sábado, 13 de novembro de 2010

Politicamente correto

Nas últimas semanas acompanhamos o debate sobre a proibição nas escolas públicas de um clássico da literatura infantil, que descreve a Tia Anastácia com termos que foram considerados racistas.

Nem quero entrar no mérito da questão, mas não deixei de rir quando um repórter reclamou que, desse jeito, ele teria de se referir ao Negrinho do Pastoreio como o Afro-descendente do Pastoreio.

Não há dúvida de que o racismo é algo deplorável contra o qual devemos estar alertas. Afinal o racista quebra o nono mandamento. Mas não creio que uma instituição governamental possa extingui-lo, pois ele está intimamente ligado à constituição da personalidade de cada um.

Entretanto há que se fazer diferença entre o racismo, condenável em todos os seus aspectos, e o modismo do politicamente correto, que, em minha opinião, foi o que mais pesou na tal proibição.

Em nossos dias não é politicamente correto chamar um cego de cego. Deve-se dizer que ele é deficiente visual. Como se deve chamar um aleijado de deficiente físico, ou (contra todas as normas de derivação da língua portuguesa) de cadeirante.

Um surdo deve ser chamado de deficiente auditivo e um gordo de obeso (ainda prefiro gordo). Um velho deve ser chamado de idoso ainda que muitos respondam: “idoso é seu avô”.

Estes melindres aparecem, geração após geração. Causam muitas situações embaraçosas, cômicas e, algumas vezes, trágicas. E curiosamente aparecem até na Igreja.

Temos em nosso hinário uma bela composição que exorta os jovens, os homens (no sentido de adultos), e os velhos a trabalhar. Cada uma de suas três estrofes destaca as peculiaridades de cada faixa etária. Dos jovens destaca a força, dos adultos o vigor e aos velhos exorta a considerar que “breve chega o fim”. A última edição que encontrei dedicada aos velhos foi a de 1975 (ainda Salmos e Hinos). Desde então se dirige a “todos”.

Precisamos ser gentis na hora de falar. Precisamos ser polidos e corteses. Porém, há um limite entre a cortesia e o eufemismo. Especialmente o eufemismo que tira a substância da comunicação autêntica. Corremos o perigo de, por não denominar corretamente as coisas, deixarmos de enquadrar os pecados nos respectivos mandamentos que ferem.

Por exemplo: até que ponto “um apropriador indébito” está quebrando o mandamento “não furtarás”? Ou, como cumpriremos a ordem bíblica de nos levantar diante das cãs se elas já não são nominadas, ou, por vergonha, são até escondidas?

Do mesmo modo que pecamos quando dizemos sim ao querermos dizer não, pecamos ao chamar de luz as trevas. Isaías já nos alertou sobre isso: Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal; que fazem da escuridade luz e da luz, escuridade; põem o amargo por doce e o doce, por amargo! (5.20).

Percebeu? Uma coisa é pecar por racismo ou por falta de cortesia. Outra é arriscar-se a pecar por perverter o significado das palavras.

Um comentário:

Oliveira disse...

Caro

As cãs ainda não foram "atacadas" na escritura, porque muitos nem sabem o que isto significa, e os demais (estou sendo generalizadamente "insensível") pintam os cabelos e escondem as cãs... O que me leva a refletir sobre outra coisa... A busca da juventude e da beleza, uma busca em demasia... também não é uma distorção... (desculpe: também não é um pecado)? Afinal me parece uma negação visível da morte (e o envelhecimento gradativo é para mim um paulatino aviso de Deus de que estamos morrendo lentamente e que o salário do pecado é a morte.

Sei não...

Por via das dúvidas, depois dos 50, vou "proibir" minha esposa de pintar o cabelo (risos... vamos ver se ela vai obedecer), os meus eu já não pinto... risos...


Abraço!