segunda-feira, 13 de julho de 2009

Pai e filhos

Ainda criança, lendo a parábola do filho pródigo, minha atenção se voltava sempre para o pai: Por que ele não tentou dissuadir seu filho? Por que sequer lamenta sua grosseria em pedir sua parte da herança enquanto ele estava vivo?

Nunca foi assim com meus pais, e creio que não é assim com nenhum pai. Todos tentam dissuadir seus filhos de eventuais erros. Mas, por que o pai esboçado pelo Senhor Jesus nesta parábola - que simbolicamente representa o Pai Celeste - é diferente? Será que ele não liga pro que acontece a seus filhos?

* - *

A ênfase que damos ao filho mais moço - ao ponto de emprestarmos seu nome à parábola - desdiz o propósito principal do Senhor Jesus que era ensinar aos filhos mais velhos a receberem com alegria seus irmãos que retornam ao lar.

Entretanto, estude-a com calma e tenho certeza de que você concordará comigo de que o personagem em torno do qual tudo acontece é o Pai.

Agora, observe bem: Jesus esboça dois tipos de filhos e só um pai. Os dois filhos ilustram dois tipos de pecadores e o pai é único, pois é figura de Deus que é um só.

Há pecadores ousados e irreverentes, como o filho mais moço, a ponto de exigir de Deus aquilo que não lhes é de direito. Há pecadores que continuam morando na casa do pai, como o filho mais velho, e, sem coragem de enfrentá-lo, colecionam ressentimentos daquilo que chamam de direitos usurpados.

Há pecadores arrependidos que, caindo em si, voltam para a casa do pai. Há pecadores empedernidos e orgulhosos que não admitem que a casa do pai seja maculada pela presença do outro, mesmo que o outro seja seu irmão.

Há pecadores que reconhecem o erro e seu próprio estado, ainda que para isso tenham sido obrigados a comer comida de porcos. Há pecadores que, sempre desfrutaram da mesa do pai, mas não reconhecem que o ressentimento velado que possuem contra ele, é mais ofensivo do que considerá-lo morto. Entretanto, jamais admitem estar errados.

Há muitos tipos de pecadores, mas um só tipo de Pai.

Por sua própria natureza o Pai está disposto a perdoar o filho que volta. Por sua própria natureza o Pai está disposto a restaurar a filiação abalada pela maior ofensa daquele que o reconhece como pai. Por sua natureza o Pai é que é pródigo. Pródigo em amor. Pródigo em perdão. Pródigo em aceitação.

A única exigência inerente a natureza do Pai é continuar pai. Por isso ele não dissuade o filho que deseja virar-lhe as costas. O filho precisa ter consciência de que, até para virar as costas a seu pai, precisa do que ele dá: força, liberdade, ousadia, e meio de subsistir longe de sua casa.

Há muitos tipos de pecadores, mas há um só Pai. Imaginar que qualquer coisa escolhida como pai transforma-se no verdadeiro Pai é tão insensato quanto imaginar que a comida dos porcos é a mesma coisa que o pão da casa do Pai.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Esboço da vida de Calvino

Há quinhentos anos, precisamente em 10 de julho de 1509, João Calvino nascia na cidadezinha francesa de Noyon.

Seu pai esforçou-se para bem formá-lo esperando vê-lo padre e aos 14 anos foi admitido na Universidade. No Collège de la Marche em Paris fez o curso inicial de latim e no Collège de Montaigu as demais matérias. Formou-se aos 17 anos. Entretanto seu pai determinou-lhe buscar a carreira jurídica e ele foi estudar direito em Orleans, onde doutorou-se aos 21 anos. Nessa época foi alcançado pela graça de Deus.

No prefácio de seu Comentário dos Salmos, ele mesmo resume esse período assim: "Quando eu era ainda menino, meu pai destinou-me ao estudo de Teologia. Mas posteriormente, considerou que a profissão jurídica geralmente promovia seus seguidores à riqueza, ... visto que eu era tão obstinadamente devotado às superstições do papado, Deus,para desembaraçar-me facilmente de tão profundo abismo de lama, por meio de súbita conversão, subjugou e pôs na minha mente ... a disposição para aprender".

Logo começou a organizar seus pensamentos no que seria sua obra maior: Institutas da Religião Cristã, a partir do capítulo que conhecemos hoje: Da vida futura.

Aos 26 anos, passando por Genebra, recebeu a visita de Farel, líder do movimento de Reforma da Igreja de lá, que, após amaldiçoar sua idéia de procurar um lugar tranqüilo em que pudesse dedicar-se aos estudos, o convenceu a ficar em Genebra. Ele mesmo se lembra do acontecido: "Fiquei tão aterrorizado com essa imprecação que desisti da viagem que havia empreendido. Senti como se Deus tivesse lançado sobre mim sua mão poderosa para levar-me preso".

Em Genebra, logo sofreu oposição das autoridades da cidade, que concordavam com a doutrina reformada, mas não a praticavam. Tempos depois refere-se a essa época, em uma carta, dizendo que não passava um dia sem ansiar pela morte, tamanha era a aflição que lhe provocavam.

Negou-se a servir a Santa Ceia a esses chamados libertinos e, com uma manobra política o expulsaram de lá como persona non grata.

Foi viver em Estrasburgo, pastoreando os protestantes refugiados das muitas perseguições de então, onde, apesar de ter uma congregação numerosa, deu continuidade às Institutas e casou-se com Idelete com quem teve um filho prematuro que morreu ainda bebê.

Quase quatro anos depois, a situação em Genebra, tornara-se insustentável e seus inimigos enviaram uma missão pedindo que voltasse. Estavam autorizados a pagar o que ele pedisse, mas ele exigiu apenas que as autoridades submetessem suas vidas e a vida do que estava sob o poder deles à orientação da Palavra de Deus. Foi recebido com boas vindas pelas autoridades de Genebra na cidade vizinha de Versoix.

Entretanto, o ministério de 25 anos em Genebra, apesar de produtivo foi cheio de percalços: sofreu a morte de sua esposa; foi obrigado a restringir a celebração da Santa Ceia a 4 vezes por ano; tomou parte no processo que Levou Servetus à fogueira; e, traído por Villegaignon, viu a expedição ao Brasil ser desfeita e maioria de seus integrantes mortos.

Era de compleição doentia e seus biógrafos falam de mais de 30 enfermidades gástricas e reumáticas. Muitas simultâneas. Como a Igreja era de pedra e não possuía aquecimento, nas épocas de frio ele vestia com diversas roupas e cobria-se com sua beca de formatura. Não demorou muito para que seus muitos alunos, alguns já doutorados pela Sorbonne, passassem a homenageá-lo usando o mesmo tipo de manto.

Seus sermões, quase diários, anotados por seus ouvintes mais cultos, deram origem a Bíblia de Genebra e mais de 800 deles podem ser encontrados na íntegra nos 59 volumes do Corpus Reformatorum.

As anotações do secretário da Igreja e os livros que ele mesmo escreveu geraram os 45 volumes comentando quase todos os livros da Bíblia com exceção de Cantares e Apocalipse, que ele dizia serem profundos demais.

Morreu em 27 de maio de 1564. Seu túmulo pode ser visto no cemitério de Plain Palais ao lado da Cidade Velha em Genebra.