sexta-feira, 22 de outubro de 2004

Uma visita pastoral

Ele já não conseguia ir à Igreja. “A idade pesava mais do que 5 arrobas”. Repetia a quem perguntava sobre sua ausência.

Enquanto eu o ouvia falar, ficava imaginando meu próprio pai. Apesar de idoso, ainda lúcido. As manias haviam aumentado com os anos. Não eram as manias antigas da bengala e do chapéu. Eram mais novas e esquisitas. Chás, xaropes, e outras coisas que ajudavam a suportar as dores. Dentre as mais estranhas havia uma que se destacava: um pauzinho, de palmo e meio de comprido, com um corte em cada uma das pontas, de modo que colocado debaixo do cinto, encaixava-se. Como se um palmo da parte de traz do cinto fosse rígida e pressionasse as vértebras, que segundo ele diminuía a intensidade da dor.

- É uma dor que rasga. As vezes penso até em me sentar na calçada, tanto que dói. Mas fico com vergonha e faço das tripas coração para chegar logo em casa. Por isso não saio mais. Só pro hospital. Até as injeções, é minha filha, quem vem aplicar.

Eu ouvia, condoído, lembrando de meu pai. Depois de uma meia hora de falar em dores, parece que ele cansou-se do assunto e começou a falar do tempo em que a Igreja fora fundada.

- Ali era só barro. Pra chegar na Igreja era preciso ter cuidado. Era uma descida. Dava cada escorregão, que todo domingo um ou dois chegava sujo de lama. Foi preciso colocar telha nova de tanta goteira que tinha. Depois é que apareceu um negócio bom e deu pra comprar uma casinha melhor. Mesmo assim foi preciso fazer uma campanha e ficar apertado até pagar tudo. Mas a gente pagou a última letra antes do prazo. Até hoje lembro da alegria. Teve culto. Teve um almoço. Cada um levou um prato.

A tristeza que estava por trás da descrição dos sofrimentos, com que começara nossa conversa, estava desaparecendo. Mas ele não ficou nas memórias. Elas foram o começo ...

- Lembro como se fosse hoje – continuou – a classe de adultos ficava tão cheia que ficava gente do lado de fora olhando pela janela. Eu chegava bem cedo pra encontrar uma cadeira, mas depois ia chegando gente ... as mulheres, os velhos ... e quando eu dava fé, já tava do lado de fora.

- Seu Altamiro gostava de falar dos Salmos. Tinha as lições, mas vira e mexe ele acabava mesmo era em um Salmo. Decorei muitos...

- Um dia desses, mesmo, eu tava lembrando de um que dizia pra gente louvar a Deus, pois ele reforçou as trancas das nossas portas. Naquele tempo a gente não prestava muita atenção nisso pois bastava uma tramelinha na porta. Mas hoje ... olha entrou gente, na casa da vizinha, na semana passada, e ...

Antes que ele mudasse de um assunto tão proveitoso quanto os Salmos, para contar o que já se escuta aos montes eu interrompi: - Que Salmo mais o Senhor decorou?

- Ah! Tantos que nem sei contar todos. Mas eu gosto muito, daquele que diz que bem-aventurado é o povo que teme ao Senhor. Tem aquele outro, que fala que o anjo do Senhor acampa-se ao redor dos que o teme e os livra do mal.

Como era bom ouvir a verdadeira enxurrada que ele passou a declamar. De alguns um ou dois versículos, mas o Salmo 23 foi declamado por inteiro, na versão melodiosa: “deitar-me faz em verdes pastos, guia-me às águas de descanso...”. Inteiro também foi o Salmo 27. Do mesmo modo o 121, o 122, o 123 e o 128.

Oramos. E, depois de um cafezinho, ele foi comigo até o portão. Apertou minha mão com força, e eu percebi que ele não se encostara à parede como tinha feito quando eu cheguei. Olhei por cima do ombro dele, e, na poltrona, estava esquecido o pauzinho de por no cinto. Foi então que eu me lembrei do Salmo 103:

Bendize, ó minha alma, ao SENHOR,
e tudo o que há em mim bendiga ao seu santo nome.
Bendize, ó minha alma, ao SENHOR,
e não te esqueças de nem um só de seus benefícios.

Ele é quem perdoa todas as tuas iniqüidades;
quem sara todas as tuas enfermidades;
quem da cova redime a tua vida e te coroa de graça e misericórdia;
quem farta de bens a tua velhice,
de sorte que a tua mocidade se renova como a da águia.

O vento e as folhas secas

A noite de quarta-feira passada chegou com uma brisa fresca que logo virou vento forte, e, o que era apenas um alívio ao calor do dia, transformou-se em mais uma belíssima lição que Deus, através nossa ilha, nos dá.

Quando saí para o encontro da Saf e Uph estranhei a sujeira da rua. Só quando cheguei à avenida é que percebi que a sujeira era a boa sujeira: folhas. Foi então que liguei uma coisa à outra: o vento e as folhas.

A Bíblia estava sendo encenada: “Os ímpios ... são, porém, como a palha que o vento dispersa.”

Que figura tremenda!

Uma rajada mais forte e as folhas eram levadas para um lado. Outra rajada, e eram levadas para outro. Iam para onde o vento as levava. Não são assim os “sem-Deus”? Hoje todos concordam com algo, amanhã ... ora, amanhã depende dos estilistas de moda, dos músicos, dos políticos ... enfim: das “rajadas de vento”.

Fiquei um pouco com alguns irmãos que conversavam com o aniversariante à porta de entrada do prédio admirando a cena fantástica: folhas e até galhos arrancados violentamente.

Mas nesta bendita peça ainda havia um “segundo ato”. À medida que as ruas ficavam cheias de folhas mortas, que eram levadas de um lado a outro, as árvores, mesmo agitadas, iam ficando mais verdes: as folhas vivas resistiam. Como símbolo da verdadeira Igreja, trouxeram à minha mente tantas lições, que, quase peço alguém para me substituir e vir para casa escrever essa pastoral.

Lembrei-me das palavras de nosso Mestre e Senhor: “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora, à semelhança do ramo, e secará” (Jo 15.5e6).

Lembrei-me também da função principal dos oficiais da Igreja: ”...para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina“ (Ef 4.14).

Quantas pessoas, quais ramos secos, arrancados pelo vento, não dão qualquer tipo de fruto e já estão em vias de serem lançados fora? Quantas pessoas, como os ímpios, seguem os ventos mundanos quais meninos agitados, seguem também os terríveis ventos de doutrina, que nada fazem senão prejudicar uma vida espiritual autêntica?

Da próxima vez que você vir as árvores de nossa ilha serem sacudidas pelo vento, lembre-se desse grito que pode ser entendido por todos, mesmo por aqueles que infelizmente não têm o hábito de ler a Palavra do Senhor.


sábado, 28 de agosto de 2004

Uma canoa afundada

Havia chovido durante a noite toda, mas ao sopé do Ibituruna a neblina baixa me fazia lembrar do ditado de nossos antepassados: "neblina baixa, sol que racha".

Minha atenção oscilava entre os sons das corredeiras que iam ficando para trás, os passos ritmados de minhas queridas companheiras de caminhada, o canto de muitos passarinhos e a sombra de grandes árvores aos pés das quais a água do rio já se fazia funda lembrando igapós.

Foi quando eu a vi. A princípio aparecia apenas a ponta, que, se não fosse tão rústica, de tábuas pregadas, poderia ser tida por uma quilha, mas era apenas uma ponta. Ponta que insistia em ficar fora d’água, apesar de todo o corpo já estar submerso. Era uma canoa, que no dia anterior, a simplicidade de suas linhas havia me tocado.


A tábua de fundo era chata um pouco curvada, mas as laterais eram emendadas, na proa e na popa, e pregadas despretensiosamente em outras duas, fechando-a assim numa caixa que minha filha disse parecer com um caixão.


No dia anterior ela balançava sobre as águas, hoje ela estava quase toda submersa.

Lembrei-me de algo que li há muito tempo. Se não me engano escrito nos primeiros séculos da era cristã, que como já inspirou tantos, creio que posso tomar a liberdade, e usar também a sua preciosa lição.


A vida cristã é como essa canoa. Ela vive na água. Fora d'água apodrece e se quebra. O cristão vive no mundo e fora do mundo ele de nada serve, pois a quem proclamará as virtudes daquele que o chamou?


Porém, se ela vive na água e na água cumpre sua missão, quando a água entra nela sua ruína é certa. Assim é o cristão: ele cumpre sua missão no mundo, mas quando o mundo entra em sua vida, ele submerge.

O mesmo acontece com as Igrejas. Devem estar no mundo, mas não podem deixar o mundo entrar nelas.

Que lição as canoas afundadas podem nos dar. Quando você vir uma, pare e olhe para ela. Examine sua vida. Examine sua Igreja. Será que o mundo entrou nelas como o rio entrou na canoa?


Pode ser uma canoa simples, ou uma de quilha bonita, ou até mesmo um transatlântico, mas certamente a menor brecha pela qual a água possa entrar, trará seu naufrágio.


Felizmente Jesus, qual hábil marinheiro que pode resgatar a canoa, também pode nos fazer voltar a navegar.

quinta-feira, 26 de agosto de 2004

razões

Hesitei em usar este instumento, porém, como experiência, espero, facilitar minha comunicação com o Povo de Deus.

Minha intenção é publicar, contando com a facilidade desta mídia, tudo aquilo que for relevante para quem está acompanhando os assuntos que estou abordando.

Ore por mim.