sábado, 31 de julho de 2010

Eleições

Defronte a uma grande extensão de mata atlântica, rodeada por morros, o sol só atingia a casinha no meio da manhã. Levantar cedo e acender o fogão à lenha era comprar briga com o frio, compensada imediatamente pela visão do alto da mata brilhando ao sol, e pela algazarra do bando de passarinhos no terreiro e nas árvores próximas.

Nem telefone nem internet. Só televisão. Porém, as melhores cenas não estavam nela: voavam de árvore em árvore, brilhavam com o reflexo do sol ou contra o fundo escuro da noite. Não sei descrever a beleza daquele céu estrelado ou a placidez da lua cheia.

Antes do sono o frio e o vento cortante conseguiam nos empurrar da varanda para dentro de casa e nos lembrar de que a vida continuava.

Numa dessas noites, vendo o jornal, me dei conta de três acontecimentos notáveis: Três eleições: a do Técnico da Seleção, a do Presidente da República e a dos Oficiais de nossa Igreja.

Pouco sei sobre a escolha do primeiro, mas tenho certeza de que é feita por alguns – talvez por um só – mediante critérios mais técnicos do que políticos. Afeta tanta gente que deveria ser eleição direta nacional. Afinal os brasileiros são mestres em futebol para ver rapidamente quais seriam os melhores candidatos. Com o futebol estão muito mais envolvidos e dele extraem muitas alegrias.

Sobre a eleição do Presidente da República, apesar de só ter votado em um aos 34 anos, sei um pouco mais. Muitos votarão em quem começaram a ouvir falar há pouco tempo, ou em alguém com menos experiência do que um técnico de um time de várzea. Muitos votarão contrariados ou até mesmo obrigados e o critério de outros não será a competência – como fariam se fossem escolher um técnico para a seleção – mas a melhor apresentação.

Na Igreja a escolha são bem diferentes. A competência é desejável, mas não é imprescindível. Os dotes políticos em vez de ajudar, prejudicam. Deve ser eleito aquele que melhor satisfaça as exigências da Palavra de Deus, e quase todas, com exceção de uma ou duas, dizem respeito a vida familiar. Ou seja, os oficiais da Igreja de Deus devem ser antes de tudo bons pais de família, bons maridos, bons filhos, bons irmãos e ter boa instrução na Sã Doutrina.

Deus permitiu que seu povo escolhesse seus pastores. Mas devem fazê-lo conforme os critérios dele. Fazendo assim cada um saberá o que é mais importante para Deus, atestará o que é a verdadeira fé e testificará que Deus é o senhor daquela igreja.

Já estou com saudades dos passarinhos, das manhãs frias e das noites estreladas, mas tenho certeza de que a oportunidade de escolher um diácono para a Igreja do Senhor é mais importante do que aquele deleite, como também é mais importante do que escolher os dois maiores mandatários de nosso país.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

O Tempo e o modo

Não há inundação sem a primeira gota de chuva. Não há tempestade sem a primeira brisa. Não há discórdia sem a primeira palavra mal dita ou mal entendida. Grandes discussões podem acabar em abraços e pequenos desentendimentos podem acabar em grandes tragédias.

Nenhum de nós, sabendo a que ponto chegaria, jamais teria contado uma determinada piada, falado uma determinada palavra ou feito o gesto que provocou toda aquela dor.

O sábio Salomão chama isso de o “grande mal que pesa sobre o homem” (Ec 8.6): desconhecer o resultado de seus atos.

Ele ensina que, como nenhum de nós conhece o que há de suceder, devemos - no único tempo sobre o qual temos algum controle, que é o momento presente - guardar a Lei de Deus. Ela nos foi dada para nos ensinar a decisão certa, a atitude correta, a palavra adequada e o tempo oportuno. Ou seja: A Lei de Deus nos ensina como viver cada instante de modo que o resultado de cada um desses instantes vividos esteja sempre de conformidade com a vontade de Deus e as conseqüências dos mesmos sejam sempre aquelas que agradem a Deus.

Nesse mesmo texto Salomão nos diz que para todas as coisas há um tempo e um modo, e que o sábio os conhece.

De fato: Às vezes vivemos o tempo certo de se fazer algo, mas não podemos fazê-lo do modo certo. Às vezes podemos fazer do modo certo, mas não estamos no tempo adequado.

Tempo e modo. Estes dois fatores precisam estar em harmonia para que tudo o que fizermos seja bem sucedido. E quem os harmoniza é a Lei de Deus.

Nosso Senhor morreu no tempo certo: Na “plenitude do tempo” como nos disse o apóstolo Paulo (Gl 4.4). Nosso Senhor morreu do modo certo: condenado injustamente, debaixo da pena que era nossa, de modo que Deus, nosso bendito Pai, lhe imputasse todos os nossos pecados.

Estou acostumado a ver quem age do modo correto estragar uma boa iniciativa por desconsiderar o tempo certo de fazer o que queria. Igualmente, já vi quem aguardou o tempo certo, mas todo atabalhoado, desprezou o modo certo e obteve os piores resultados daquilo que fez com tão boa intenção.

Minha alegria é ver alguém sábio o suficiente, que, enquanto espera o tempo certo, se prepara para executar aquilo que seu coração lhe mostra e Deus lhe permite.

Com paciência ele perscruta. Sonda. Ausculta. E realiza o que foi posto sob sua responsabilidade. E assim glorifica a Deus como bom mordomo do tempo e bom executor de seu querer.

Tudo varia. O tempo e o modo também. Mas a Palavra de Deus permanece verdadeira.

sábado, 10 de julho de 2010

O Nome

De modo geral, nos identificamos pelo nome completo, que é composto do nome próprio, sobrenome materno e paterno. A ordem, a obrigatoriedade ou o número de sobrenomes varia. Por exemplo: Os espanhóis usam primeiro o sobrenome paterno e o sobrenome materno por último. Os americanos e ingleses se contentam com o sobrenome paterno. Os húngaros, japoneses e chineses usam o sobrenome antes do nome.

Nos tempos bíblicos a identificação compunha-se geralmente de um nome próprio seguido do nome do pai, e de algum ancestral notável. Nosso Senhor é chamado por Mateus de “Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão” (Mt 1.1).

Algumas vezes o nome próprio é seguido por um atributo pessoal: Jesus Cristo (Cristo significa o escolhido), Saulo de Tarso (Nascido em Tarso), José Barnabé (hábil em incentivar), Simão Curtidor (trabalhava com couros).

Nos primeiros anos da Igreja, com tantos, de tantas nacionalidades e culturas aderindo ao cristianismo, encontramos os mais diversos nomes. Mas é nessa época, em Antioquia, que os seguidores de Jesus passaram a ser chamados Cristãos. Talvez um modo pejorativo de designá-los, como, décadas atrás, nos chamavam de “os bíblias”.

Esse tipo de designação é mais precioso do que um sobrenome de família, de local ou de profissão. E embora designe o grupo mais do que o indivíduo, revela o que é mais notável.

Por protestarem contra várias decisões da Igreja de Roma as Igrejas que nasceram da Reforma Religiosa do Século 16, receberam o nome de Protestantes. Entretanto, ao chegarem ao Brasil preferiram se apresentar como Evangélicas. Modernamente algumas que tem muito pouco, ou nada, dessa raiz, adotaram essa mesma designação: em inglês! Gospel.

Preferimos o nome Presbiteriano, por indicar nossa forma de governo, entretanto sempre mantivemos a identificação evangélica.

Hoje, presbiterianos como eu têm uma dificuldade muito grande em se identificar. Somos Protestantes? Contra o que protestamos, se não temos qualquer vínculo com a Igreja de Roma? Somos Evangélicos? Está cada vez mais difícil agüentar as besteira que esse nome evoca. ‘Góspeis’? Deus nos livre! Além das besteiras, evoca o pernicioso comércio da fé.

Nossa sina é pertencer ao crucificado. Nele fomos predestinados e crucificados para o mundo. Portanto não há como fugir: somos cristãos. Para o bem ou para o mal somos cristãos.

Não concordamos com muitas coisas que outros cristãos fazem, mas somos cristãos. E como Pedro nos ensinou devemos honrar esse nome: "Se, pelo nome de Cristo, sois injuriados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa o Espírito da glória e de Deus. Não sofra, porém, nenhum de vós como assassino, ou ladrão, ou malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outrem mas se sofrer como cristão, não se envergonhe disso; antes, glorifique a Deus com esse nome" (1Pe 4.14-16).

sábado, 3 de julho de 2010

A seleção brasileira, nós e Adão

Quando a bola aproximou-se da área do gol do Brasil o comentarista interrompeu de chofre a notícia que seu colega dava sobre um acontecimento nos vestiários. A torcida no campo levantou-se de uma só vez e a torcida em casa contorceu-se. De tão absorto, houve quem derramasse a bebida que já estava nos lábios.

- Sai, sai, sai...

- Tira ela daí! Tira, tira, tira!

Pelo jeito não havia nenhum ateu na frente da TV, pois o fervor com que o nome de Deus era invocado diante do perigo de um gol superava em muito o fervor das reuniões de oração de algumas igrejas modernas especialistas na arte de expulsar demônios ou fazer curas.

Quando a bola aproximou-se da área do gol do adversário, as reações eram semelhantes. Porém, em sentido diferente. E o gol era seguido por gritos e pulos de uma alegria desenfreada em que o barulho alongado das buzinas era entrecortado pelas explosões dos mais diversos tipos de bombas e fogos de artifício. Barulho desenfreado! A última coisa em que se pensava era Deus.

Já vi o Brasil vencer e perder. Lembro-me da copa de setenta (pra mim a mais bonita). Lembro-me da decepção geral na copa de setenta e oito, quando o Peru perdeu de seis a zero para a Argentina eliminando a possibilidade de o Brasil disputar o primeiro lugar.

Percebeu?

Tanto na possibilidade ou não de um gol, quanto na lembrança de copas passadas ou na descrição da presente, é perfeitamente aceitável nos referirmos à seleção brasileira apenas como Brasil. Afinal, se ganhar foi o Brasil que ganhou. Se perder, foi o Brasil que perdeu. O gol seria do Brasil ou contra o Brasil. O Brasil está lá! A representação do Brasil é, para todos os efeitos, o Brasil.

A alegria da copa de setenta, e das demais copas vencidas, foi a alegria do Brasil. A tristeza de setenta e oito e das demais copas perdidas (dizem que não houve igual a de cincoenta, quando o Uruguai ganhou do Brasil em pleno Maracanã), foi a tristeza do Brasil.

Será que isso não dá para se ter um vislumbre de como estávamos em Adão quando ele pecou? Apenas um vislumbre, pois o que aconteceu foi um pouco mais complicado.

Ao longo de sua história a Igreja tentou explicar o que aconteceu e houve quem dissesse que “nós estávamos seminalmente em Adão”, como houve quem dissesse que Adão apenas nos representava (como a seleção brasileira representa o Brasil), e há quem diga que Deus imputou o erro de Adão a toda humanidade da mesma forma que imputou os méritos de Cristo aos seus.

Embora a analogia não seja total, de uma coisa, porém tenhamos certeza: Quando a seleção perde dizemos, com propriedade, que todos nós também perdemos. Quando a seleção ganha, podemos dizer, com a mesma propriedade, que todos nós ganhamos. Não costumamos nos gloriar de que somos penta-campeões?

Pois bem: mais certos do que isso é termos morrido em Adão e ressuscitados em Cristo.

 

Nota: Este texto foi escrito na quinta feira passada. Antes da derrota da seleção.