Não é raro encontrarmos nas Escrituras Sagradas algumas palavras que deixam claro a dificuldade de expressar o que elas descrevem. Por exemplo: “a cidade é de ouro puro, como vidro transparente”? Ou as que Paulo ouviu e disse que além de inefáveis eram ilícitas ao homem pronunciá-las.
Lucas, na descrição da descida do Espírito Santo sobre a Igreja em Jerusalém, também enfrentou essa dificuldade. Sabemos que ele procurou informar-se com exatidão, com os que viveram os acontecimentos. Cremos que ele foi assistido pelo próprio Espírito Santo na descrição feita. Mas atente para a descrição feita.
A casa em que todos estavam reunidos não foi sacudida por vento. Mas “enchida” por um som semelhante ao som que faz um vento tempestuoso.
Tampouco foi incendiada. Mas línguas ‘como de fogo’, separadas umas da outras, apareceram e pousaram: uma sobre cada cabeça.
Estes dois símbolos são sinérgicos e não podem ser apreciados separadamente, pois falam da mesma coisa.
O som de vento, certamente lembrava a judeus o Espírito de Deus (Ruach em hebraico: que é uma onomatopéia de respiração).
Era-lhes comum a lembrança de textos como: “Então, Moisés estendeu a mão sobre o mar, e o SENHOR, por um forte vento oriental que soprou toda aquela noite, fez retirar-se o mar, que se tornou terra seca, e as águas foram divididas” (Ex 14.21). Ou do profeta Samuel a quem foi mostrado “os fundamentos do mundo” quando Deus descobriu-lhe as profundezas do mar pelo “iroso resfolegar das suas narinas” (2Sm 22.16).
Para eles o vento era símbolo do Espírito de Deus: seu sopro e sua respiração, que vivifica. Mas na casa em que se aglutinavam 120 pessoas o vento se faz presente pelo seu som.
Já ouvi de muitas pessoas, e eu mesmo tive a experiência, de “sentir” um ambiente - no meu caso uma igreja - “cheia de som” em que os grandes pulmões de um órgão de tubos transmitia a impressão de que se podia tocar naquela “matéria etérea” que a tudo enchia e pervadia.
O fogo também fazia parte da “memória simbólica” deles. O fogo da sarça não a consumia, o fogo do tabernáculo, cheio da “presença de Deus”, não consumiu a Moisés nem o povo sobre o qual se levantava como coluna. Mas reduziu à cinzas, como castigo terrível, os filhos desobedientes de Arão. E, como sinal de aprovação, consumiu as ofertas sobre o altar.
Porém, naquele bendito dia “eram línguas como de fogo”. Como se fossem miniaturas daquela enorme coluna que acompanhava o povo pelo deserto. João vem novamente em nosso auxílio: “Vi como que um mar de vidro mesclado de fogo” (Ap 15.2). Inefáveis experiências. Eventos indescritíveis.
Mesmo não descritos em sua totalidade, foram fatos reais, que de alguma forma foram expressos através de analogias com outros fatos semelhantes já acontecidos.
Agora, pare e pense: Os elementos vento e fogo não estavam totalmente presentes. Porém, paradoxalmente, as palavras estavam. Eram idiomas! Hoje, talvez, coreano, russo, finlandês, árabe, etc.
Não houve uma “tradução simultânea”. O milagre não foi no ouvir, mas no falar: verbo repetido 6 vezes nesse texto. O Espírito Santo capacitou a falarem imediatamente idiomas, que, via de regra, são aprendidos depois de muito esforço e muito tempo de estudo.
Eles não falaram coisas sem sentido: evangelizaram. Proclamaram a Jesus e as “grandezas de Deus”. Finalmente podiam ir “pelo mundo inteiro e pregar o evangelho a toda criatura”. Não ficaram em Jerusalém em sons desconexos fingindo idiomas.
Certamente esse tema também estava no pensamento do Apóstolo ao advertir a Igreja de Corinto: “Deus não é de confusão” (1Co 14.33).
Essa advertência é também para nós.
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