“Tu certamente os pões
em lugares escorregadios”
Salmo 73.18
Ao longo da Bíblia uma figura se repete ao se descrever a situação do salvo e do perdido: o local onde eles pisam.
O perdido está em um poço de lama, na realidade um tremedal, um lamaceiro onde o que está debaixo de seus pés treme e foge à pressão dos mesmos: “livra-me do tremedal, para que não me afunde; seja eu salvo dos que me odeiam e das profundezas das águas” (Sl 69.14).
Outros textos transmitem a ideia de que o próprio pecador, mesmo tentando melhorar, agrava seu estado. Por exemplo: “Abre, e aprofunda uma cova, e cai nesse mesmo poço que faz” (Sl 7.15).
Mas as vezes sua pisada é em um buraco. Ao descrever sua situação de abandono por Deus - figura do abandono do Messias - o salmista também mostra a situação futura do pecador: “Puseste-me na mais profunda cova, nos lugares tenebrosos, nos abismos” (Sl 88.6).
Fica pior quando descreve a situação daquele que já teve uma oportunidade, como Judas, de conhecer, de se envolver, de participar do Sagrado Ministério e depois o abandonou de caso pensado. Tal pessoa apesar de ter firmeza para os pés, não pisa. Espezinha: “De quanto mais severo castigo julgais vós será considerado digno aquele que calcou aos pés o Filho de Deus, e profanou o sangue da aliança com o qual foi santificado, e ultrajou o Espírito da graça?” (Hb 10.29).
Em franco contraste, o salvo é descrito como quem está sobre uma rocha e com possibilidade de andar a passos firmes: “Tirou-me de um poço de perdição, de um tremedal de lama; colocou-me os pés sobre uma rocha e me firmou os passos” (Sl 40.2).
Não apenas uma rocha, mas um verdadeiro local de abrigo, onde pode se refugiar, habitar, viver e progredir em seus caminhos: “O SENHOR é a minha rocha, a minha cidadela, o meu libertador; o meu Deus, o meu rochedo em que me refugio; o meu escudo, a força da minha salvação, o meu baluarte” (Sl 18.2) e “Porque tu és a minha rocha e a minha fortaleza; por causa do teu nome, tu me conduzirás e me guiarás” (Sl 31.3).
É interessante ver outro aspecto paralelo: uma rocha espaçosa que permite movimentos desembaraçados. E esse conceito é importante, pois geralmente a vida cristã é descrita como restritiva, muitas vezes é comparada a uma clausura e até vivida em uma. Ao passo que a vida do ímpio é mostrada como uma vida de total liberdade. Mas a Bíblia ensina exatamente o inverso: “ ...e não me entregaste nas mãos do inimigo; firmaste os meus pés em lugar espaçoso” (Sl 31.8).
A liberdade de que o perdido aparentemente goza é na realidade um laço: “Os meus olhos se elevam continuamente ao SENHOR, pois ele me tirará os pés do laço” (Sl 25.25).
Transcrevi todos estes textos para mostrar como a Bíblia vê o homem perdido em seus pecados e homem que já foi salvo, apesar de aos nossos olhos o primeiro às vezes se encontrar em uma situação muito melhor do que o segundo.
De fato, as vezes a opulência do ímpio e a dureza da vida do justo parece contradizer as promessas de Deus que haveria de abençoar seus filhos. Asafe percebe isso de forma magistral e descreve, no Salmo 73, os perdido com as seguintes qualificações:
Materialmente prósperos e sem problemas; possuem força e saúde; não sofrem atribulações do dia a dia, ostentam a soberba como quem usa um colar e a violência como roupa; seus olhos estão sempre voltados para o lucro e o coração para as vantagens que podem tirar dele. Zombam, falam malícias e com arrogância ameaçam ao próximo e até os céus e ficam sempre com a última palavra de modo que o povo os tem por modelo e se enche deles como quem bebe água. Chegam a por em dúvida a sabedoria de Deus!
Entretanto veja como Asafe, no mesmo Salmo, descreve o fim deles: Deus os coloca em “lugares escorregadios”. Basta isso.
De modo totalmente diferente diz do salvo: “tu me seguras com a mão direita”. Reflita bem no contraste: Lugares escorregadios e seguro pela mão direita de Deus!
Esse foi o quadro que o Senhor Jesus usou como pano de fundo na Parábola do Rico e do Lázaro. Aquele que regalava-se esplendidamente nesta vida veio a suplicar por uma gota de água e o que tinha suas feridas lambidas pelos cães foi recebido no seio de Abraão.
Escapismo protestante! Dirão alguns. Especialmente os que de tão imersos no quadro de valores marxistas já não conseguem vê-los mais, assim como o peixe não vê a água em que nada. Entretanto eu prefiro chamar de cosmovisão cristã.
Um comentário:
Fôlton,
Excelente!!!
Como sempre, muito bom lê-lo.
Vou colocar no próximo boletim esse texto tão precioso.
grande abraço.
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