Ao pé da letra esta palavra exprime a qualidade de quem teve uma boa aventura. Entretanto, por uma dessas funções peculiares à língua portuguesa ela aponta mais para o estado e tempo presente da pessoa a que se refere sem considerar muito a aventura na qual teve sucesso no passado. Tanto é que o primeiro sinônimo que nos ocorre dela é “feliz”, quando na realidade deveria ser “bem sucedido”.
A palavra que está no Novo testamento é “Makarioi” e a Vulgata, no Século 4, a traduziu por Beati (Bem-aventurados ou felizes) de onde vem o termo popular “beato”.
Em Inglês, a Bíblia de Genebra , de 1599, a traduziu por Blessed (abençoados). A King James de 1611/1769, a The New American Standard Bible, de 1977, e a The New International Version de 1984, mantiveram Blessed.
Em Francês, a tradução conhecida como Louis Segond (1910) e a Bible en Français Courant de 1997 (Linguagem corrente) usam Heureuex (felizes).
Em Italiano, tanto a Nuova Diodati de 1991, ou a Nuova Riveduta de 1994, quanto a Católico Romana, San Paolo Edizione de 1995, traduzem por Beati (Abençoados).
Em Espanhol, tanto a tradução Reina-Valera do Século 16 quanto a Biblia de las Américas de 1986 usam Bienaventurarados (Abençoados).
Das dezesseis versões que possuo em português (incluindo Católicas Romanas), duas traduzem por felizes, uma por abençoados e outra por venturosos.
Cá entre nós, eu prefiro traduzir por abençoados (apesar de nesse texto continuar usando “Bem-aventurados”). São abençoados por já possuírem aquelas qualidades destacadas pelo Senhor pelas suas respectivas razões.
As Bem-aventuranças estão registradas em um estilo literário chamado paralelismo - e certamente foram ditas assim, pois esse era um recurso mnemônico de que se serviam os mestres judeus daquela época - onde a segunda parte de cada frase é separada da primeira parte e à ela de alguma maneira se refere.
Antes, convém dizer, que há quem veja oito e até sete Bem-aventuranças. Porém, eu prefiro a leitura convencional de nove. Faz mais sentido para mim:
Bem-aventurados os humildes de espírito,
porque deles é o reino dos céus.
Bem-aventurados os que choram,
porque serão consolados.
Bem-aventurados os mansos,
porque herdarão a terra.
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça,
porque serão fartos.
Bem-aventurados os misericordiosos,
porque alcançarão misericórdia.
Bem-aventurados os limpos de coração,
porque verão a Deus.
Bem-aventurados os pacificadores,
porque serão chamados filhos de Deus.
Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça,
porque deles é o reino dos céus.
Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai,
porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes” (Mt 5.3-12).
De cara, uma primeira observação já pode ser feita: aos humildes de espírito é garantido o reino do céus. Aos que choram, consolo. Aos mansos, a terra. Aos famintos e sedentos, fartura. Percebeu? Parece que a segunda parte complementa por antítese a primeira. Valerá para todas? Esse é um modo de estuda-las.
Outra análise que pode ser feita é o tempo do verbo que exprime a recompensa.
O da primeira está no tempo presente (porque deles é o reino dos céus). O que indica certa concomitância de eventos.
Da segunda até a sexta o verbo está no futuro. Para mim, indica que a promessa realiza-se após a bem-aventurança. Como exemplo: O discípulo só será capaz de ver Deus (seja na eternidade ou nos eventos diários) se estiver limpo de coração.
Na sétima o verbo volta ao tempo presente (a promessa é igual à da primeira).
Porém, apesar de o verbo da última estar no tempo presente, definitivamente a promessa é feita a “um galardão nos céus”.
Para bem entender o Sermão do Monte, há que se começar entendo as Bem-Aventuranças. Elas são a chave.
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