sábado, 28 de agosto de 2010

Perdoar

Todos nós sabemos o que é perdoar. Também sabemos o quanto é difícil perdoar verdadeiramente e sabemos que perdoar é muito mais do que simplesmente dizer: eu te perdôo. Mais difícil ainda é ter certeza de que perdoou de fato.

Há alguns anos aconselho pessoas que não conseguem ter certeza de que perdoaram de fato. Essa dúvida geralmente se expressa por frases do tipo: Eu perdoei! De coração eu perdoei! Mas, quando nos encontramos a primeira coisa de que me lembro é do erro que eu perdoei. Então, como posso ter perdoado se não esqueci?

Primeiro preciso deixar bem claro que perdão não tem nada a ver com memória. Perdão é algo que exige apenas três atitudes: 1) Não levar em conta o erro que perdoou ao tratar com a pessoa que foi perdoada, 2) não basear uma ajuda futura a quem perdoou no fato ocorrido e 3) não divulgar o erro que perdoou, com o intento de difamar o perdoado.

Para ficar mais claro: Eu posso até me lembrar de que Fulano, com quem convivo, fez algo errado comigo. Mas, se o perdoei de fato - e sou obrigado a fazer isso “não apenas sete vezes, mas setenta vezes sete” - não deve ser tal lembrança, ainda que muito incômoda, que me atrapalhe a convivência diária com ele.

Posso até me lembrar de que Beltrano não me pagou uma dívida. Mas se eu disse, obedecendo ao Senhor, que o perdoava, não posso negar um empréstimo que ele venha a me pedir.

Posso até me lembrar de que Sicrano não cumpriu o que me prometeu. Mas se, na presença do Senhor eu o perdoei por isso, não posso espalhar pra todo mundo que ele não cumpre o que promete.

Nesse último caso, há uma observação: Se alguém está em vias de fazer um acordo com o Sicrano e esse alguém vier me pedir referências sobre ele, mesmo tendo perdoado, não posso me omitir. Ou seja: perdoar não exige que eu minta.

Romanticamente nos obrigamos a confirmar com sentimentos aquilo que afirmamos ter feito. Isso é uma grande dificuldade para quem vive pela fé. Não temos de sentir por quem perdoamos a mesma coisa que sentíamos antes. Se sentirmos, tanto melhor. Mas somos obrigados a manter as três atitudes do perdão.

Fomos perdoados de uma ofensa infinitamente maior do que qualquer coisa que pudermos imaginar. Não podemos prestar culto a Deus, orar como ele quer que oremos, ou participar da mesa de seu Filho se não perdoarmos nosso irmão. O verdadeiro crente é obrigado a perdoar de fato e não a enganar-se com sentimentos forçados.

Tampouco Deus exige que esqueçamos o que sofremos para chegar àquela atitude de perdão. Enquanto a graça de Deus não apagar o ocorrido de nossa memória (o que geralmente faz usando o tempo) todas as vezes que nos lembrarmos do mal, nos lembremos também das atitudes de perdão e coloquemos tudo aos pés da cruz. Um dia esqueceremos. Se não esquecermos, no dia eterno ele “enxugará de nossos olhos toda lágrima”.

sábado, 21 de agosto de 2010

Promessas não cumpridas

Chamado por Deus, Abraão partiu de Ur em direção a uma terra desconhecida. Literalmente: “Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra que te mostrarei” (Gn 12.1). Obedeceu e passou o resto da vida peregrinando. O único pedaço do qual se apossou foi a sepultura de Sara, comprada dos heteus por um preço exorbitante. A promessa de Deus a Abraão não foi cumprida.
Chamado por Deus, Moisés, séculos depois, conduziu o povo pelo deserto em direção à mesma terra. Mas diferentemente de Abraão, que peregrinou nela, apenas a viu de longe. Moisés também não viu cumprida a promessa.
Muitos não viram a concretização da promessa e o escritor da Carta aos Hebreus registrou: “Todos estes morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudando-as, e confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra” (Hb 11.13).
Não é notável que Abraão, o homem através do qual pactuamos com Deus em graça, e Moisés, o homem através de quem recebemos sua Lei, não obtiveram a concretização das promessas que lhe foram feitas?
É Deus injusto ao prometer algo e não cumprir? Ou será que o cumprimento de suas promessas não está vinculado ao nosso tempo? Ou ainda: Será que a verdadeira promessa não é a material, como entendemos, mas a espiritual que vamos receber ao chegarmos diante dele?
Desesperados, e em pranto, muitos já me questionaram: como é que Deus promete certas coisas e não cumpre?
Já ouvi: “pastor, Jesus prometeu se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus (Mt 18.19)? Por que então ele não cura meu marido?” ou “Por que ele não traz de volta meu filho?”
Não respondo com o engodo “você está pedindo sem fé”! Digo apenas “não sei”.
Não sei por que Abraão e Moisés, “homens dos quais o mundo não era digno” não obtiveram o que lhes foi prometido por Deus. Aliás, nem sei por que passaram por problemas difíceis até de descrever. Mas de uma coisa, tenho certeza: Embora eu não mereça o que foi dito deles, meu nome está no mesmo rol, pois também peregrino sobre uma terra que não me foi dada. Vejo e a saúdo de longe uma terra mais desejável, e igualmente anseio possuí-la.
Porém, o tempo em que isso acontecerá está determinado por meu Senhor. E mesmo que nenhuma promessa, que ele tenha feito, se cumpra nesta vida, tenho certeza de que todas serão concretizadas ao seu lado.

sábado, 14 de agosto de 2010

Lutas por fora, temores por dentro.

Embora alguns não a usem com receio de serem tidos por faltos de fé ou fracos, esta frase provavelmente é uma das melhores descrições do que a grande maioria de nós passa. Com ela, o apóstolo que se recomendou à consciência dos fiéis, confessa suas dificuldades à igreja de Corinto.

Na mesma carta confessa que perdeu uma grande oportunidade, concedida pelo Senhor, em Trôade, devido a falta de tranqüilidade (2Co 2.12-13) e que chegou a desesperar-se da vida pelo tamanho das tribulações que enfrentou na Ásia (2Co 2.8).

Eu já passei por momentos assim. Já pedi ao Senhor que me levasse e nem sei contar quantas oportunidades perdi por falta de tranqüilidade. Portanto, conheço, por experiência, o que você está sentindo, se enfrenta lutas por fora e temores por dentro.

Nenhum de nós está livre de lutas. Aliás, elas são tão necessárias à saúde nossa fé como uma atividade física é útil à saúde de nosso corpo. Para ser mais exato, o Senhor Jesus disse que elas fariam parte de nosso caminhar, quando nos mandou tomar, cada dia, a nossa cruz e segui-lo.

As lutas definem o caráter e fortalecem a fé.

Nenhum de nós também está livre de temores. Temores pela saúde, pelo trabalho, pela família, pelo futuro de nosso país, até mesmo pelo que está acontecendo com a igreja. Sempre vejo adolescentes ou jovens temendo um vestibular ou uma entrevista de emprego, pais receando pela companhia de seus filhos e anciãos preocupados com o último dia.

Os temores estimulam o exercício da fé.

Na própria carta Paulo cita duas razões pelas quais um filho de Deus enfrenta coisas assim: aprender amar a Deus sobre todas as coisas e aprender amar ao próximo como a si mesmo.

Ele aprende a amar a Deus quando as lutas e temores lhe mostram que é apenas um vaso de barro e que a excelência do que conseguiu fazer veio de Deus. Nas palavras do próprio Paulo: “De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para que sobre mim repouse o poder de Cristo” (2Co 12.9).

Ele aprende a amar seu próximo quando percebe que as lutas e temores passados e superados lhe ensinaram a confortar (cum+fortius=com força) ou consolar (obra primária do Paracletos) a quem enfrenta tal situação: “É ele [Deus] que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus” (2Co 1.4).

Nos dias atuais, além de não ser conveniente confessar tais problemas, considera-se feliz aquele que os supera com os próprios esforços. Isso não é um valor cristão. O verdadeiro cristão entende que a bem-aventurança consiste em ser consolado por Deus e aos pés dele depõe suas lutas e temores.

Hoje prega-se um cristianismo que traz prosperidade, saúde, realizações e vitórias. Desconfie! A principal mensagem do cristianismo é pregada à sombra de uma cruz. Lá está a verdadeira vitória. Lá cessam todas as lutas e dissipam-se todos os temores.

sábado, 7 de agosto de 2010

Aborto e palmadas. Filhos e pais.

Qual será o pensamento que orienta nosso governo?

De algumas leis e projetos de leis defendidos pelo nosso governo deduzo que se poderá matar, sob tortura, uma criança, desde que ela ainda não tenha nascido. Mas, depois de nascida, ela não pode levar sequer uma palmada que lhe seja benéfica.

Só posso entender admitindo que a criança antes de nascer não esteja viva, ou se sua vida for igual a de um vegetal, pois nem a insetos se mata desmembrando como ocorre em alguns processos de aborto.

Mas falando da criança já nascida, acho que pressupõem que, desde bebê, tenha a capacidade de entender coisas como não colocar a mão no fogo ou não levar à boca o enfeite de mesa - ou coisas piores - e principalmente de obedecer.

Pressupõem que uma criança ativa domine seu espírito desbravador e entenda que os pais têm razão ao impedi-la de entrar debaixo do brinquedo no parquinho, ou de subir nas prateleiras da geladeira para puxar um pudim delicioso, ou de não tomar o brinquedo novo que o coleguinha ganhou.

Parece coisa de quem não teve filhos ou nunca observou os filhos dos outros.

O que falar das crianças maiores ou dos pré-adolescentes que não ficam quietos? Creio que além de não ter filhos, o autor desse projeto, nunca deu aula: nunca “gestou o caráter” de alguém. Ou tem tanta maldade no coração quanto quem não vê problema algum em matar uma criança cujo corpo ainda está sendo gestado.

Uma nova dimensão aparece se compararmos a criança não educada - ou não disciplinada - com o adulto infrator.

O destino mais óbvio para as crianças não educadas por seus pais é o de menores ou adultos infratores e depois o de criminosos. Pois bem: nosso governo diz estar empenhado em políticas que diminuam a população carcerária. Como? Impedindo o uso dos instrumentos de educação à disposição dos pais?

Veja bem: não estou defendendo espancamentos. O que estou dizendo é que a criança deve ser educada. Para tanto é necessário que ela entenda o que os pais querem lhe ensinar e a linguagem que a criança pequena entende não é o discurso verbal.

A criança deixa de por a mão no fogo quando entende a associação entre a chama e a dor da queimadura, ou à dor menor da palmada do pai. Não é um discurso que convencerá uma criança de que não se pode brincar com fogo.

Quanto aos espancamentos já temos leis boas o suficiente para prender pessoas como aquela senhora que espancava a criança que pretendia adotar.

Ao disciplinar, com a pequena dor da palmada o pai evita a dor maior da queimadura ou do cárcere, mas acima de tudo impõe freio ao erro e respeito a autoridade.

Seria melhor se o governo se empenhasse na formação de pais. Da mesma forma que se preocupa com a formação de motoristas deveria se preocupar com a formação de pais e mães responsáveis.