sábado, 26 de abril de 2008

NEC TAMEM CONSUMEBATUR

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Há muitos anos atrás, quando dava forma de povo aos descendentes de Abraão, o SENHOR apareceu a Moisés. Apareceu em uma sarça, que, incendiada, não se consumia.

Dali soubemos que Ele É o que É. E esse fogo que manifestou-se a Moisés na sarça ardente, acompanhou o povo de Deus. Aliás, acompanha até hoje.

Algum tempo depois - já livres do Egito - voltaram ao mesmo lugar em que Moisés vira a sarça, e acamparam-se ao redor do monte.

Enquanto Moisés recebia a Lei, mais do que a sarça, o monte todo ardia. Ardia de tal modo que mesmo após milhares de anos foi descrito com estas palavras: “não tendes chegado ao fogo palpável e ardente, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade, e ao clangor da trombeta, e ao som de palavras tais, que quantos o ouviram suplicaram que não se lhes falasse mais, pois já não suportavam o que lhes era ordenado: Até um animal, se tocar o monte, será apedrejado. Na verdade, de tal modo era horrível o espetáculo, que Moisés disse: Sinto-me aterrado e trêmulo!” (Hb 12.18-21).

Ordenados, edificaram um tabernáculo consagrado exclusivamente ao culto divino e o fogo manifestou-se novamente. Incendiou o altar. Consumiu as ofertas que lá haviam sido postas. E, sobre o próprio tabernáculo, ateou-se ao céu santo e terrível.

Durante os quarenta anos seguintes esta chama sagrada acompanhou o povo deixando bem claro que, como a sarça, apesar de sempre arderem na presença de Deus, eles nunca se consumiriam.

Protegeu-lhes indicando o caminho, a hora de andar e a hora de parar. Santificou-lhes consumindo o que lhes sujava e livrando-os de quem se atrevia apresentar outro tipo de fogo.

Séculos mais tarde, na terra prometida, o tabernáculo móvel foi substituído pelo edifício do templo e o fogo manifestou-se novamente. Como fizera antes, consumiu a enorme quantidade de ofertas e encheu da presença inefável o lugar santo.

Mas o tempo que apaga as lembranças, também leva as novas gerações a não considerarem o que aconteceu às gerações passadas. E, sem significado, o templo foi reduzido a escombros.

Os anos se passaram e sob o patrocínio de um rei estranho, reedificou-se o templo e voltou-se à liturgia dos antepassados. Mas não se fala nada sobre a chama sagrada. Ela se fora.

Estranhos continuaram embelezando aquele lugar sem chama. E no ápice de sua beleza serviu de foro para o hediondo julgamento do Senhor. Continuou belo, mas já não servia de habitação ao Senhor. Sequer simbolizava sua presença. Ele mesmo desnudara-lhe a futilidade rasgando a cortina que velava a santidade do local onde a chama deveria residir.

Mas um dia, enquanto a festa mais rica acontecia nas dependências do templo, a mesma chama - a da sarça, do Sinai, do tabernáculo e do primeiro templo - incendiava a cabeça de cada um dos novos descendentes de Abraão.

Bendita chama daquele que É o que É, e fez-se Deus conosco. Bendita e terrível chama que identifica agora novas sarças, novos tabernáculos, novos templos: Templos vivos nos quais ele habita. Inaudita glória. Tremenda responsabilidade.

Oportuna ocasião para pensarmos no real sentido do Pentecostes e deixar de lado essas infantilidades modernas que só trazem vergonha sobre o Nome Sagrado.

sábado, 12 de abril de 2008

Quando as âncoras não são mais necessárias

Wierum monument.JPG

...a fim de lançar mão da esperança proposta;
a qual temos por âncora da alma,
segura e firme e que penetra além do véu,
onde Jesus, como precursor, entrou por nós...
Hebreus 6.18-20

Das cinco vezes em que a palavra "âncora" aparece nas Sagradas Escrituras, apenas neste texto é usada como metáfora.

Há muito tempo os navegadores aprenderam que uma pedra presa por uma corda e lançada ao fundo d'água, mantém o barco parado. E, apesar de todo desenvolvimento tecnológico que deu a âncora a forma que conhecemos hoje, ainda se pesca apoitado.

A âncora (ou poita) é a única coisa que mantém o barco parado a despeito do movimento da água.
Será que há uma metáfora mais bela do que esta para o que chamamos de fé? Duvido. Porém a Bíblia a usa como metáfora da esperança.

Curiosamente, em nossos dias, essas benditas âncoras estão sendo deixadas de lado. Com a ênfase no individualismo - traço definidor de nosso dias - muitos não querem mais um porto onde podem ficar seguros. Ao contrário, preferem viver como barquinhos à deriva: ao sabor da emoção do momento.

As âncoras estão perdendo a utilidade.

Na foto acima, um artista usou cinco âncoras para homenagear "os que se perderam no mar". Esse monumento fica em uma pequena cidade pesqueira holandesa, e faz todo sentido para os moradores de lá. Aliás, dentro da Igreja Reformada de lá, dependurada no teto, há uma miniatura de um barco de pesca. E, certamente não foi composto lá, mas a primeira coisa que me veio a mente foi o hino em que cantamos: "guarda o marinheiro no violento mar".

Que fotos teriam sentido semelhante hoje? De pessoas drogadas em uma sarjeta? De multidões atrás de um enganador? De massas humanas em delírios bacantes ou em "transe gospel"?
Barquinhos sem âncoras. Sem âncoras por preferirem o vagar das ondas, “levados ao redor por todo vento de doutrina”.

Sem âncoras por não verem porto onde atracar, ou vendo-o, mesmo assim, preferem a incerteza das vagas, ou o sabor do sobe e desce à segurança do porto.

Sem âncoras porque as transformaram em enfeite, em monumento à própria perda no mar do desespero e da solidão.

Isso não é opção para quem tem Jesus, pois nossa âncora atravessa o véu das realidades transitórias, e firma-se na certeza de que onde ele está estaremos também.

(Fotografia gentilmente cedida por Marcel Pelt)

domingo, 6 de abril de 2008

Dia após dia

Alguns dias, pela própria natureza deles, parecem, que são mais "difíceis" do que os demais. Não estou falando daqueles que passamos em uma cama de hospital, mas dos que fazem parte do que chamamos de rotina diária. Outros dias são tão diferentes que parecem nem passar. Como as águas de um rio, eles simplesmente fluem.

Dos primeiros já ouvi dizer - ou talvez eu mesmo já tenha dito: “Ô dia encrencado! Nada deu certo”. Dos outros já ouvi coisa semelhante, porém com o sentido totalmente contrário: “Como produzi! Tudo se encaixou.”

Parece que classificamos os dias como difíceis ou fáceis em função de acontecimentos agradáveis ou não. Mas os acontecimentos inesperados contribuem muito para nossa avaliação.

Ao fim de um dia difícil, nosso humor pode ser drasticamente alterado para melhor, quando, por exemplo, encontramos alguém muito querido, que não víamos há bastante tempo.

O contrário também é verdadeiro.

Certa senhora, que lutava ao lado do marido hospitalizado há meses, me contou, que se esqueceu de tudo durante horas, quando encontrou seu apartamento inundado por um vazamento no banheiro do vizinho de cima. Seu dia piorara! (como se isso fosse possível).

Esses eventos bons ou maus fazem parte do “grande ferramental” de que a Providência Divina usa em nosso próprio benefício. Todos eles trabalham juntos. Ou, como nos ensina o Apóstolo Paulo: cooperam para o bem dos que amam a Deus.

Não sei como isso funciona ou como é administrado, mas nosso Senhor, “todo-providente”, faz com que, das coisas más, nos venham bênçãos. Em outras palavras: as coisas más contribuem para nosso bem.

Porém, a grande dificuldade que existe é aceitarmos com gratidão os eventos da providência divina.

Não há como mudar o que já aconteceu, porém insistimos, em trazer o passado de volta, tornando-o motivo de dor através de lembranças ruins que amarguram o presente.

Curiosamente o passado nunca traz alegrias. No máximo, doces saudades daquilo que aconteceu e que não se repetirá. E, novamente a amargura “atualiza” o único tempo sobre o qual temos alguma espécie de controle: o presente.

Não há como saber o futuro, porém o desejamos com tantos detalhes que o ansiamos. E, de uma forma misteriosa, o futuro - que ainda não existe - traz amargor ao presente, pois nos leva a ficar “pré-ocupados” com aquilo que ainda não aconteceu. E novamente perdemos as alegrias do presente.

O que fazer? Segundo nosso Senhor e Mestre não há muito. Aliás só há uma coisa: confiar naquele que cuida dos pássaros e do lírios e que certamente cuidará de nós também. Ou seja: exercitar a fé. Isso é o verdadeiro “viver pela fé”!

Ele deixou muito claro, que do passado, a única coisa a fazer é nos apropriar do perdão de Deus. E do futuro, recebê-lo dia após dia, com alegria de saber que ele nos é administrado pelo Senhor do tempo.

Ah! Uma última coisa: Todos eles, mesmo os que classificamos de bons, sempre nos trarão alguma espécie de contratempo. Isso lhes é inerente. Afinal nosso Mestre nos ensinou: “basta a cada dia seu próprio mal”.

Sem essa pitada de dificuldade diária, facilmente nos esqueceríamos do Senhor da providência.