jeremias, e agora recebiam o Filho de Deus, sem reconhecê-lo como tal. Recebiam-no como se fosse alguém um líder contra os Romanos.

Há certa semelhança com o que está acontecendo em nossos dias: Jesus tem sido recebido até com aplausos e festas, porém nunca como deveria ser. Às vezes o honram com títulos tolos, como o maior psicólogo, mestre, líder, etc. do mundo, porém nunca como o verdadeiro Deus em quem habita corporalmente a plenitude da divindade.

Hoje as palmas e as roupas que estendem por seu caminho são bajulações grosseiras e falta de respeito (para dizer pouco). Entretanto ele continua apresentando-se humilde como quem cavalga um animal de carga.

Ainda é tempo de reconciliação. O senhor ainda pode ser achado. Ainda está perto.

Não perca a oportunidade de buscá-lo.

segunda-feira, 10 de março de 2008

No tempo de Deus

Ontem à noite tentei ver a lua, mas apesar do céu limpo, todo estrelado, não consegui. Por esses dias ela deve apresentar-se em quarto crescente.

À época de Jesus esse era o sinal para que o maior turno de sacerdotes começasse os preparativos para subir à Jerusalém.

Deixavam seus afazeres com parentes ou vizinhos e se preparavam para passar um mês morando nas dependências do templo, comendo apenas do que era consagrado - carne, produtos de trigo e vinho - e para uma rotina altamente elaborada e repetitiva.

Este turno era o mais ‘sanguinário’, pois além de ter de fazer tudo o que os demais turnos faziam (as ofertas contínuas, que consistiam no sacrifício de 2 cordeiros por dia, 4 aos sábados, e 2 touros, 7 cordeiros e 1 cabra às luas novas e todos numerosos sacrifícios que qualquer israelita trouxesse ao altar), lhes cabia imolar os muitos cordeiros pascais: milhares!

Entretanto não sabiam que no turno deles o verdadeiro Cordeiro Pascal seria imolado. Não no templo nem diretamente por eles, mas como realização do antítipo com que se afadigariam durante aquele mês.

Nas dependências do templo, enquanto eles examinavam os sinais de pureza, que qualificavam um cordeiro para o sacrifício, verificando atentamente seu corpo, os representantes de todo Israel, reunido o Sinédrio, presidido pelo príncipe dos sacerdotes, valendo-se de tortura, e testemunhas falsas, examinava os “sinais de culpa”, que qualificariam o verdadeiro cordeiro para a morte.

Fora do templo, em ironia ímpar, entregaram a verdadeira vítima a “gentios”, e longe do altar consagrado, a cruz consagrou os que “não eram povo” e a terra que não era santa.

Cumpriu-se então: “os reinos desse mundo tornaram-se do Senhor e do seu Cristo”.

Logo o crescente será substituído pela lua nova (a que hoje chamamos de cheia). Quando ela estiver brilhante lembre-se de que nesta noite, há muitos anos atrás o Senhor foi traído.

Traído não apenas por Judas, nem apenas pelos demais apóstolos que fugiram, mas por toda uma nação tirada “de um amortecido”, e mantida com a “mão forte e o braço estendido” do mesmo que substituiu o filho de Abrão pelo seu.

Nação que ano após ano, século após século, sacrificando tantas vítimas, estava suficientemente avisada sobre o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”.

Lembre-se também que sob a luz daquela lua, de certa forma o traímos também. Afinal os meus pecados, os seus e de todos aqueles a quem Deus chamou foram imputados a seu Filho e por ele fomos reconciliados com o Pai.

Essa é a boa nova!

Ainda sobre Carnaval

Nesta semana que passou a internet “viralizou” um vídeo de um carnavalesco comparando um desfile de uma escola de samba com um despacho de m...