Em poucas semanas os alimentos ficaram mais caros. Um gráfico noticiado mostrava que o arroz, tão corriqueiro em nossas mesas, se considerado internacionalmente, teve um grande aumento de preço. No relatório “The Rice problem” a FAO fala de mais de 100% de aumento.
Porém, mais interessante é a explicação dada pelas principais autoridades mundiais no assunto - a FAO inclusive: Os mais pobres estão comendo mais! E, quando a procura por um produto é maior do que sua oferta, é esperado que seu preço aumente.
Fico perplexo: será que em poucas semanas a quantidade de pobres que antes não comia - arroz, por exemplo - cresceu tanto assim? E, se cresceu, e passaram a comer mais arroz, o que comiam antes? Ou será que em pouco tempo nasceu tanta gente assim e já comendo arroz?
Que explicação canhestra, para não dizer perversa! Aquilo que finalmente podem comprar fica mais caro justamente porque mais pessoas podem comprar.
Tenho maior impressão de falta de alimentos do que de excesso de pessoas. E como aconteceu em pouco tempo desconfio mais da especulação do que de outra coisa.
Lembro-me o que aconteceu quando Israel voltava do cativeiro na Babilônia. Tão bem repreendido pelo profeta: “Ouçam, vocês que pisam os pobres e arruinam os necessitados da terra, dizendo: Quando acabará a lua nova para que vendamos o cereal? E quando terminará o sábado para que comercializemos o trigo, diminuindo a medida, aumentando o preço, enganando com balanças desonestas e comprando o pobre com prata e o necessitado por um par de sandálias, vendendo até palha com o trigo?” (Amós 8.4-6 - NVI).
Lembro-me também, assustado, das palavras de nosso Senhor e Mestre: “...ao que tem, ser-lhe-á dado; e, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado”.
Estas palavras foram repetidas por ele em dois contextos e em ocasiões diferentes.
Contexto profético - Quando ele contou a Parábola das Minas/Talentos (Mt 25.14-30 e Lc 19.11-27), ensinando que quanto mais somos fiéis na administração daquilo que a nós é confiado por Deus, tanto mais ele colocará sob nossa administração.
Contexto de ensino - Quando ele contou a Parábola da Candeia (Lc 8.16-18), exortando seus ouvintes a serem atentos ao verdadeiro sentido de suas palavras. Ressalto a figura notável: “vede como ouvis”, e seu paralelo mais enfático em Marcos 5.21-25 “com a medida que tiverdes medido vos medirão também, e ainda se vos acrescentará”.
Essas palavras (a quem tem ser-lhe-á dado) sempre me pareceram a mais terrível das profecias feitas pelo Senhor.
Acaso não sabemos pela experiência que quanto mais posses uma pessoa tem, mas fácil é conseguir outras? Algum banco empresta dinheiro a quem não tem condições de pagá-lo? Parece que nessas poucas palavras o Senhor esboçou profeticamente o que chamamos de capitalismo.
Igualmente, não percebemos desde os primeiros anos de escola, que quando sabemos bem um determinado assunto torna-se mais fácil de aprender o assunto seguinte? Parece também que nas mesmas palavras está resumido o que sabemos sobre acúmulo do conhecimento e competência pessoal.
Porém, de repente, diante de nossos olhos, elas ganham novo sentido e mostram as disparidades alimentares do mundo.
A Bíblia fala de fome no passado. Lembre-se de José no Egito. Mas Jesus também fala dela como “sinal dos tempos”. E a pluraliza: “fomes” (Mt 24.7 e Mc 13.8).
No Passado, a fome atingia predominantemente o povo como um todo (como ainda acontece hoje nos países mais pobres e mais explorados, que, de certo modo, ainda vivem naqueles tempos). Se não fosse a providência divina usar José, todos os habitantes do Egito - ricos e pobres - passariam fome. Hoje parece que a fome também foi globalizada, pois com o aumento de preços dos alimentos, apenas uma classe social - em todos os países - será afetada: os pobres.
Cumprir-se-á então um aspecto terrível da profecia do Senhor, conforme o registro de Lucas 8.18: “... e ao que não tiver, até aquilo que julga ter lhe será tirado”.
Então o que devemos fazer? Ou, o que podemos fazer? Nosso próprio bom senso e as Escrituras nos alertam contra a especulação. Que esse não seja nosso modo de ganhar nosso pão.
Somos, também ordenados a discernir os tempos. Para tanto as palavras do Senhor são atualíssimas: “haverá fomes e terremotos em vários lugares; porém tudo isto é o princípio das dores. ... levantar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo. E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então, virá o fim” (Mt 24.7-14).