sábado, 25 de agosto de 2012

Não era pra ser assim

Dia desses numa fila de banco, desprevenido de um bom livro, me vi aborrecido entre uma discussão sem fim de três torcedores que não se cansavam de elogiar as virtudes de seus respectivos times e as queixas de duas senhoras contra suas balanças, até que ouvi algo inusitado: feijoada diet! Saí de lá rindo de tamanho disparate, para depois descobrir que existe. Parece uma contradição de termos, mas existe!

Que mundo o nosso! Tomamos café sem cafeína e leite sem lactose. Comemos pão sem glúten, geleias sem açúcar, carnes feitas de soja e agora um prato gordo sem gordura.

Qualquer um que já tenha lido as Sagradas Escrituras com um pouquinho de atenção deve se lembrar de textos como o seguinte: “O SENHOR dos Exércitos dará neste monte a todos os povos um banquete de coisas gordurosas, uma festa com vinhos velhos, pratos gordurosos com tutanos e vinhos velhos bem clarificados” (Is 25.6).

Todos os povos comerão as carnes gordas e beberão os vinhos especiais. Você está preparado? Seu colesterol permite?

Quando Deus criou nossos pais deu sua primeira ordem: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra” (Gn 1.28). Não é bem isso que vemos hoje.

As políticas públicas já declararam guerra aberta as altas taxas de fecundidade a tal ponto que quando ouvimos alguém dizer que quer uma família numerosa, estranhamos. Já é proibitivo até andar em um carro convencional: como instalar quatro cadeirinhas no banco de trás? E como andar com crianças sem cadeirinhas?

Agrava-se, ou pelo menos aumenta a proporção do problema, quando examinamos o restante do versículo: Enchei a terra e dominai sobre tudo o que nela habita.

Há um consenso geral, cada vez mais disseminado de que o planeta terra já está cheio. Slogans do tipo “Lotação Esgotada” longe de ser algo sensacionalista e local revela a mentalidade que percorre o mundo em documentos oficiais da ONU que falam do excesso populacional e mostram a razão da busca a planetas colonizáveis.

Pior ainda é o verbo dominar. O contexto em que Deus confere ao homem domínio sobre suas obras, não admite a exploração deletéria que assistimos. O termo dominar está associado à ideia de cuidar: “Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar” (Gn 2.15).

O que aconteceu então? Deus nos criou para um propósito e vivemos outro totalmente diferente. Sequer podemos chamar de jardim o meio em que vivemos e muito menos podemos exercer qualquer domínio que não acabe sendo destrutivo. Nós, cristãos chamamos isso de Queda.

Nossos pais podiam ter tantos filhos quantos quisessem, mas antes que tivessem o primeiro, o inimigo de nossas almas os levou a duvidar de Deus e desobedecer a uma ordem simples que ele lhes havia dado. Essa desconfiança e desobediência os afastou de Deus e as consequência foram as piores possíveis: Tudo sobre o que eles deveriam ter domínio estava agora em revolta contra eles como eles estavam em revolta contra Deus.

- Sua biologia e seus relacionamentos pessoais foram danificados: “Multiplicarei sobremodo os sofrimentos da tua gravidez; em meio de dores darás à luz filhos; o teu desejo será para o teu marido, e ele te governará” (Gn 3.16).

- O meio ambiente e o relacionamento do homem com ele também foi danificado: “...maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo. No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás” (Gn 3.17-19).

Não é preciso muita imaginação para perceber que isso foi o começo de tudo o que vemos hoje. De perfeitamente harmonizados com a criação de Deus estamos em conflito. Perdemos até a gerência de nossos próprios corpos e já não podemos desfrutar totalmente das bênçãos daquilo que Deus criou. Chegamos ao ponto de celebrar a Ceia de seu Filho com suco de uvas para não despertar o alcoolismo latente em muitos irmãos que lutam contra esse vício desgraçado.

Não era pra ser assim. Mas é. O pecado interferiu em tudo e ainda interfere. Ainda prejudica. Ainda escraviza. E com o apóstolo dizemos: “Porque, no que diz respeito ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus; mas vejo nos membros do meu corpo outra lei guerreando contra a lei da minha mente e me fazendo escravo da lei do pecado, que está nos membros do meu corpo. Desgraçado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” (Rm 7.22-24)

Qual é a solução então? Hoje estamos livres do pecado pelo sacrifício de Cristo, mas não de suas consequências. Delas só ficaremos totalmente livre no último dia. Por essa razão vivemos hoje em total confiança diante de Deus, apesar de tristes pelo estado presente daquilo que enfrentamos. Mas, isso só nos faz levantar os nossos olhos em esperança e dizer com alegria: Volta logo Senhor Jesus!  

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Adorar a Jesus

Você já reparou que Jesus nunca recusou ser adorado? Examine as Escrituras Sagradas: sempre que alguém tenta adorar um anjo ele recusa a adoração e manda que a pessoa adore a Deus. Por exemplo: “Então, me falou o anjo: Escreve: Bem-aventurados aqueles que são chamados à ceia das bodas do Cordeiro. E acrescentou: São estas as verdadeiras palavras de Deus. Prostrei-me ante os seus pés para adorá-lo. Ele, porém, me disse: Vê, não faças isso; sou conservo teu e dos teus irmãos que mantêm o testemunho de Jesus; adora a Deus. Pois o testemunho de Jesus é o espírito da profecia” (Ap 19.9-10).

Ainda bebê, com menos de dois anos, o Senhor Jesus foi adorado por uns magos que vieram do oriente: “Entrando na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se, o adoraram; e, abrindo os seus tesouros, entregaram-lhe suas ofertas: ouro, incenso e mirra” (Mt 2.11).

Explicitamente os evangelhos narram que Jairo, o chefe da sinagoga de Cafarnaum, e pai cuja filha estava à morte foi suplicar por ela a Jesus e o adorou (Mc 9.18). Também a mulher canaanita, cuja filha estava endemoninhada, ao suplicar pela criança o adorou (Mt 15.25). Marcos diz que em Gadara um endemoninhado, que se flagelava pelos sepulcros sem descanso, ao vir Jesus correu ao seu encontro e o adorou suplicando que não o atormentasse (Mc 5.1-14).

Você deve ter notado que nestes últimos casos todos o adoraram antes de pedir alguma coisa. Diferentemente do cego que depois de curado, quando o reconheceu, o adorou agradecido (Jo 9.38).

Porém, sem usar explicitamente a palavra adorar, podemos ver claramente gestos de adoração em várias ocasiões.

Na casa do fariseu Simão, quando a pecadora cobriu os pés de Jesus com lágrimas, beijos e unguento precioso (Lc 7.36-50) fornecendo-lhe muito mais do que lhe fora negado pelo hospedeiro. Na casa de Maria, Marta e Lázaro quando a própria Maria derramou sobre a cabeça de Jesus um perfume tão caro que valia um ano de salário (Jo 12.3-5). E um dos dez leprosos curados prostrou-se com o rosto em terra aos pés de Jesus (Lc 17.15-16).

Não deixa de ser curioso ver que tantas pessoas se aproximaram de Jesus com pedidos e poucas com gratidão. O caso dos dez leprosos é um exemplo. Mais curioso ainda é que os que adoraram o Senhor Jesus antes de lhe pedir algo são mais numerosos do que aqueles que o adoraram em gratidão pelo que receberam.

Além dos textos já citados há outros três que não podem deixar de ser lembrados:

Quando Jesus ascendeu aos céus seus discípulos o adoraram (Lc 24.51-52). Certamente estavam convictos de sua divindade e já não tinham qualquer sobre o que acontecera ou sobre o que estava acontecendo.

Escrevendo aos Filipenses, que estavam fascinados por uma ideia estranha sobre Deus, o apóstolo Paulo, trata de mostrar-lhes o que Deus fez por nós através de Cristo e como nele tudo se inicia e se concretiza: “Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2.9.11).

E quando se refere a terra e céus é imperativo destacar: “E, novamente, ao introduzir o Primogênito no mundo, diz: E todos os anjos de Deus o adorem” (Hb 1.6).

Ora, certamente nós, cristãos, não temos dúvidas de que devemos adorar a nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, que, no dizer de um de nossos Credos, é “o unigênito Filho de Deus, gerado pelo Pai antes de todos os séculos, Deus de Deus, Luz de Luz, verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, gerado, não feito, de uma só substância com o Pai; pelo qual todas as coisas foram feitas; o qual por nós homens e por nossa salvação, desceu dos céus, e foi feito carne pelo Espírito Santo da Virgem Maria, e foi feito homem; e foi crucificado por nós sob o poder de Pôncio Pilatos. Ele padeceu e foi sepultado; e no terceiro dia ressuscitou conforme as Escrituras; e subiu ao céu e assentou-se à direita do Pai, e de novo há de vir com glória para julgar os vivos e os mortos, e seu reino não terá fim”.

Há algo de misterioso em se adorar um bebê. Há algo de misterioso em se adorar um homem. Porém, mais misterioso é Deus se fazer um de nós. Assumir nossa natureza por toda eternidade. E ele o fez. Glórias pois a ele.

domingo, 5 de agosto de 2012

Pensando sobre a ficção

Nos últimos vinte anos tenho pensado muito a respeito desse assunto, pois não vejo a ficção como algo neutro, que nem faça bem nem faça mal, e quanto mais penso, mais me inquieto.

Qualquer obra de ficção é uma criação de quem a fez. Seu autor se torna um criador de um universo, com tempo, espaço e vidas próprias. Paradoxalmente é um universo que não existe, que, entretanto, pode influenciar as vidas reais, muito mais do que muitos estudos ou exortações sobre a realidade.

Tome qualquer novela, dessas que passam na televisão de sua casa. Primeiro: O enredo dela sempre se baseará sobre algum tipo de engano. Ou um engano honesto ou cometido por um vilão. Geralmente os enganos cometidos por vilões atraem mais, especialmente se forem sobre a paternidade de alguém ou sobre algum assassinato. Elas nunca variam muito. O que mudam são apenas os locais, os nomes dos personagens, os atores, os instrumentos do engano, as armas do vilão, etc. Sua história sempre é a história da superação de um, ou de muitos enganos. Obviamente há outros gêneros, mas uma pesquisa (pois não sou um aficionado) revelou-me que as novelas que começaram com outro gênero, precisaram se adaptar a esse para garantir audiência.

Segundo: Preste atenção no legado que ela deixa. A moda que ela lança, as músicas que se tornam (ou voltam a ser) sucessos e até os nomes dos personagens que migram para os pobres bebês que nascem durante o período em que ela está no ar.

Terceiro: Os padrões de comportamento que passam a ser, no mínimo, discutidos. Esses padrões, que muitas vezes pensamos terem sido escolhidos por estarem na moda, às vezes são forçados por um escritor, ou um pequeno grupo deles, que quer implanta-los. Depois de repeti-los em muitas ocasiões eles passam a ser tidos como aceitáveis.

A ficção nos lança em um mundo inexistente, cujas as fronteiras com o mundo real, em alguns lugares, são difíceis de perceber. Se na ficção existe um herói que voa e isso claramente não existe - embora alguns com mentes débeis ou fragilizadas por drogas já tentaram imitar e morreram - uma obra pode mostrar alguém de vida totalmente normal, que almoça, janta e dorme como todas as pessoas, mas aprendeu a possibilidade de fazer algo novo, com um personagem que não existe senão na cabeça de seu criador humano, que é pecador e totalmente depravado pelo pecado.

Agrava-se o fato de que os autores ficcionais dificilmente são limitados por algum tipo de “cerceamento moral” já que a competitividade os obriga a ser cada vez mais criativos em mostrar novos modos de matar alguém, ou de praticar atos libidinosos ou qualquer outra coisa que choque, ou pelo menos atraia uma plateia e lhes garanta o título efêmero de “o mais criativo”.

Eu pertenço a uma geração que viu o primeiro beijo heterossexual da TV, depois da descoberta gradual do corpo feminino finalmente o primeiro nu frontal e alguns anos atrás o primeiro beijo homossexual. No cinema, embora a velocidade tenha sido mais rápida, as coisas também foram progressivas. Numa entrevista recente, um ator, cujo nome prefiro não dizer, confessava que todos tinham como dever testar os limites da censura da época, como têm o dever de testar o que a sociedade aceita hoje.

Repare o quanto isso valida a expressão “A vida imita a arte”.

Um texto mínimo como este não pode pretender ser um ensaio sobre algo tão extenso. Deixando de lado as possibilidades filosóficas e até teológicas (como C. S. Lewis conseguiu fazer tão bem) e ficando em nossa ficção cotidiana dá pra perceber alguns valores que se repetem, como se repetem os instrumentos do enredo.

Sempre os personagens declaram ser, acima de tudo, fiéis a si mesmos. E essa fidelidade justifica tudo. Para ser fiel a si mesma uma mãe abandona seus filhos e segue uma amante mundo afora. Um avô deixa sua família, trabalho e amigos para viver uma aventura verdadeira com uma jovenzinha que lhe traz a juventude de volta. Muitas vezes a fidelidade a si mesmo é mostrada como uma virtude: honestidade (mesmo que para isso tenha de ser desonesto para com os outros). É como a novela que mostrou um rapaz que não encontrava nenhum trabalho de que gostasse até que experimentou ser assassino (como se um jovem já tivesse experimentado todos os demais tipos de trabalho).

Um segundo valor se impõe para validar o primeiro: o encontro com a felicidade (sem que haja uma verdadeira definição do que seja felicidade, mas admitindo que todos a reconheçam tão logo a encontrem). O encontro com ela justifica tudo. Tudo mesmo.

Você há de convir comigo que nunca teria feito determinadas coisas se não as visse primeiro nos meios de comunicação de massa. Isso é altamente provado pela propaganda, que passa a vender um produto do qual nunca se ouviu falar antes. Pois bem: São exatamente esses meios os mais comprometidos com a ficção a tal ponto de tornarem a própria verdade numa espécie de ficção.

Obviamente a ficção não deixa de ser um instrumento útil nas mãos de um mestre. Veja, por exemplo as parábolas de nosso Senhor e as lições que se pode tirar delas. Entretanto, todas elas possuem um compromisso total com Deus e com os valores da realidade, pois sobretudo vivemos em um mundo real.

Creio que é por esta razão que o apóstolo Paulo, escrevendo aos filipenses, destaca a importância de se considerar a realidade em detrimento da ficção ou fantasia, como algo importante para a solidificação da vida espiritual: “Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento” (Fp 4.8).