sábado, 30 de janeiro de 2010

Teu Pai que vê em secreto

Em secreto nosso Senhor Jesus via “como” se ofertava. Ele não estava invisível ou escondido, mas assentado olhando o movimento. Secretos eram seus juízos e suas intenções.

Como ele já ensinara a respeito da atitude do Pai, para com as esmolas, orações e jejuns, ele olhava e julgava secretamente.

Se porventura alguém soubesse o que estava para acontecer nos últimos dias daquela semana certamente o acusaria de desperdício de tempo. Afinal na sexta feira ele seria morto e já era terça. Era preciso deixar-nos claro qual era o verdadeiro valor de uma oferta.

Não lhe interessava quanto cada um ofertava, mas como o fazia. Verificava se a oferta era o sobejo, mesmo que fosse grande, ou expressão de amor, mesmo que fosse tão pequena que somada não atingisse a um quarto do valor mais comum.

Em secreto ele avaliou a quantos viu e recompensou o mais dedicado elogiando-o diante de seus discípulos e que nos serve até hoje de exemplo.

Provavelmente não tenha sido assim, mas desde pequeno imagino essa viúva relutante em chegar-se aos vasos em que as ofertas eram colocadas. Criança ainda eu pensava em como alguém colocaria naqueles gargalos estreitos as “grandes quantias” a que Marcos se refere e imaginava a viúva envergonhada jogar rapidamente suas moedinhas dentro do vaso de metal.

* * *

Em secreto nosso Pai nos vê e avalia nosso compromisso com ele. E, como seu Filho fez, nos premia diante daqueles que ele mesmo seleciona para saber o que fizemos.

Em secreto ele vê nossa verdadeira intenção ao contribuir. Não se interessa pelo tamanho da contribuição, mas pelo modo como ela é feita.

Desgosta fazermos com segundas intenções e nos abandona ao elogio público (efêmero por natureza) quando tal intenção é receber reconhecimento ou elogios de nossos semelhantes.

Em secreto ele vê nossa verdadeira intenção ao orar. Não lhe interessa o que pedimos, pois ele nos dará o de que necessitamos, nunca o que nossa natureza pecaminosa deseja. Também não vê se nossas súplicas são meritórias ou não, pois os únicos méritos que contam são os de seu Filho.

Abomina ver seu Nome tomado em vão especialmente em orações feitas para que se perceba “como somos piedosos e dedicados” a ele.

Abomina nossa prática de invocar o Nome de seu Filho e orarmos de nós para nós mesmos, mostrando nossa erudição e qualidades e abandona-nos ao reconhecimento e ao louvor dos que nunca souberam e nunca saberão quem ele é.

Abomina os discursos longos e as repetições enfadonhas de que nos valemos, em substituição da fé, para termos certeza de que ele atenderá favoravelmente nossos pedidos.

Em secreto ele vê nossos jejuns. Sabe quando estamos negando alimento a uma natureza inquieta e dispersa com o fim de dominá-la e reduzi-la a servidão para que não estorve o espírito que, na realidade, está pronto, mas precisa de um meio obediente para executar sua prontidão.

Abomina divulgarmos isso para nos promovermos como mais santos e abandona-nos ao elogio mundano dos que sem percepção admiram hipócritas assim.

Nosso Pai nos vê em secreto. Mas, em vez de nos afligir, lamenta nossas propensões pecaminosas e constantemente nos aponta seu Filho como modelo a seguirmos, pois ele tudo fez unicamente para o louvor do Pai. E, dos homens, a única recompensa que recebeu foi ser antecipadamente ungido por uma mulher para seu sepultamento.

sábado, 23 de janeiro de 2010

A âncora da alma

Os arrecifes formavam com a praia uma grande enseada de águas calmas. Neles as ondas se quebravam e dentro da enseada pequenas ondas eram formadas pelo vento forte que soprava do nordeste.

Uns nadavam, outros se contentavam em olhar o fundo através da água transparente, e outros, alugando pequenos barquinhos de uma vela, navegavam de cá pra lá, até que, cansados de ir e vir, ou de abaixarem-se para não levar uma pancada da retranca quando o vento enfunava a vela para o outro lado, paravam.

Mas, como manter parado um barco tão leve, em um local onde a corrente marinha era bem sentida e os ventos impulsionavam tão bem a vela maior do que o próprio barco? Jogavam a âncora!

Quando vi, pela primeira vez, me admirei com o tamanhozinho da âncora. Mas foi suficiente: o barquinho ficou parado e alinhou-se ao vento e por mais que este soprasse, ou que a corrente marinha ou a própria maré vazante tentasse levá-lo em direção aos arrecifes, ele permanecia parado.

Minha atenção variava entre o barquinho ancorado e outro, que insistia em ir e vir perpendicularmente ao nordeste. O primeiro permanecia parado e o segundo vagava entre as ordens de seu capitão inexperiente e os caprichos dos elementos.

Parando ao lado e igualmente jogando ao mar uma âncora pequena, perfilou-se ao primeiro pela força do vento e da água.

Também era interessante vê-los parados: agitavam-se sincronizados e juntos respondiam às lufadas. Mas, unânimes, permaneciam ancorados.

Na figura dos dois barquinhos ancorados eu li “... forte alento tenhamos nós que já corremos para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta; a qual temos por âncora da alma, segura e firme e que penetra além do véu, onde Jesus, como precursor, entrou por nós, tendo-se tornado sumo sacerdote para sempre...” (Hb 6.18-20) e entendi um pouco mais sobre a esperança. O texto a compara com âncora que segura o barco.

Que figura maravilhosa! O barco está sujeito aos elementos, mas permanece firme porque a âncora, penetrando a água apóia-se em terra firme. E porque ela está em terra firme o barco permanece no lugar, mesmo sofrendo as sacudidelas do vento ou a força das correntes e da maré.

Certamente os ventos que empurram nossas vidas são muito mais fortes do que aquele suave e fresco vento nordeste que tanto prazer trazia em dia de calor.

Certamente as forças submersas que nos empurram para frente ou para trás, para um lado ou para outro, são mais temíveis do que as correntes marinhas e a maré.

Mas, não deixamos de ser como aquele barquinho que sofre todas essas influências. Aliás, influências maiores e mais danosas. E como o barquinho, temos de nos manter sobre a água, sem que a água entre em nossas vidas.

Se não estivermos bem ancorados, o vento nos sopra, a maré e as correntes nos empurram e corremos o risco de encalhar na praia ou pior: sermos jogados contra os arrecifes.

Mas temos uma grande vantagem sobre o barquinho. Enquanto ele é mantido por uma âncora que pode ser movida (afinal não é tão grande), nossa esperança - âncora de nossa alma - é firmada pelo eterno e inamovível Jesus.

Vivemos sujeitos a ventos e ondas. Corremos o risco de soçobrar, encalhar, ou sermos atirados contra arrecifes. Entretanto nossa esperança, qual âncora, já está com Jesus. Percebeu? Nossa esperança - uma parte de nós - já está com o Senhor.

Bendita âncora!