sexta-feira, 25 de junho de 2010

O coral e a vuvuzela


Provavelmente de origem zulu (fazer barulho) a vuvuzela é uma espécie de trombeta. Talvez seja versão moderna dos instrumentos que os antigos tocavam para convocar reuniões (como os shofarim do Antigo Testamento). A diferença é que enquanto aqueles eram tocados sozinhos, esta é tocada em uníssono, pela multidão, fazendo um barulho tão medonho, que me faz duvidar da física de que os ruídos não se somam.
Os repórteres usam microfones de baixo ganho, colados aos lábios, e mesmo assim parece que o aparelho de televisão está com defeito com um ronco constante e atormentador. Já ouvi alguém dizer que o inferno ganhou um novo tipo de tormento.
O contraste estabelecido por elas, a que me referi no título, me ajudou a compreender a resistência de tantos jurássicos como eu a determinados tipos de música na Igreja.
As vuvuzelas são tocadas mais para alegria de quem toca do que para o deleite de quem escuta. Expressam uma alegria irresponsável e amolecada que não liga para o que se produz, nem para os efeitos produzidos no próximo. Aliás, parece que são tocadas exatamente para produzir tais efeitos danosos.
O contraste maior que posso imaginar é com a música coral. Enquanto a vuvuzela tem um só timbre e uma só expressão musical - como o bronze que soa ou como címbalo que retine - a música coral usa palavras escandidas, bem pronunciadas e enfatizadas pelo som que lhes dá suporte.
Dentre as muitas possibilidades, podem refletir o som vocálico ou consonantal, macio ou áspero, suave ou brusco das palavras faladas, e o próprio sentido delas: fica pesado e triste quando se fala de morte e dor. Clara e leve quando se fala de alegria e paz. A vuvuzela se repete.
Sempre rico de sons, como um arco-íris é rico em cores, ou um jardim de aromas, uma voz reforça, com determinada nota musical, o significado de uma palavra e outras vozes, com notas correspondentemente harmônicas, confirmam o que foi dito conforme o texto cantado. A vuvuzela não afirma nem nega. Apenas se repete.
Enobrece o discurso. Não fala do sangue precioso de Cristo e de seu sacrifício com o pouco caso do discurso evangelical moderno, nem enaltece sua vitória com o barulho de uma torcida violenta e furiosa.
Quando se canta Um só Rebanho, as diferentes vozes transmitem a impressão de estarem juntas, tamanha é a harmonia que as envolvem. Quando se canta a Bênção Aarônica, parece que sucessivas pancadas de chuva estão caindo em uma sucessão ritmada e coordenada pela frase “Que Deus...”.
A música coral é tão dirigida ao ouvinte (daí o perigo de virar espetáculo) que muitas vezes quem canta em um, embora goste de fazê-lo, não consegue apreciar a totalidade da música produzida.
Os protestantes históricos, tão acostumados a pensar que o culto a Deus além de lógico demanda empenho e trabalho, vêem com naturalidade consagrar a Deus o melhor de seu coração, de suas almas, de suas forças e também de seu entendimento. Nada mais natural, portanto do que a aversão a simploriedade carnal e amolecada das vuvuzelas em detrimento de uma música rica em conteúdo e de expressão trabalhada.

4 comentários:

Samuel Vitalino disse...

Grande Folton,
Sempre só tenho o que concordar com os seus escritos, e nesse, até quase o fim, achei que seria mais um em que apenas concordaria.
Graças a Deus, enfim, cheguei a uma fagulhinha de diferença... e - creia - isso me fez feliz.
Feliz por que corro sempre o risco de ser tão cego quando aprecio o conteúdo de alguém, que quando achei agora, essa diferença - percebi que ser humano é fascinante!

Certamente vinha cantando na mesma nota - que grande diferença entre o Coral e as irritantes vuvuzelas.
Depois você apenas me ajudou a ver a humanidade em nós!
Te amo meu irmão.
Grande e saudoso abraço,

Maurício Barbosa disse...

Rev. Fôlton, coitada da vuvuzela!

Abraços,

Maurício

Marcelo Batista Dias disse...

Muito bom artigo Rev.
Devemos resgatar o valor da boa musica. Especialmente no contexto gospel atual onde, em geral, musicas evangélicas e vuvuzelas soam no mesmo timbre.

Abrç.
Gostei muito do blog.
Marcelo.

Jean Carlos Serra Freitas disse...

Caríssimo Fôlton... Finalmente uma palavra de desaprovação sobre as "vuvuzelas". A comparação entre o barulho e a boa música só poderia sair mesmo de um jurássico. Graças a Deus que ainda há jurássicos escrevendo boas coias.
Grande abraço