sábado, 24 de novembro de 2007

Uma tradição antiga

Nossa Igreja está hospedando o IX Congresso da Federação das Sociedades Auxiliadoras Femininas do Presbitério Médio do Rio Doce. Hospeda com alegria. Para nós é uma honra ver este congresso ser realizando aqui.

Honra, pois temos o privilégio de ver o mesmo trabalho, que sempre foi feito, sendo atualizado.

Alguns tendem a menosprezar o trabalho feminino, mas um exame atento das Escrituras deve nos levar a outra postura. Veja, por exemplo, os evangelhos:

Lucas registra: “Depois disso Jesus ia passando pelas cidades e povoados proclamando as boas novas do Reino de Deus. Os Doze estavam com ele, e também algumas mulheres ... Maria, chamada Madalena, ... Joana, mulher de Cuza, administrador da casa de Herodes; Susana e muitas outras. Essas mulheres ajudavam a sustentá-los com os seus bens.“ (Lc 8.1-3 NVI)

Essas mulheres, que seguiam Jesus e seus apóstolos e “auxiliavam-nos” (o texto pode ser traduzido assim também) é o embrião das “Sociedades Auxiliadoras Femininas.

Repare que todas eram mulheres atarefadas. De Maria Madalena há pouco que falar face ao quanto já sabemos dela. De Joana, basta ver o encargo de seu marido para ter idéia de suas responsabilidades.

Sabemos pouco de Suzana (aportuguesamento da forma hebraica de açucena: a flor) que aparece apenas aqui.

Mas veja como elas estavam presentes até nas horas mais difíceis de nosso Senhor:
Mateus destaca: “Estavam ali muitas mulheres, observando de longe; eram as que vinham seguindo a Jesus desde a Galiléia, para o servirem; entre elas estavam Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José, e a mulher de Zebedeu”.

Marcos enfatiza o auxílio que elas prestavam ao Senhor (inclusive em sua última viagem a Jerusalém): “Estavam também ali algumas mulheres, observando de longe; entre elas, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e Salomé; as quais, quando Jesus estava na Galiléia, o acompanhavam e serviam; e, além destas, muitas outras que haviam subido com ele para Jerusalém”.

Lucas nos dá a impressão de que eram muitas: “Entretanto, todos os conhecidos de Jesus e as mulheres que o tinham seguido desde a Galiléia permaneceram a contemplar de longe estas coisas. ... Era o dia da preparação, e começava o sábado. As mulheres que tinham vindo da Galiléia com Jesus, seguindo, viram o túmulo e como o corpo fora ali depositado. Então, se retiraram para preparar aromas e bálsamos”.

E João, o único apóstolo que testemunhou de perto a crucificação, enfatiza: “E junto à cruz estavam a mãe de Jesus, e a irmã dela, e Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena”.

Também no dia da ressurreição, quando elas iam embalsamá-lo, embora Mateus e Marcos deixem-nos a impressão de uma ou duas, Lucas fornece-nos mais detalhes: “Mas, no primeiro dia da semana, alta madrugada, foram elas ao túmulo, levando os aromas que haviam preparado. E encontraram a pedra removida do sepulcro ... Eram Maria Madalena, Joana e Maria, mãe de Tiago; também as demais que estavam com elas confirmaram estas coisas aos apóstolos”.

Há um grupo que se destaca, mas há uma quantidade muito maior que auxilia anonimamente. No primeiro texto lemos “muitas outras”. No texto da crucificação Mateus diz “muitas mulheres”. Marcos diz “e além destas, muitas outras”. E as expressões de Lucas nos trazem a certeza de que eram muitas. Releia o texto.

Entretanto, as mulheres de nossos dias, não peregrinam mais com o Senhor pela Judéia. Peregrinam por todo Brasil, e, especialmente aqui, vemos as que têm por ambiente o vale central do Rio Doce.

Não trazem comida ou vestes para o Senhor, como suas antigas colegas faziam. Porém preocupadas com a situação que vivemos, trazem suas famílias – com os dilemas e dificuldades que sofrem – e os colocam aos pés do Senhor. Ou seja: consagram-nas ao Senhor como suas antigas companheiras faziam também.

Portanto, não é de menos importância hospedar quem tem uma tarefa tão difícil e quer cumpri-la da melhor forma possível.

Por tudo isso e pela preocupação em serem relevantes ao ponto de surpreenderem com a manutenção de uma tradição tão antiga temos a obrigação de orar por elas e com elas.

Que as sementes deste congresso frutifiquem para a glória do Senhor.

sábado, 17 de novembro de 2007

A propósito da eleição de Oficiais (Parte 3)

No boletim passado resumi os pré-requisitos que Deus estabelece para quem almeja ser presbítero em sua Igreja, os quais foram registrados pelo Apóstolo Paulo em suas cartas a Tito e a Timóteo. Entretanto, suprimi as razões pelas quais eles são exigidos. Vamos destacá-las hoje.

Na carta à Tito, lemos:

5Por esta causa, te deixei em Creta, para que pusesses em ordem as coisas restantes, bem como, em cada cidade, constituísses presbíteros, conforme te prescrevi: 6alguém que seja irrepreensível, marido de uma só mulher, que tenha filhos crentes que não são acusados de dissolução, nem são insubordinados. 7Porque é indispensável que o bispo seja irrepreensível como despenseiro de Deus, não arrogante, não irascível, não dado ao vinho, nem violento, nem cobiçoso de torpe ganância; 8antes, hospitaleiro, amigo do bem, sóbrio, justo, piedoso, que tenha domínio de si, 9apegado à palavra fiel, que é segundo a doutrina, de modo que tenha poder tanto para exortar pelo reto ensino como para convencer os que o contradizem. 10Porque existem muitos insubordinados, palradores frívolos e enganadores, especialmente os da circuncisão. 11É preciso fazê-los calar, porque andam pervertendo casas inteiras, ensinando o que não devem, por torpe ganância” (Tt 1:5-11).

Este texto deixa claro porque os presbíteros devem ter tais qualidades e porque Tito deveria constituí-los.

Tito deveria constituí-los para “por em ordem o restante das coisas”, e devido a “existência de muitos insubordinados” que pervertiam “casas inteiras” apenas por ganância.

Isso já indica alguns aspectos da missão de um presbítero: Por em ordem e proteger a igreja de insubordinados gananciosos.

Porém, para isso ele deve ser irrepreensível como despenseiro (no original ‘ecônomo’ que significa também mordomo) de Deus e possuir uma lista de características pessoais (não arrogante, não irascível, etc.), que, pelo contexto exprime características de vida em família.

Na carta enviada a Timóteo lemos:

2... seja irrepreensível, esposo de uma só mulher, temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro, apto para ensinar; 3não dado ao vinho, não violento, porém cordato, inimigo de contendas, não avarento; 4e que governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito 5(pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus?); 6não seja neófito, para não suceder que se ensoberbeça e incorra na condenação do diabo. 7Pelo contrário, é necessário que ele tenha bom testemunho dos de fora, a fim de não cair no opróbrio e no laço do diabo” (1Tm 3:2-7).

Observe que a ênfase é colocada no desempenho familiar. O texto começa exigindo que seja “marido de uma só mulher” (bom esposo) e termina exigindo que saiba criar seus “filhos sob disciplina com todo respeito” (bom pai). E argumenta: se não souber “governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus”?

Daqui já pode-se concluir que a seleção dos presbíteros deve ser feita entre os pais. A casa é o campo de prova na qual a igreja pode reconhecer se alguém é apto, ou não, a ser um presbítero conforme os critérios de Deus.

Há muitos anos atrás vi alguém defender uma candidatura com as seguintes palavras: “Indico o irmão fulano, pois todos sabem de sua importância como empresário bem sucedido que começou do zero e hoje destaca-se dentre muitos, inclusive na dedicação à igreja”.

Se ele tivesse ficado na última frase – dedicação a igreja – restaria compará-lo com sua dedicação à família. Se fosse equivalente não haveria mais o que questionar.

Entretanto, cada vez mais os valores mundanos, sejam empresariais, sejam circenses, são vistos como pré-requisitos para quem assume a liderança da igreja: deve ser bom administrador ou bom animador. Ou seja: satisfazer aos eleitores e não necessariamente a Deus, contrariando o ensino bíblico que os eleitores devem escolher o candidato que mais atenda a prescrições divinas.

*

Um segundo assunto, específico da carta a Timóteo, é o perigo a que o presbítero está sujeito: a ação do diabo. Esta pode acontecer de duas formas: levando-o a se orgulhar da posição a que foi elevado e incorrendo no mesmo erro que o diabo incorreu, ou, nas palavras de Calvino: “exposto à reprovação pública, endureça cada vez mais o coração e se entregue mais livremente à toda iniqüidade, o que equivale a colocar-se debaixo das armadilhas do demônio. Pois, que esperança resta a quem peca sem sentir vergonha?”

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Excelente obra é o presbiterato, porém de tão pesada só pode ser desempenhada na dependência total da graça de Deus.

sábado, 10 de novembro de 2007

A propósito da eleição de Oficiais (Parte 2)

Paulo promoveu eleição de presbíteros mesmo em circunstâncias adversas, como quando foi apedrejado ao ponto de ser dado por morto, pois entendia que a existência deles era vital: um presente de Deus à sua Igreja como ele escreveu aos efésios: “para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo, para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro.”

Além de promover, ordenou que se fizesse. Essa foi a missão específica de Tito em Creta: "Por esta causa, te deixei em Creta, para que pusesses em ordem as coisas restantes, bem como, em cada cidade, constituísses presbíteros...”.

Porém, veja os pré-requisitos, “... Conforme te prescrevi”: 1) Irrepreensível, 2) marido de uma só mulher, 3) que tenha filhos crentes que não são acusados de dissolução, nem são insubordinados, 4) não arrogante, 5) não irascível, 6) não dado ao vinho, 7) nem violento, 8) nem cobiçoso de torpe ganância, 9) hospitaleiro, 10) amigo do bem, 11) sóbrio, 12) justo, 13) piedoso, 14) que tenha domínio de si e 15) apegado à palavra fiel.

Timóteo também tinha o mesmo dever com pré-requisitos semelhantes: 1) irrepreensível, 2) esposo de uma só mulher, 3) temperante, 4) sóbrio, 5) modesto, 6) hospitaleiro, 7) apto para ensinar; 8) não dado ao vinho, 9) não violento, 10) cordato, 11) inimigo de contendas, 12) não avarento; 13) que governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito, 14) não seja neófito e 15) tenha bom testemunho dos de fora.

Podemos resumir os pré-requisitos em obrigações e proibições:

Obrigações:
1º. Irrepreensível aparece nas duas listas e diz respeito ao modo como vive depois da conversão.
2º. Marido de uma só mulher também aparece nas duas listas e diz respeito a uma vida casta e monogâmica.
3º. Bom pai (item 3 na lista de Tito e 13 na de Timóteo), fala do exercício da boa paternidade, bem como da boa chefia da família.
4º. Hospitaleiro aparece nas duas listas.
5°. Amigo do bem aparece na lista de Timóteo como inimigo de contendas. Diz respeito a uma atitude pacífica diante de confrontos.
6°. Sóbrio também aparece nas duas listas e significa mais do que “não bêbado”: sobriedade no falar, no vestir, no gesticular ... etc.
7º. Justo e piedoso aparecem apenas na lista de Tito, embora estejam latentes na de Timóteo. Justiça caracteriza quem sabe distinguir as diferenças e tratá-las correspondentemente, e piedade caracteriza quem quer viver de modo santo (não confunda com o derivado “ter piedade”).
8º. Domínio de si aparece em Timóteo como temperante. Embora não seja a mesma palavra grega (em Tito significa literalmente “dominar o eu” e em Timóteo “vigiar os próprios desejos”), refere-se mais ou menos a mesma atitude.
9º. Apegado a palavra fiel aparece em Timóteo como apto para ensinar. Apesar de as expressões sequer serem as mesmas, o objetivo é. Transmissão de conteúdos doutrinariamente sadios.
10º. E finalmente em Timóteo aparece modesto, cordato, e bom testemunho dos de fora.

Proibições:
1º. Arrogante (literalmente: “auto-bastante”).
2º. Irascível. Conhecemos hoje como “estourado” ou “pavio curto”.
3º. Dado ao vinho. Proibição comum às duas listas.
4º. Violento. Proibição comum às duas listas.
5º. Cobiçoso de torpe ganância, que na lista de Timóteo é mais ou menos equivalente a avarento.
6º. Novo na fé (neófito).

Tais pré-requisitos, dificilmente podem ser totalmente encontrados em uma só pessoa. Uma mesma pessoa pode possuir alguns em maior quantidade e qualidade do que de outra. Porém isso não é motivo para que deixamos de escolher alguém. Devemos comparar quem almeja o ofício – lembre-se: excelente obra almeja – e escolher aquele que melhor atenda os pré-requisitos de Deus.

Tampouco é motivo para mudar os pré-requisitos estabelecidos por Deus. Tenho visto que outros pré-requisitos estão gradualmente substituindo esses. Mas isto é assunto para outro artigo.

domingo, 4 de novembro de 2007

A propósito da eleição de Oficiais

Quando, como cidadãos, votamos em alguém para o exercício de algum cargo público, esperamos que ele se comporte, decida ou legisle de acordo com nosso ponto de vista. Afinal de contas ele é nosso representante.

Tal acontece porque vivemos, como cidadãos, em um país onde prevalece o texto constitucional: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ...”. Por definição o estado brasileiro deve ser um “espelho” da sociedade brasileira.

Os pré-requisitos para que alguém seja eleito no Brasil, são os mínimos: nacionalidade, alfabetização mínima, regularidade eleitoral, filiação partidária, e idades mínimas (35 anos para Presidente e Senador, 30 para Governador, 21 para Deputado, Prefeito e Juiz de Paz, e 18 para vereador).

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Quando, como ovelhas do rebanho de Deus, votamos em alguém, devemos esperar que ele se comporte, decida ou legisle, de acordo com o ponto de vista de Deus. Afinal de contas ele é, “lato sensu”, representante de Deus.

Tal acontece porque, vivemos, como ovelhas do Senhor, em um rebanho comprado por seu sangue. Por definição a Igreja deve ser espelho da vontade de Deus.

A priori, há tantos pré-requisitos para alguém ser eleito à algum ofício na Igreja, que é praticamente impossível encontrar alguém que atenda plenamente a todas as exigências. Curiosamente, todas essas exigências dizem respeito a sua vida familiar (mais tarde escreverei sobre esse assunto).

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Dessas observações conclui-se que:

1. O voto civil é totalmente diferente do voto na Igreja. Enquanto o voto civil expressa nosso gosto, nossa vontade, nossa ideologia, o voto na Igreja deve expressar as determinações do Senhor da Igreja.

2. O eleito para algum cargo público está preso a vontade de seus eleitores ao passo que o eleito para um ofício na Igreja está preso às ordens do Senhor da Igreja (muitas vezes contra seus eleitores).

3. Os eleitos na vida civil são representantes do povo para fazer o que lhes foi delegado pelo voto popular. Os eleitos na Igreja são representantes do povo diante de Deus. Ou seja: são, os que mais se aproximam - dentre os que se congregam naquele rebanho local – do padrão estabelecido por Deus.

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A pergunta obvia é: por que razão Deus delega as ovelhas de seu rebanho a tarefa de escolherem alguém que cumpra a vontade dele e não, necessariamente, a vontade delas?

A resposta é dupla:

1) Devido a docilidade do rebanho e sua natureza fácil de ser manipulada (como vemos ser manipulada por auto-intitulados bispos, apóstolos, profetas e que tais), Deus não permite a Igreja outro meio de escolha de seus oficiais regulares, que não o voto.

2) Para que o Rebanho seja responsabilizado, diante de Deus, por um eventual descaminho - mesmo que tenha sido seduzido por líderes maus - por não ter obedecido os critérios divinos para escolha.

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Ao votar, portanto, a ovelha está dizendo: reconheço que fulano é o que mais se aproxima do que Deus determina como padrão para tal ofício.

Tenho certeza de que aqui está a maior razão da falta de identidade das Igrejas de nossos dias: o oficial porta-se como um político pressuroso em atender as exigências de seus eleitores e não como um servo de Deus em que a maioria das ovelhas viu e atestou a existência do chamado divino para o exercício do ofício que lhe foi confiado.